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Quando eu era uma
criança crescendo em Waterford, Connecticut, minha família
ia à sinagoga em Rosh Hashaná e Yom Kipur, e celebrava Chanucá
e Purim com zelo infantil. De fato, muitas pessoas ainda acham que eu
fui o melhor Mordechai de sete anos que já se viu na peça
anual de Purim na Sinagoga Ahavet Chesed!
Porém em todos os meus anos eu jamais tinha visto, muito menos
entrado, numa sucá. Portanto uma das experiências mais extraordinárias
da minha vida adulta foi ajudar a construir a sucá da Comunidade
Chabad em Wilmington, Delaware.
Consigo lembrar-me claramente da construção daquela sucá.
Cerca de uma semana antes do início do feriado, Rabi Vogel pediu
voluntários para ajudar na construção da sucá
da comunidade. Eu já tinha vivido uma porção de “primeiras
vezes” desde que descobrira Chabad de Delaware, portanto pensei:
por que não?
Mais tarde naquele dia, seis de nós nos reunimos na casa do Rabino
e começamos a construção. Apesar do fato de que nossos
ancestrais já construíam estas estruturas temporárias
há mais de 3.300 anos, esta era a primeira vez que eu fazia parte
da equipe da obra. Todos juntos, nós colocamos grandes painéis
de compensado e criamos uma habitação temporária
com quatro paredes.
Como tenho 1,85 m de altura, fui colocado para montar o s’chach.
O que é s’chach, você pergunta? Olhe, eu também
não consigo pronunciar. Rabino Vogel informou que s’chach
são os galhos frescos que ajudam a formar o telhado da sucá.
Eu tive a honra de colocar o s’chach sobre os troncos de bambu que
serviam como estrutura de apoio.
Demorou cerca de vinte minutos para colocar todo o s’chach sobre
o telhado, mais quatro horas para eu quase aprender a pronunciar o nome
corretamente. Por mais que eu tente, não consigo fazer esta palavra
sair da minha boca!
Depois de todo o tempo e trabalho empregados, eu mal podia esperar pela
chegada da Festa de Sucot. Eu quase conseguia sentir o aroma da refeição
do Shabat que iríamos saborear no aconchego de nossa morada temporária.
Aquilo prometia montanhas dos famosos kuguel da Rebetsin e a melhor sopa
de bolas de matsot do lado de cá de Jerusalém!
Naquele Shabat, cheguei à casa dos Vogel vestindo minhas melhores
roupas de Shabat, e proclamei a todos que quiseram ouvir que eu estava
preparado a comer na sucá. Depois de rezarmos Maariv, todos se
mudaram para a sucá e o Rabino recitou o kidush sobre o vinho.
Na metade do kidush eu ouvi o som inconfundível da chuva. Olhei
para o Rabino, a Rebetsin e as crianças deles, e ninguém
parecia prestar a mínima atenção nas gotas que caiam.
Concluí que eles estavam confiantes que o s’chach formaria
uma barreira impenetrável e nos manteria secos durante as festividades
da noite.
Momentos depois, o Rabino completou o kidush e todos fomos lavar ritualmente
as mãos antes de recitar a bênção Hamotzi sobre
a chalá. Quando voltamos, uma forte tempestade estava caindo do
lado de fora. Rabino Vogel passou-me um pedaço de chalá
e eu disse a bênção e tirei um pedaço. Eu mal
tinha colocado a chalá na boca quando uma enorme gota de água
atingiu-me na ponta do nariz. Passaram-se alguns instantes e mais e mais
gotas começaram a cair do telhado. Olhei em volta da mesa e ninguém
estava prestando a menor atenção aos rios de água
que caíam livremente do “teto”.
A Rebetsin serviu a sopa e de repente um pedacinho de s’chach fresco
pulou bem no meio da minha tigela. Para meu constrangimento, a chuva na
sucá começou a aumentar. Minhas roupas ficaram molhadas,
mas pior de tudo, minha chalá se transformou numa massa ensopada!
Entregando a precária fatia para o Rabino, perguntei se não
estaria na hora de continuar a “festa” lá dentro, onde
estava quente, seco e confortável.
Rabi Vogel pegou um pedaço da chalá ensopada e, apontando-o
na minha direção, disse: “Shloma Yacov, ninguém
jamais disse que uma mitsvá tem de ser fácil. Por 3311 anos
nossos ancestrais têm cumprido a mitsvá de ‘habitar’
numa sucá. No Alasca, neste exato momento, faz dez graus abaixo
de zero e os ‘congelados escolhidos’, como o Rabino Yossef
Greenberg com sua congregação, estão celebrando o
Shabat numa sucá com alegria e disposição. Esqueça
a chuva e concentre-se no júbilo de cumprir a mitsvá Divina
de comer na sucá e honrar a memória dos nossos ancestrais
que viveram em habitações como esta durante quarenta anos.”
Ele esperou um instante para suas palavras surtirem efeito e depois acrescentou:
“Mas… se a chuva realmente o incomoda, sinta-se à vontade
para ir lá para dentro.”
Eu estava contemplando suas palavras quando uma outra grande gota caiu
bem em cima do meu nariz, desafiando-me a ir para a casa com todo o meu
coração. Sentado perto de mim estava o filho mais novo do
Rabino, Shalom. Ele estava indiferente à chuva, enquanto brincava
feliz com sua chalá e kuguel ensopados. Finalmente cheguei à
conclusão de que, se um garoto de cinco anos podia ficar, eu também
podia. Portanto, fiquei.
Apesar de a chuva continuar a tamborilar no s’chach, nós
continuamos com nossa refeição festiva. O rabino e eu partilhamos
l’chayim, comemos mais um pouco de kuguel ensopado, cantamos mais
algumas canções e apreciamos juntos a noite. A chuva não
parou de cair um só instante, e quando fui para casa naquela noite
eu estava encharcado até os ossos. Mas quando parei de pensar na
chuva e me concentrei na alegria e deleite da mitsvá, no momento
e no dia festivo, o desconforto logo deu lugar a uma sensação
cálida de alegria e contentamento.
Mais uma vez agradeci a D’us por ter me levado a Chabad, onde as
lições são aprendidas numa centena de maneiras diferentes.
Às vezes aprendemos estudando Torá. Às vezes aprendemos
num farbrenguen (reunião chassídica) e às vezes aprendemos
ao comer um pedaço ensopado de kuguel no meio de uma sucá
inundada. Oh, sim, eu também aprendi que até um pedaço
molhado de kuguel é melhor que kuguel nenhum!
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