A pianista

  por Marsha Arshinov – Neshei Chabad Newsletter
indice
 

Nasci em S. Petersburgo, Rússia, há 33 anos, filha de Yuri e Sonya Ivreison. Quando pequena, eu sabia de duas coisas: que era judia, e que ser judeu na Rússia representava um fardo, algo pelo qual se tinha que sofrer e, com dificuldades, superar.

Demonstrei talento musical muito cedo na vida; aos cinco anos, já executava o Concerto de Bach para piano e orquestra. Durante toda minha infância, continuei a estudar com dedicação, praticando muitas horas por dia, todos os dias.

Quando cheguei aos dezoito anos, a música não me satisfazia, desejava algo mais da vida. Queria saborear o mundo, encontrar alguma felicidade, algum significado, algo além dos aplausos ao final de uma apresentação. Sentia fortemente que faltava algo à minha vida, e pensei que este "algo" fosse o casamento.

Comecei um relacionamento sério com um rapaz não-judeu. Meus pais tentaram convencer-me a não desposá-lo. "Ele não é judeu!" "E daí?" eu respondia de volta. Ser judeu era apenas um fardo; por que deixar que isso ditasse com quem casar?

Meus pais não podiam explicar isso, era apenas um sentimento. Uma pessoa não casa por causa da fé. Mas sem um "por quê" eu não podia ser dissuadida.

Eu sempre soube que tínhamos parentes em Nova York que eram muito religiosos. Secretamente, eu estava orgulhosa pelo fato de ter parentes religiosos. A idéia de que eles viviam de acordo com seus princípios me atraía, embora eu não tivesse a menor indicação sobre quais eram estes princípios.

Enquanto eu estava me preparando para o casamento com meu noivo, o telefone tocou. Era a prima de meu pai, Mirel, de Nova York. Ela sugeriu que, antes de casar-me eu deveria ir a Nova York e ver como viviam os judeus de lá. A princípio recusei, pois estava ocupada tanto com minha carreira quanto com os preparativos para o casamento, e também não queria ser dissuadida sobre casar-me com meu noivo. Mas Mirel foi persistente, e finalmente lá fui eu.

No outono de 1989 encontrava-me em Crown Heights. Minha primeira impressão foi de uma grande família amorosa. Vi como os filhos de Mira e seus cônjuges cuidavam com carinho da mãe viúva, e fui calorosamente recebida por todos. Havia tanto amor naquela casa. Podia-se sentir isso logo ao entrar.
No domingo, fui ao 770 para conhecer o Lubavitcher Rebe. A nora de Mira, Cyrel, acompanhou-me.

A fila era longa e interminável. As duas mulheres à nossa frente fizeram ao Rebe uma pergunta sobre algum assunto familiar, e o Rebe lhes respondeu. Como ele podia dar conselhos tão de improviso, com tão pouca informação? Teria ele uma espécie de intuição sobre as pessoas? Será que D’us soprava a resposta em seus ouvidos? Fiquei intrigada.

Quando chegou minha vez, eu disse: "Venho de Leningrado," O Rebe respondeu: "Em boa hora."
Esta era a primeira vez que eu via o Rebe. A segunda foi alguns dias antes da minha volta à Rússia. Mirel levou-se ao 770, num dia frio e cheio de vento. O Rebe estava atravessando sozinho o pátio, e parou à nossa frente. Ela não me poupou. E apanhou a oportunidade: "Rebe, esta é minha prima da Rússia, e ela está noiva de um não-judeu."

O Rebe voltou-se para mim e disse duramente: "Você jamais deveria fazer isso, pois trará infelicidade a si mesma e também infortúnio para ele."

Então o Rebe afastou-se rapidamente. A princípio, ela e eu simplesmente ficamos ali, num silêncio chocado. Nenhuma de nós estava preparada para a força da reação do Rebe. Um segundo depois, comecei a chorar. Parecia que o Rebe estava furioso comigo, e isso eu não podia suportar.

Mirel convidou-me a ficar para dar um impulso à minha carreira musical em Nova York. Ela insistiu para que eu não voltasse à Rússia, para meu noivo. Porém decidi que precisava voltar; eu ainda o amava. Queria casar-me com ele e o fiz. Mas em menos de dois anos estávamos divorciados.

Eu era agora uma pianista concertista realizada. Também dava aulas de piano no Conservatório. Estava sempre viajando para apresentações, e conheci muitos países diferentes. Porém, quanto mais viajava, tocava e ensinava, mais sentia que algo estava faltando. Estava infeliz apesar de meu crescente sucesso. Somente mais tarde percebi que minha alma estava sedenta de Torá.

De repente, surgiu-me a idéia: eu voltaria a Nova York. Mirel tinha falecido, portanto telefonei à sua nora, Chani. Eu não tinha um plano definido, somente um sentimento de que isso era o que eu tinha de fazer. Cheguei à casa de Chani e Yossef. Mais uma vez, senti a pureza e a santidade de um lar judeu. Somente então, eu estava pronta a aceitar a lição em minha própria vida.

Quando retornei à Rússia, era uma pessoa mudada. Agora estava pronta a saciar minha sede com a água pura da Torá. Em Petersburgo vive uma emissária do Rebe, Sara Pewzner. Sara desempenhou um papel decisivo em tornar-me observante. Ela foi minha mentora e mostrou-me amor e bondade verdadeiros. Em sua casa, encontrei o mesmo tesouro que tinha visto na casa de Chani; a inigualável atmosfera de um lar chassídico.

Comecei a estudar no Machon Chana, a escola para moças e mulheres em Petersburgo. David e Esther Segal ensinavam ali. Eles planejavam fazer uma viagem à cidade de Lubavitch. (Estavam casados há seis anos, e como ainda não tinham filhos, queriam rezar no local onde havia túmulos sagrados ali).

Convidaram-me a ir com eles. Rezei a D’us, pedindo para encontrar o homem certo para casar-me, um judeu religioso com quem eu pudesse criar o lar judaico pelo qual tanto ansiava. Havia um homem solteiro no grupo. Conhecemo-nos em Lubavitch. Casamo-nos quatro meses depois. Na quarta noite de Chanucá do ano passado, fomos abençoados com um filho. Alguns meses antes, os Segais tinham sido abençoados com quíntuplos. Eles vivem atualmente em Jerusalém, onde todos viveremos com a chegada de Mashiach, que seja breve em nossos dias!

       
top