Cracóvia, 1995

  por Shmuel Marcus
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  As crianças americanas são ensinadas a nunca entrar no carro de um estranho. Os Estados Unidos estão à beira da loucura. A antiga União Soviética está muito atrasada em relação à América, e as pessoas ainda pedem carona.

Eu observo e aprendo. Os táxis são mais caros, e não aceitam cigarros como pagamento. Você estende a mão, e logo um carro diminui a marcha. Você diz o nome de uma rua, o motorista diz dois dólares, você oferece um, ele diz Nada feito, e se manda. Você pára o próximo carro e diz o mesmo nome de rua. Ele diz: Entre, e você entra. Se você não combinar o preço de antemão, arrisca-se a ouvir um grunhido quando descer do carro.

Era uma manhã fria, e eu mal podia esperar para sentar-me num carro quentinho. Estendi a mão. Um carro azul pequeno parou, e de imediato, como se fosse um velho amigo da família, entro no carro sem perguntar ou falar nada. Rodamos em silêncio pela Rua Pushkinskaya rumo à sinagoga.
Na minha pressa, eu tinha esquecido de combinar o preço. Quando tento pagar, o motorista recusa-se a aceitar a quantia exibida. Recusa qualquer pagamento pela corrida. Fico confuso, é muito cedo para discutir. "O que você não está entendendo?" diz ele. "Olhe para mim. Sou judeu, meu nome é Cohen. Acha que eu cobraria de um garoto judeu para levá-lo à sinagoga?" Eu agradeci e mais tarde comprei uma Coca-cola com o dinheiro.

A neve cai e permanece. Floco após floco, a terra espumeja com a neve suja e meio derretida. Caminhões de neve bem intencionados fazem rondas. O gelo solidifica. A calçada parece um escorregador que leva a uma rua sem fim. Os camelôs e mendigos surfam com graça.

Hoje é uma daquelas noites em que tudo que desejo é aninhar-me com meu gato. Mas isso seria impossível. Primeiro, hoje é a quinta noite de Chanucá. Segundo, não tenho gato.

De onde veio a Menorá? Quem a construiu? Talvez os próprios Macabeus?

A Menorá de Cracóvia foi criada pelos alunos, o primeiro grupo de estudantes Lubavitch a chegar em Cracóvia. O que garotos da yeshivá sabem sobre construir uma menorá gigante a partir praticamente do nada? Mas deixarei isso para uma outra história. Por exemplo, "Cem Maneiras de Construir uma Menorá na Rússia" ou então, "A Menorá Feita de Neve." Na Ucrânia você não pergunta: "De onde veio isso?" Se você tem, você usa. E esta noite a Menorá se exibe altaneira, de frente para cada rua no mundo, a começar com Ulitsa Pushkinkaya.

Esta noite o Rabino Chefe e o Ministro da Religião chegarão a tempo, e com um bastão de colher cerejas alugado, os dois acenderão as cinco lanternas de querosene. A proteção de vidro manterá a chama acesa durante toda a noite, e o calor derreterá o coração empedernido do homem. O plano era este.

Isso é o que deveria acontecer. Isso foi o que anunciamos. Foi isso que centenas de pessoas se reuniram para ver. Mas a vida russa é aquilo que acontece quando você tem planos.

Hoje à noite Yossi está na sinagoga, tentando acender as lanternas congeladas. Lá fora, centenas estão esperando no frio. O motorista do guindaste está furioso e quer ir embora. Meus dedos estão congelados e cheirando a gás.

Desejo correr para ver como as lamparinas estão se saindo, mas um homem baixo me impede. "Você tem uma pá?" Ele se oferece para tirar a neve das escadas da sinagoga. Respondo que é uma boa idéia, mas não posso conseguir-lhe uma pá. "Lembra-se de mim?" Ele aponta para um carrinho azul. Cohen veio para celebrar, para estar entre judeus. Cohen deseja fazer sua parte, mas ele já fez. Ele veio.

Agora Yossi e Yefim têm três lanternas funcionando no escritório. Mas como podemos acender apenas três lamparinas na quinta noite? Precisamos de um milagre de Chanucá, o milagre das luzes.

O ministro diz algumas palavras em russo; o rabino coloca a primeira lanterna que está funcionando, depois a segunda, em seguida a terceira. Então ele tenta lentamente acender a quarta e a quinta. fecho meus olhos esperando o milagre, mas não há nenhum. A música começa a tocar, e os judeus dançam na neve. O guindaste vai embora. Minutos depois, duas luzes se apagam; apenas uma lamparina permanece acesa, brilhando. Juntamos as mãos e começamos a dançar, a celebrar. O Sr. Cohen sorri e bate palmas.

Está na hora de ir para casa. Estendo a mão, e um carro pára. Rodamos um pouco, e então olho para trás, pela janela gelada, e avisto o milagres das luzes.

Setenta anos de comunismo, e uma chama ainda arde. Os judeus russos ainda sabem como dançar. E ainda é seguro pedir carona. Bem, pelo menos esta noite.
       
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