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Dentre
os muitos seguidores do Alter Rebe havia um devoto chassid, que vivia
na cidade de Shklov. Era um próspero mercador, respeitado na comunidade
e estimado por todos os chassidim. Costumava viajar a Liozna várias
vezes durante o ano para escutar as inspiradoras palestras e ensinamentos
do Alter Rebe. Nestas ocasiões, sempre levava consigo grandes somas
de dinheiro para ajudar as obras de caridade do Rebe. Isso lhe dava uma
sensação especialmente agradável. No geral, podia-se
dizer que era um homem satisfeito consigo mesmo.
Então, certo dia, a roda da fortuna fez um movimento descendente.
Seus negócios começaram a ir de mal a pior, e sua fortuna
despencou rapidamente. Não demorou muito e ficou pobre, com vultosas
dívidas. Profundamente amargurado, procurou o Rebe e abriu seu
coração a ele.
"Rebe, estou arruinado" – lamentou. "Vejo-me pressionado
pela necessidade. Preciso de dinheiro para pagar meus credores; preciso
de dinheiro para casar minhas filhas, às quais prometi belos dotes
quando as coisas pareciam brilhantes; preciso de dinheiro para levar adiante
meus negócios. Minha saúde não vai muito bem, e preciso
de uma bênção para isso, também. De repente,
tenho tantos problemas que simplesmente não sei o que fazer!"
O Alter Rebe, que ouvira gentilmente em silêncio ao lamento do chassid,
ergueu a cabeça e olhou diretamente nos olhos do infeliz. Então
disse-lhe lentamente, entoando cada palavra, como era seu costume:
"Está muito preocupado com suas necessidades; já pensou
para que você poderia ser necessário, e o que é necessário
de você?"
Ao ouvir estas palavras do Rebe, o chassid quase desmaiou, e teve de ser
ajudado para deixar o
aposento. Precisou de algum tempo para superar o tremendo choque. Quando
se recobrou, começou a ponderar as palavras do Rebe, que ainda
repercutiam em seus ouvidos. Agora que conseguia pensar com mais calma,
ficou claro para ele que as palavras do Rebe não eram uma severa
reprimenda. Eram obviamente palavras de conselho e orientação.
Cabia a ele entender a mensagem e seguir as instruções,
e isso certamente o faria sair das dificuldades em que se encontrava.
Pensando bem, tinha de admitir que estivera muito envolvido consigo mesmo
e seus assuntos, e quando as coisas começaram a dar errado, tinha
se preocupado com suas necessidades, e as de sua família. Mas seria
só esse o propósito de um judeu, preocupar-se consigo e
sua família?
"Se eu tivesse considerado seriamente a questão: 'Quem precisa
de mim neste mundo, e para que sou necessário?' repetia ele a pergunta
do Rebe.
"Bem, suponhamos que eu me faça esta pergunta: qual será
a resposta?"
Então lhe ocorreu que, na verdade, ouvira mais de uma vez o Rebe
falar sobre o objetivo de um judeu na vida. O Rebe tinha citado os Sábios:
"Fui criado para servir a meu Amo." E como um judeu serve a
D’us, seu Amo? Saltando do telhado? Plantando bananeira? Fazendo
algo de espetacular? Nada disso. ‘
Tudo que D’us exige de um judeu é simplesmente que ele viva
sua vida diária segundo a maneira que Ele estabeleceu em Sua Torá:
recitar as preces todos os dias, estudar Torá diariamente, cumprir
Suas mitsvot e de maneira geral ter D’us na mente, com temor e amor
a D’us no coração.
Ora, você poderia perguntar, temer a D’us pode ser fácil,
mas como se chega a amar a D’us , principalmente quando as coisas
não parecem caminhar da maneira que se gostaria?
Bem, o Alter Rebe explicou também este ponto, e de várias
maneiras. Mas um que o chassid lembrava especialmente era: "Ama teu
próximo como a ti mesmo" (v'eahavta lere'acha kamocha) é
a chave para "Ama a D’us , o teu D’us " (v'ehavta
es Hashem Elokecha).
"Então foi aí que eu falhei" – refletiu
consigo mesmo o chassid. "Rezei e estudei Torá todos os dias,
e cumpri todas as mitsvot diárias. Mas a maior mitsvá, v'eahavta
lere'acha kamocha, foi meu ponto fraco. Amar alguém como amo a
mim mesmo significa que devo me preocupar pelas suas necessidades com
a mesma ansiedade e urgência que sinto pelas minhas próprias,
e as de minhas família. Mas foi isso o que eu fiz?…"
O chassid refletiu sobre este ponto muitas e muitas vezes, e ficou repleto
de remorso e vergonha. "Ó D’us " – clamou
ele – "perdoa-me por pensar naquilo que Tu deves fazer para
mim, em vez daquilo que eu devo fazer para Ti!"
Ficou grato ao Rebe por abrir-lhe os olhos para a verdade, e resolveu
com todo seu coração que dali em diante as palavras do Rebe
seriam uma luz a guiar a sua vida. Mais tarde naquela noite, depois que
o Alter Rebe tinha recebido todas as pessoas que estavam ali para visitá-lo,
mandou chamar o chassid, e disse-lhe:
"Agora que você viu a luz e conhece a verdade, volte para casa
com o coração mais leve, pois pode ter certeza de que D’us
não o abandonará. Quando você preencher as necessidades
dos outros, D’us certamente preencherá as suas, e o abençoará
com Hatzlachá, (sorte) tanto material quanto espiritualmente."
Era um outro homem quando chegou em casa. Não se preocupava mais
com suas necessidades, e começou a interessar-se pessoalmente pelos
outros que, como logo descobriu, tinham necessidades ainda maiores que
as suas.
Em pouco tempo, seus negócios melhoraram, e em seu devido tempo,
ele se viu numa situação ainda melhor que a de antes. Porém,
ao ver as bênçãos de D’us retornando à
sua vida, tornou-se ainda mais humilde e disposto a servir a D’us
com todo seu coração e sua alma.
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