Os barris na neve

 

Por Tuvia Bolton

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Conta-se a história de um chassid que, todo ano no primeiro dia de Elul, começava uma caminhada até a casa do seu Rebe, Rabi Menachem Mendel de Lubavitch (1789-1866), para passar os Grandes Dias Festivos com ele.

Ora, esta não era uma tarefa fácil, porque o clima era congelante e nevava muito nesta época do ano na Rússia. E ficava cada vez mais difícil à medida que nosso chassid ia envelhecendo a cada ano, porém mesmo assim ele mantinha o costume. Até que finalmente um ano, numa estrada solitária no meio de uma floresta coberta de neve, ele cedeu ao cansaço. Suas pernas simplesmente não podiam dar mais um passo sequer.

"Nu?! Pelo menos estou morrendo a caminho da casa do Rebe" – consolou-se ele. "Espero ter um funeral judaico e que os animais não me devorem." Ele estava a ponto de ter um colapso na neve quando de repente ouviu um barulho à distância.

Era uma carroça! Parecia estar longe, mas os sons eram inconfundíveis: rodas gemendo na neve e o trotar de cavalos. De quando em quando o vento trazia algumas notas da música que o condutor estava cantando. Não demorou muito e ali estava; era uma carroça carregada com grandes barris, e parou à frente do judeu que congelava. "Hei Moshke!" gritou o carroceiro (era assim que os não-judeus se dirigiam a todos os judeus). "Ei! Quer uma carona? Se conseguir achar um cantinho, pode pular para cá!" e esticou a mão. Com força renovada, o velho chassid, agradecido, agarrou a mão, pulou para cima da carroça, esgueirou-se entre os barris e finalmente acomodou-se no meio deles enquanto o veículo continuava a viagem.

Porém a gratidão não o manteve aquecido. Após alguns minutos encolhido entre os barris foi brutalmente lembrado do frio que fazia, e o fato de não conseguir mover-se não ajudava em nada.
Foi então que notou uma torneirinha que se destacava para fora de um dos tonéis.
"Talvez seja vinho, ou vinagre, ou qualquer outra coisa" – pensou ele consigo mesmo. "Mas, poderia ser…"

Com a mão trêmula girou a manivela sobre a torneira. Não, não era vinho ou óleo, nem vinagre ou coisa semelhante. era… vodca!

"Ivan" – gritou ele para o carroceiro – "preciso tomar um pouco da sua mercadoria aqui, estou congelando! Eu pagarei, prometo. Posso tomar um copinho?"

"Claro, meu amigo!" gritou o condutor por cima do ombro. "Tome quanto precisar! Está muito frio aqui fora!"

O segundo copo estava melhor que o primeiro, e num minuto ele estava aquecido. Ficou feliz! Estava indo ver o Rebe! D'us fizera um milagre para ele! Começou a cantar. Não demorou muito e o carroceiro começou a cantar com ele e, desnecessário dizer, as dez horas da viagem passaram como minutos.

Antes que ele se desse conta, chegaram a Lubavitch. O condutor ajudou-o a sair do "assento", deu-lhe um grande abraço e um beijo na face, e separaram-se amigavelmente. Nosso chassid foi direto à sinagoga, onde imediatamente reuniu todos os presentes ao seu redor e disse que queria dizer-lhes alguma coisa.

"Hoje eu aprendi uma grande lição" – começou ele, esfregando as mãos para aquecer-se. "Vocês sabem que a Torá é comparada à água, certo? Porém espera-se que a Torá mantenha a pessoa aquecida e feliz, e é por isso que o Báal Shem Tov e todos os Rebes começaram a ensinar a Chassidut – para deixar os judeus aquecidos e felizes, certo? A Torá inclui todos os tipos de água, portanto a Chassidut deve ser a vodca da Torá, certo? A parte da Torá que torna você feliz e aquecido, concordam?"

Ninguém sabia exatamente aonde ele queria chegar, mas todos o respeitavam por causa da idade e esperaram que continuasse. "Bem, eu acabo de descobrir que um chassid pode estar cercado por barris de Chassidut, por um mar de Torá, e mesmo assim sentir frio e quase congelar.
"Mas… se apenas um pouquinho vai para dentro… Ahhhh. Então é uma história completamente diferente! Ele fica aquecido e vivo. Na verdade, então, ele pode até aquecer o mundo inteiro ao seu redor…"

       
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