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  Vigilantes do Peso  
 
Por Mendel Kalmenson
 

“Passei os melhores anos da minha vida dando prazeres às pessoas, ajudando-as ter bons momentos, e tudo que recebo é abuso, a existência de um homem caçado.”

Esta frase é de Al Capone.

Sim, um dos mais notórios inimigos públicos, o mais sinistro líder de uma gangue que já existiu em Chicago, pronunciou essas palavras. Capone na verdade se considerava um benfeitor público, um benfeitor mal apreciado e incompreendido.

Perder Peso
“Não cometerás uma perversão da justiça, com [falsas] medidas, pesos ou medidas líquidas. Terás balanças precisas e pesos exatos… Eu sou o Eterno teu D'us, que te tirou da terra do Egito.”

“[Eu te tirei do Egito] sob a condição de que você mantivesse pesos e medidas exatos.”

Por mais estranho que pareça, aprendemos que o Êxodo do Egito foi condicional. Na verdade o Midrash acrescenta: “Se uma pessoa nega a mitsvá de medidas exatas, é como se negasse o Êxodo do Egito!”

Tão importantes são os pesos exatos nos livros de D'us que, segundo um Midrash, os Amalequitas tiveram permissão de atacar os Israelitas porque esses relaxaram no que diz respeito a medidas de peso corretas.

Por que a obsessão com a vigilância do peso?

É interessante, mas a proibição sobre pesos inexatos inclui não apenas o seu uso, mas até mesmo a sua posse, e também a criação de pesos imperfeitos, independentemente de sua futura função.

Esta não é simplesmente uma medida de precaução para eliminar possíveis tentações ou para assegurar que não sejam usados por engano; ao contrário, é uma demonstração de tolerância zero com a falsidade.

O mal inerente associado aos pesos falsos tem menos a ver com a perda ilegal de dinheiro que pode causar do que com a perda da integridade.

Este é o motivo pelo qual a ação legal contra um ladrão somente pode ser tomada se seu roubo for no mínimo de um prutah (a menor denominação monetária nos tempos do Talmud), ao passo que no caso de pesos inexatos não existe este mínimo.

Pois, embora a perda monetária possa ser medida, a perda da integridade não pode.

Essa ideia lança uma luz sobre um comentário que de outra forma seria surpreendente, feito por um notável comentarista do Talmud: “É possível que fazer pesos falsos seja ainda pior que possuí-los e usá-los…”

Ora, a questão de se a criação de pesos falsos é pior que sua posse pode ser debatida, mas como pode-se argumentar que sua criação é pior que usá-los e realmente roubar?

Baseados em nossa distinção anterior entre a perda de dinheiro e a perda da inocência, esta declaração se torna bastante clara.

Uma pode ser prontamente substituída, ao passo que a outra não.

A Duplicidade
Mas a perda da integridade não existe no roubo, também? Por que as medidas desonestas são separadas para um tratamento mais severo?

Porém há uma grande distinção: O ato comum do ladrão consiste em desonestidade e mal puros e simples. Aquele que usa falsas medidas, por outro lado, está professando ao mundo que é honesto. “Olhe.” ele proclama, “estou usando pesos e medidas para assegurar que não roubo sequer um centavo!” Ao mesmo tempo, porém, ele está se envolvendo em roubo.

É um ato de duplicidade.

A essência do pecado de falsas medidas – e aquilo que o distinguiu de todas as outras leis na Torá que são relacionadas a salvaguardar a propriedade pessoal – é a duplicidade.

Porém a Torá condena não somente o ato, mas também até o de guardar as ferramentas do ofício na casa da pessoa.

Pois não basta não enganar os outro; a pessoa também não pode enganar a si mesma.

Tolos Não São Permitidos
“Um chassid não é um tolo,” declara um adágio (obviamente) chassídico.

Essa declaração se refere não à capacidade intelectual, mas à consciência inabalável sobre si mesmo.

Os chassidim pretendiam dizer que o único vrime pior que enganar os outros é enganar a si mesmo.

Em uma história, Rabi Shmuel, o quarto Rebe de Lubavitch, diz a um chassid que carecia deste valor chassídico básico e acreditava que tinha o mundo inteiro no keshene (bolso):

“Somente um tolo pensa que engana o mundo inteiro, Ele está, obviamente, enganado, pois o único que consegue enganar é a si mesmo. É uma (kunts) proeza tão grande assim enganar um tolo?”

Nas palavras do Talmud: “O conhecimento da doença é metade da cura.”

Num tom ligeiramente mais leve, um empresário certa vez não aceitou o conselho que tinha recebido de seu Rebe. Infelizmente, ele perdeu uma fortuna e passou a enfrentar uma dívida enorme.

Envergonhado, mas sem outra opção, visitou o Rebe para pedir uma bênção.

“Como posso ajudá-lo?” perguntou o Rebe, que tinha sido informado sobre o prejuízo do chassid.

Este respondeu com uma história:

“Um ladrão da aldeia entrou numa casa pela chaminé certa noite.

“Para sua surpresa, após limpar a cinza que o tinha encoberto, ele se viu face a face com o rabino da cidade que tinha ficado estudando durante toda a noite.

“Posso ajudá-lo?” perguntou o rabino distraído.

“Tenho uma pergunta que gostaria de fazer-lhe,” respondeu o ladrão.

“Diga.”

“Vee kricht men aroys fun danet?” (Como se faz para sair daqui?)”

O Rebe sorriu.

“Se você cair por uma chaminé, limpe-se, e procure uma saída.”

O Que Há Nisso Para Mim?
Um jornalista judeu certa vez visitou o Rebe. Falou sobre o “velho mundo” e eles trocaram reminiscências. O Rebe comentou de passagem: “Aqui na América alguns dos meses judaicos no calendário poderiam ser reforçados.”

Fazendo um trocadilho, o Rebe continuou: “Veja, por exemplo, o mês de Cheshvan, do termo Cheshbon Hanefesh, que significa auto-avaliação.

Se ao menos aumentássemos nosso senso de auto-introspecção e conscientização, nosso mundo seria um lugar melhor.

Imagine só como Chicago teria sido se Al Capone tivesse praticado algum Cheshbon Hanefesh.

 

 

 
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