Chucat
 
Três categorias de mitsvot Moshê e Aharon pecam em Águas de Discórdia
As leis da vaca vermelha Moshê envia mensageiros ao rei de Edom
Alusões acerca da mitsvá da Vaca Vermelha Aharon falece em Hor Hahar
Algumas leis de pureza ritual Amalec ataca o povo judeu
O passamento de Miriam e o desaparecimento do Poço de Miriam A guerra contra Sichon, rei dos emoreus
 
 
 
 
Imprima o Midrash completo
 

Três categorias de mitsvot

As mitsvot da Torá, geralmente, pertencem a uma de três categorias:

Mishpatim - Leis Civis: "Mishpatim" são leis Divinas que promulgam a segurança e sobrevivência da sociedade humana. Incluem, por exemplo, a proibição de roubar e matar.

Edut - Testemunhos: Se uma mitsvá testemunha um evento histórico ou algum aspecto de nossa fé, é chamada de "Edut", testemunho. São exemplos a mitsvá de observar o Shabat, que atesta nossa crença de que o Todo Poderoso criou o mundo em seis dias; observar as Festas (Yom Tov), pois comemoram o Êxodo do Egito; as mitsvot de tsitsit e tefilin que demonstram nossa crença na soberania de D'us.

Chukim - Decretos Divinos: Na categoria de chok (plural: chukim) classifica-se todas as mitsvot cujo propósito ou significado não são compreendidos pela inteligência humana.

Esta categoria de mandamentos é a mais difícil de respeitar. O Talmud nos diz que essas são as leis que "a má inclinação (yêtser hará) e as nações do mundo tentam contestar." Se não compreendemos o motivo de alguma coisa é tentador achar pretextos para não faze-la. Quando tentamos explicar nossa religião aos não-judeus, as leis que não tem um motivo óbvio são as mais difíceis de compreensão. O fato de um mandamento não ter um motivo óbvio torna seu cumprimento um ato de fé, muito mais ainda. Ele indica que estamos prontos e desejosos de obedecer às ordens de D'us, até mesmo quando não podemos justificá-las racionalmente.

Todas as leis de pureza e impureza ritual pertencem à essa categoria de mandamentos conhecidos como chukim, decretos. Portanto, disseram nossos sábios, "O corpo morto não impurifica, e a água não purifica. Mas sim, disse D'us, Eu dei uma ordem, e emiti um decreto - e você não tem permissão para questioná-lo."

Demonstramos assim, que estamos colocando D'us acima de nosso próprio intelecto. Apesar de talvez não sermos capazes de justificar esses mandamentos perante o mundo, expressamos nossa segurança interior como judeus ao continuar cumprindo-os.

Há numerosos exemplos de chukim, mas o Midrash enumera quatro sobre os quais a Torá afirma explicitamente: "Este é um chok." Uma vez que contém elementos aparentemente contraditórios, são passíveis de serem ridicularizados pelos que se pautam pelo pensamento racional. Por isso, a Torá aconselha o judeu a dizer a si mesmo: "É um chok, não tenho direito de questioná-lo."

Os quatro chukim são:

1. Yibum: Um judeu que se casa com a esposa de seu irmão enquanto este ainda está vivo, ou mesmo após sua morte, incorre em pena de caret (morte espiritual), contanto que seu irmão tenha tido filhos. Porém, se a esposa do irmão não tem filhos, é mitsvá casar-se com ela (levirato, yibum).

Sendo que a lógica acha muito difícil aceitar este paradoxo, o versículo enfatiza: "E vocês guardarão Meus chukim." (Vayicrá 18:26).

2. Shaatnez: A Torá proíbe vestir-se com roupas que contenham mistura de lã com linho. Não obstante, é permitido vestir um traje de linho em cujos cantos haja tsitsit de lã atados. Por mais que questionemos esta exceção, a Torá declara, no que concerne à mitsvá de shaatnez: "E vocês guardarão Meus chukim." (Vayicrá 19:19).

3. O bode para Azazel: Um bode era enviado à morte como parte do Serviço de Yom Kipur, purificando o povo judeu de seus pecados. Ao mesmo tempo, impurificava o agente que o enviava. Por conseguinte, esta lei é chamada de "um chok eterno" (Vayicrá 16:29).

4. A vaca vermelha: As cinzas da vaca vermelha purificavam um judeu que encontra-se impuro, enquanto tornavam impuro qualquer um que estivesse envolvido em sua preparação. Uma vez que isto também desafia a lógica, a Torá introduz o assunto com as palavras: "Este é o chok da Torá" (19:2); devemos aceitar a mitsvá como uma ordem Divina.

Os chukim, contudo, não são "leis sem razão"; sua lógica, porém, é Divina. Os maiores dentre nosso povo foram capazes de compreender algumas delas.

Assim, o fundamento racional por trás das leis da vaca vermelha foram reveladas de maneira Divina a Moshê.

O rei Salomão, por outro lado, que pesquisava as razões por trás das mitsvot e encontrou explicações para todas as outras, professou que esta mitsvá era incompreensível.

Salomão descobriu porque o shochet (magarefe) deve seccionar tanto o esôfago quanto a traquéia dos mamíferos, enquanto que para aves é suficiente cortar apenas um desses órgãos, e que peixes sequer necessitam de abate ritual.

Todavia, confessou: "Pensei que teria sabedoria, porém isto (a compreensão da mitsvá da vaca vermelha) está muito distante de mim." (Cohêlet 7:23).

A fim de apreciar plenamente suas palavras, exploraremos a profundidade e âmbito da sabedoria de Salomão:

"E D'us deu a Salomão bastante sabedoria e compreensão, e extensão de conhecimentos como a areia da beira do mar." (Melachim I, 5:9).

Esse versículo implica que a sabedoria de Salomão equivalia à sabedoria do povo judeu, que era "tão numeroso quanto a areia da beira do mar." A capacidade de seu intelecto era superior a de qualquer outra pessoa, e por isso conseguia captar o que se passava na mente do outro. Conseqüentemente, seu julgamento era verdadeiro mesmo em casos nos quais os fatos eram obscuros, como demonstra a seguinte história:

Três mercadores judeus estavam juntos numa jornada quando se aproximava o Shabat. Decidiram enterrar seu dinheiro em determinado local, descansar até depois do Shabat, desenterrá-lo e continuar seu caminho.

Na escuridão da noite, enquanto os companheiros dormiam, um deles aproximou-se sorrateiramente do local secreto, desenterrou o dinheiro e escondeu-o em outro lugar.

Procurando o dinheiro depois do Shabat, os mercadores perceberam que esse desaparecera. Uma vez que ninguém mais sabia do local secreto, concluíram que um deles deveria ter roubado o tesouro. Mas qual? Cada um acusava o outro, dizendo: "Você é o ladrão!"

Incapazes de determinar quem era o culpado, decidiram viajar até Jerusalém e submeter o caso ao Rei Salomão.

O Rei Salomão ouviu atentamente o relato e ordenou-os a retornar no dia seguinte. Ao voltarem à corte, o rei declarou: "Sei que todos vocês são mercadores perspicazes. Antes de julgar seu caso, gostaria de ouvir sua opinião acerca de outro caso que me foi apresentado."

Os três ouviram com atenção o Rei Salomão relatar o seguinte incidente: "Um menino e uma menina cresceram no mesmo bairro, e prometeram não se casar sem o consentimento um do outro. Mais tarde, mudaram-se e perderam contato. Quando a menina chegou à idade casadoura, ficou noiva de um jovem de sua nova cidade. Mesmo assim, não se esquecera da promessa feita na infância. Ao se aproximar a época do casamento, vendeu seus pertences pessoais a fim de levantar fundos para empreender uma longa jornada a sua cidade natal, para procurar seu antigo vizinho. Viajou a sua cidade, encontrou-o e explicou-lhe que estava noiva de outra pessoa. Pediu-lhe para libertá-la da promessa feita anos atrás e, em seu lugar, aceitar o dinheiro que conseguira.

O jovem valorizou os sofrimentos pelos quais ela passara para ser fiel a sua promessa. Apesar de lhe ser difícil, disse-lhe que estava livre para casar-se com seu noivo. Recusou o dinheiro que ela oferecera, e ela partiu em paz.

A solitária viagem de volta era tão perigosa para a jovem quanto fora sua jornada para longe do lar. Ao circular por um bairro deserto, um velho surgiu de um arbusto, atirando-se sobre ela, roubando-lhe todo o dinheiro e ameaçando utilizar-se dela para seus próprios propósitos.

"Por favor, ouça-me," suplicou a moça, "você é um homem velho, por quê traria esta terrível culpa sobre si pouco antes de ser convocado perante o Juiz Eterno? Pegue meu dinheiro, mas deixe-me retornar ilesa a meu noivo." Contou-lhe sua história, e encerrou: "Meu amigo de infância certamente teve mais dificuldade em me deixar partir que você; ele é jovem, e reivindicou um direito a mim. Você, um homem velho, deve aprender dele a como se controlar."

O ladrão ficou tocado pelo relato. Não a molestou, e restituiu-lhe o dinheiro.

"Agora," concluiu o Rei Salomão, "coloco-lhes a seguinte questão: Quem é o verdadeiro herói da história - a moça, o jovem ou o ladrão? Gostaria de ouvir suas opiniões sobre o assunto."

"A moça é extraordinária," replicou o primeiro mercador. "Imagine, empreender uma longa e perigosa jornada apenas para cumprir sua promessa!"

"Admiro o jovem," apartou o segundo. "Agiu de maneira nobre e altruísta."

"A ação do ladrão é a mais admirável," comentou o terceiro mercador. "Depois de conseguir ter em sua posse tanto a moça quanto o dinheiro, não apenas libertou a moça, como também restituiu o dinheiro!"

"Prendam-no!" gritou o Rei. "Ele só pensa em dinheiro! Mesmo ouvindo esta história, em seu íntimo, desejava o dinheiro da moça. Quando teve oportunidade de pegar o dinheiro para si, com certeza o fez! Prendam-no imediatamente!"

O mercador foi preso, e confessou imediatamente sua culpa.

O Rei Salomão era perito em todas as ciências, ultrapassando seus antepassados. Por exemplo, seu conhecimento sobre animais era maior que a de Adam (Adão), que deu nome a cada espécie de acordo com suas características essenciais.

Sua compreensão sobre astronomia ultrapassava a de Avraham, um mestre dessa ciência.

Sua perícia em negócios de estado excedia a de Yossef, ele próprio um legislador habilidoso. Também era melhor lingüísta que Yossef, que falava setenta idiomas. Além de falar todas as línguas, comunicava-se com todos os animais.

O Rei Salomão brilhava mais que os reis e nações de sua época em todos os ramos da ciência. Apesar dos reis egípcios orgulharem-se de seu conhecimento em astrologia, a competência de Salomão era superior, como demonstra o seguinte incidente:

Quando o Rei Salomão estava prestes a construir o Templo Sagrado, pediu ao rei egípcio, o Faraó Necho, que lhe enviasse artistas e artesãos.

O Faraó pediu a seus astrólogos para adivinharem quais de seus súditos estavam destinados a morrer naquele ano. Subseqüentemente, enviou a Salomão uma equipe de trabalhadores desenganados.

Contudo, assim que os artesãos egípcios chegaram, Salomão percebeu o segredo. Ordenou que vestissem mortalhas brancas e enviou-os de volta à terra natal com uma mensagem ao Faraó Necho: "Aparentemente, faltam-lhe mortalhas para enterrar seus mortos. Por isso, estou enviando algumas para seus trabalhadores."

A sabedoria de Torá do Rei Salomão era imensa. Ultrapassava a da geração do deserto, conhecida como "a Geração do Conhecimento."

Sua grandeza em Torá torna-se patente através dos três maravilhosos e sagrados Livros que escreveu com espírito de profecia: Cohêlet (Eclesíastes), Mishlê (Provérbios) e Shir Hashirim (Cântico dos Cânticos) - que estão incluídos nos 24 livros do Tanach (Bíblia). Também compôs alguns dos salmos no Tehilim.

Fez com que a Torá fosse cara e amada pelo povo, pois podia ilustrar o significado de cada halachá (Lei da Torá) com três mil parábolas, e citar mil e cinco diferentes razões para cada ordem rabínica.

Quão profunda é, portanto, a mitsvá da vaca vermelha, se o Rei Salomão, o mais sábio dos homens, declarou: "Estudei-a e empenhei-me em entendê-la, porém está bem além de minha compreensão."

Na verdade, mesmo as mitsvot da Torá que parecem compreensíveis são "chukim". Seu verdadeiro significado está muito além do intelecto humano.

 
top