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Nem
sempre o homem vive todos os seus dias. A vida pode terminar algum tempo
antes da morte. E para Reb Yankle, a vida terminou quando ele saiu do
chêder. Desde então, a vida tem sido apenas um longo momento,
onde as coisas simplesmente acontecem.
Quando ele tinha nove anos, sua mãe faleceu. Foi enviado para morar
com uma tia. A família de Tia Rose era secular, e Yankle nunca
mais ganhou Chanucá guelt. Três anos no Exército Vermelho.
A Guerra. A morte prematura do único filho. A morte recente de
sua mulher. Pensão mensal e sopa diária.
Yankle é o primeiro judeu que eu encontro na grande sinagoga em
Cracóvia. No Shabat sento-me perto do resmungão, triste,
velho Reb Yankle. D'us preza os pobres e os cegos, e quando eu balanço
meus pés perto dos seus sapatos, sei o porquê.
Yankle
nunca chora. Pelo menos não chamo aquilo que choro. Seus olhos
se enchem de água, depois ele morde o lábio inferior.
Yidish. Adoro seu yidish. Ber, Chaimke, Hershel: ele conta os amigos de
infância com os dedos. Depois morde seu lábio. Ele é
o único que restou.
Política ou temas atuais, Yankle não está interessado.
Enojado com tudo isso, resmunga ele. "Ahhh" e balança
a mão.
O inverno leva embora todas as folhas; as poças se transformam
em gelo. E no Shabat, o assento de Yankle está vazio. Yossi e eu
decidimos visitá-lo em casa. Foi quando eu conheci um velho chamado
Yankle.
Atulhado. O aposento único em que ele mora parece mais velho que
ele. O pequeno quarto é como uma gaiola, trancando meu mundo lá
fora. Yossi e eu nos sentamos na cama coberta com jornais; ele está
sentado. O médico e o clima lhe disseram para ficar em casa, Reb
Yankle precisa de um favor; precisa de pão.
Yossi e eu passamos bastante tempo na casa dele. O pão que levamos
é sempre do tipo errado. Ele diz "Ahhh" e balança
a mão. Não é aquilo que ele sonhou, mas vai servir.
Ele não implora com as mãos; implora com os olhos. E é
assim que você conhece Reb Yankle; olhando nos seus olhos.
Yankle gosta de repetir sempre as mesmas histórias de sua aldeia,
como se nada mais tivesse acontecido. Sentamos com ele e falamos. Na maior
parte do tempo, nos sentamos apenas porque ele quer que fiquemos ali.
Suponho que todo rapaz de vinte anos deveria ter um velho amigo de oitenta
e oito.
Hoje, Yankle começa a procurar loucamente alguma coisa. Yossi o
ajuda a levantar o colchão. Ele empurra lixo para frente e para
trás; a poeira está ficando insuportável. Yossi manda-o
sentar-se e promete achar aquilo que termina por ser uma bolsa de veludo
com um tefilin, E encontra.
Os olhos de Yankle querem tocá-lo. Seu braço esquerdo se
move na minha direção. Ele quer colocá-lo. Ali de
pé, imóvel, ele está se comunicando com o céu.
Eles conversam durante algum tempo. De repente ele grita: "Pintele
Yid!" apontando para o seu peito, como um general exibindo sua patente.
Yossi pegou o tefilin. Após nos abençoar com uma vida longa,
o sábio volta à cama. Reb Yankle então fecha os olhos.
O sol está se pondo lá fora.
Naturalmente, eu sempre tive medo de chegar ao seu apartamento e encontrá-lo
morto. Afinal, ele falava sobre si mesmo como se já estivesse morto,
e não tendo motivo para viver.
Comecei a suar.
E então, com um sorriso genuíno, todos os temores da vida
caem por terra. Reb Yankle tinha encontrado aquilo que estava procurando.
Pela primeira vez ele estava contente. Eu tinha testemunhado a ressurreição
dos mortos.
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