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Rav
Saadya Gaon era um grande erudito, na verdade um gênio. Contudo
era muito modesto, tanto na opinião sobre si mesmo quanto nas relações
com os seus semelhantes. Tinha sempre um sorriso e uma palavra amável
para todos, fossem pequenos ou grandes, moços ou idosos.
Embora passasse a maior parte de seu tempo estudando Torá, sempre
encontrava alguns minutos para parar e conversar com as pessoas. Costumava
dizer que até a Torá é comparável à
"fala" ou "conversação". Conforme está
escrito: "Pois Teus decretos são como falas para mim."
Um dia seu alfaiate lhe trouxe um traje novo que havia costurado para
ele e, como de costume, o Gaon tinha sempre uma boa palavra. Com muito
bom humor, disse ao alfaiate: "Diga-me amigo, quantos pontos puseste
nas costuras desta roupa?"
O alfaiate ficou surpreso: "Mas Rabi, nunca pensei em contá-los!
Sempre achei que costurar é como estudar a Torá, não
tem limite. Vai-se cozendo e cozendo. Tenho certeza de que o senhor sabe
quantas letras há nas Escrituras Sagradas, mas sou apenas um pobre
homem ignorante e não sei nada. Prometo-lhe porém que quando
fizer seu próximo traje, terei satisfação em contar
os pontos e lhe fornecer os resultados."
Quando o alfaiate se foi, Rav Saadya Gaon ficou muito triste. Sentiu que
deveria saber o número de letras nas Escrituras, como o alfaiate
tinha plena certeza de que ele sabia. Decidiu cuidar deste assunto na
primeira oportunidade.
O tempo passava e o Gaon estava tão ocupado que não conseguia
sentar-se para cumprir a tarefa que se propusera. Nesse meio tempo, o
alfaiate lhe trouxe outra roupa nova, pois as estações há
haviam mudado e desta vez ele anunciou orgulhosamente ao Gaon: "Rabi,
agora eu tive todo o cuidado de contar os pontos, conforme prometi."
O Gaon lembrou-se de que ele mesmo não tinha cumprido o que havia
proposto e resolveu
que não poria a roupa nova até que completasse a contagem
das letras das Escrituras Sagradas. E então não parou até
ter contado e conferido o número de letras, após o que compôs
suas rimas sobre as letras que ficaram conhecidas como "As letras
de Saadya Gaon".
O Gaon deu um banquete para todos seus amigos e eruditos a fim de comemorar
o término do seu trabalho. Entre seus convidados, incluiu o simples
alfaiate.
Diversos foram os discursos elogiosos proferidos pelos presentes em homenagem
a seus feitos, mas afastando-os com um gesto, disse aos convidados: "Não
é a mim que devem elogiar por este trabalho, mas ao nosso amigo
aqui, o alfaiate. Foi ele quem colocou esta idéia na minha cabeça
e se não fosse por ele, eu jamais teria composto estes versos."
Os convidados olharam para o alfaiate, surpresos. Mal podiam acreditar
que pudesse ser ele a fonte de inspiração ao grande gênio,
Rav Saadya Gaon.
Mas como poderiam adivinhar? Afinal, ele não era apenas o simples
alfaiate que aparentava ser, mas sim o grande profeta Eliyáhu,
de abençoada memória.
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