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Shabat no Chabad ao norte de Nevada, localizado no centro da "Maior
Cidadezinha do Mundo", Reno, é sempre uma ocasião festiva
e alegre. Desde o frango assado até o kugel de batatas de dar água
na boca, Rebetsin Sarah Cunin agrada nossas papilas gustativas com muitas
das melhores iguarias do Shabat.
Lembro-me de um Shabat em especial há alguns meses. Sexta-feira
à noite fomos festejar com os deliciosos quitutes da Rebetsin.
No dia seguinte, Rabi Mendel Cunin liderou nossa crescente congregação
durante um animado serviço matinal de Shabat, após o qual
todos se reuniram para compartilhar e apreciar juntos um maravilhoso kidush.
Entre suntuosos pedaços de bobka de chocolate e transbordantes
colheradas de cholent fumegante (cozido que é mantido quente durante
todo o Shabat), discutimos as verdadeiras alegrias do Shabat e as leis
pertinentes à proibição de trabalhar neste dia especial.
A maioria de nós estava confusa sobre a definição
de trabalho, e o que pode ou não pode ser feito no Shabat.
Aprendemos que trabalho é definido como as tarefas associadas com
a construção do santuário nos tempos antigos. Depois
de uma acalorada discussão, todos passamos a entender melhor este
conceito básico e tão importante. Divertindo-nos imensamente,
continuamos a atirar perguntas ao Rabino, e com a agilidade de um campeão
ele as respondia com graça e paciência.
Durante aquela tarde alguém perguntou ao Rabino se era permitido
ter um negócio que permanecesse aberto no Shabat, mesmo que o proprietário
judeu não trabalhasse, mas sim guardasse o Shabat. O Rabino deixou
claro que um judeu deveria afastar-se desse tipo de empreendimento e além
disso, não deveria extrair qualquer lucro financeiro de dinheiro
ganho no Shabat.
Não prestei realmente muita atenção nessa parte da
discussão porque não sou dono de um negócio e não
faço coisa alguma para ganhar dinheiro no Shabat.
Encerramos aquela tarde com uma maravilhosa discussão sobre o conceito
de coincidência. No fim, todos concordamos que não existe
essa história de coincidência na vida, e que a mão
de D’us pode ser vista em muitas maneiras diferentes, bastando a
pessoa simplesmente abrir os olhos e o coração.
Mais tarde naquele dia, cheguei em casa e ouvi alguém deixando
uma mensagem na secretária eletrônica. Era a corretora de
imóveis, chamando do Oregon. Ela estava informando que após
cinco meses de tentativas para vender minha casa, cinco meses durante
os quais eu não recebera uma única oferta, finalmente tínhamos
uma proposta legítima para o imóvel. Ela prosseguiu dizendo
que a pessoa estava deixando o país para umas férias e que
era imperativo fechar o negócio imediatamente.
Fiquei ali na porta, paralisado, com medo. Tínhamos nos mudado
do Oregon para Reno em janeiro. Durante meses, eu rezava a cada dia para
que "hoje" fosse o dia de alguém querer comprar nossa
casa. Com o passar dos meses, fiquei cada vez menos esperançoso
de que conseguíssemos vendê-la a um preço justo. Quanto
mais o tempo passava, mais preocupado eu ficava.
E agora estava literalmente de pé na entrada de minha casa nova
e a corretora dizia que tínhamos de responder imediatamente, ou
poderíamos perder o único negócio existente. Uma
voz em minha cabeça começou a gritar: "Pegue o telefone!
Não estrague o negócio, pegue o telefone agora mesmo!"
Enquanto eu passava pela porta, a corretora desligou. Creio que fiquei
ali parado olhando para o telefone durante uma hora. Parte de mim estava
insistindo para chamá-la de volta, mas a outra parte ficava me
lembrando que era Shabat, e que eu deveria esperar até o dia seguinte.
Enquanto eu travava esta monumental batalha interior, as palavras de Rabi
Cunin voltaram à minha mente.
"Em última análise,
nada positivo jamais deriva de dinheiro ganho no Shabat. De alguma forma,
termina por se perder ou para pagar algum compromisso negativo. Não
importa como você encare isso, uma transação financeira
conduzida no Shabat JAMAIS compensa a longo prazo."
Finalmente, respirei fundo e caminhei lentamente para outro aposento.
Disse a mim mesmo que apesar do pânico em meu coração,
era mais importante abraçar os próprios valores e fé,
que deixá-los de lado quando eles pareciam ser de certa forma inconvenientes.
Passei o restante do dia lendo e relaxando. Após o término
do Shabat, peguei calmamente o telefone e liguei para a corretora no Oregon.
Ela me informou que depois de me telefonar, ela descobrira que realmente
não poderíamos fazer negócio naquele dia pois o corretor
da pessoa que queria comprar a casa estaria fora da cidade até
segunda-feira. Ela desculpou-se por ter deixado uma mensagem tão
urgente, mas pensara que tínhamos apenas um dia para consumar a
venda.
Fingindo indiferença, eu disse a ela que isso não era um
problema, e perguntei de que precisávamos para fechar o negócio.
Discutimos a oferta, preparamos uma contra-oferta e combinamos conversar
no dia seguinte. Dentro de 36 horas a partir de minha conversa com a corretora,
o comprador e eu concordamos quanto ao preço e a venda foi consumada.
Enquanto eu depositava o fone lentamente no gancho, maravilhei-me pela
série de eventos que tinha acabado de ocorrer. No decorrer dos
anos desde que encontrei Chabad, descobri que a procura para tornar-me
mais observante e mais espiritual é uma jornada gradual construída
passo a passo. Às vezes a jornada é fácil, e em outras
vezes as lições são difíceis. Mas uma coisa
é certa; a jornada está sempre repleta de encanto e entusiasmo.
Nos últimos seis anos, posso relatar numerosas conversas sobre
a alegria e os prazeres do Shabat. Mas foi apenas neste Shabat em especial,
neste Beit Chabad específico, que me encontrei envolvido nessa
singular discussão sobre o Shabat. Uma discussão que me
impediu de comprometer meus valores e fazer algo de que me arrependeria
depois. E se isso não bastasse, somente quando tive de me defrontar
com isso e tomar a decisão certa, que finalmente vendi minha casa
no Oregon.
Coincidência? Acho que não.
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