Como me tornei
Shomêr Shabat
Minha história
é muito simples. Acredito que quando me perguntam como fiquei "religioso"
(adotei o judaísmo), a resposta vai de encontro com a grande maioria:
cuidando o Shabat.
Eu era completamente desligado de tudo em relação a este
assunto, como a maioria dos jovens entre 15 e 18 anos. Celebrava Pêssach
com meus avós e toda a família desde pequeno e as cenas
realmente me marcaram. Mas era a espera e a melodia de "Manishtaná"
que eu e meus primos entoavámos que me atraía. Também
o kidush recitado pelo meu querido avô que nutria uma alegria e
bondade e ficava distribuindo eternos sorrisos que ornamentavam sua barba
branca que fazia eu me sentir tão bem. E a busca pelo aficoman
era uma gincana barulhenta onde caíamos na gargalhada até
sermos mandados…dormir!
Minha mãe acendia velas… a qualquer hora. Cobria os olhos
e recitava algo. Duas vezes ao ano, em três dias me levavam à
sinagoga. Não é difícil adivinhar quais…
Mas aí o tempo passou e foi em uma sexta-feira à noite,
num encontro para jovens que me vi na
sinagoga (não era Rosh Hashaná nem Yom Kipur) e um rabino
simpático e jovem introduziu a reza conduzida por dois meninos
que iriam fazer bar-mitsvá. Depois sentamos onde cada um trouxe,
após ter pesquisado, idéias sobre o Shabat, canções
alegres acompanharam o jantar e depois fomos todos para casa e a cena
se repetiu por meses. Era legal, pois nos encontrávamos deixando
todo o resto de lado. Mas só isto ainda não era o suficiente;
o Shabat ainda não fazia parte da minha vida.
Então, de surpresa, alguém se aproximou de mim com um convite
estranho, mas muito simpático: "Onde você vai passar
Shabat? Gostaria de vir em nossa casa?" Mais surpreso ainda fiquei
eu, por ter aceitado imediatamente sem ao menos saber quem era e qual
a razão do convite. Mas fui. A partir deste ponto tudo começou.
Ao chegar na casa deste casal, que na época tinha dois filhos pequenos,
encontrei a sala iluminada com as velas de Shabat tomando todo o espaço.
Uma mesa linda colocada cuidadosamente sob uma toalha branca, copo de
prata e um paninho que escondia algo, causaram uma forte impressão.
Parecia um ritual: o ritual de Shabat. Cantaram melodias e eu fiquei só
apreciando a cena. A noite transcorreu tranquila e alegre. Me fizeram
sentir à vontade e conversamos sobre muitos assuntos. Escutei comentários
sobre a porção da Torá. Era Bereshit, isto ainda
me lembro bem. Bombardeei os dois com uma centena de perguntas e queria
saber o por quê de tudo. Fui prontamente atendido o que acabou por
abrir um caminho de coerências que jamais pensei existir. Os valores
do Shabat transcendiam a lógica, por outro lado estava tudo tão
óbvio e claro.
Ao voltar para casa aquela noite me encontrei divagando sobre o sentido
da vida, o que eu realmente havia feito até aqui, o que eu estava
buscando e porque ainda não estava satisfeito. Sabia que dali para
frente já não conseguiria dormir, comer, estudar, da mesma
maneira que vinha fazendo antes. Tudo precisava ser feito de outra forma;
a vida passava a ter outro sentido.
Meses se foram até que resolvi cumprir um Shabat integralmente,
com todos os detalhes e dificuldades. Mas me senti tão bem. Como
se aquilo que eu acreditava ser a verdade e o correto, me conectasse a
uma outra dimensão e este encantamento perdurava por 24 horas.
A cada semana fui aperfeiçoando e estudando e procurando mais respostas.
Eu já não podia mais me separar dele. Tudo era tranquilo
e perfeito. Ele me trazia a paz e uma sensação de que eu
podia mandar em minha vida e guiá-la da melhor forma com que fui
instruído. Eu podia correr e me stressar literalmente a semana
toda. Mas em determinado momento, bem definido de meu dia, eu passava
uma chave em tudo e abria, com outra, uma nova porta.
Nunca mais me separei dele e para sempre cuidarei para que nosso encontro
seja cada vez melhor, com mais pessoas passando pela porta, se juntando
a nós: ele é o Shabat e eu, bem sou a penas seu shomêr.
Então, voltando à parashá Bereshit daquele meu primeiro
Shabat entendi que na vida judaica nada é por acaso e tudo tem
uma razão de ser. Bereshit foi o meu "Princípio",
a razão pela qual eu existo: a de me tornar sócio da Criação
de Hashem.
Se você aparecer na minha casa esta semana poderá encontrar,
além de convidados distantes que tentamos aproximar, eu e minha
esposa ladeados de quatro lindos filhos. E isto é só o princípio!
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