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Abraham Foxman
e Rabino Leo Goldman se encontram novamente após 65 anos. Um esteve
na memória do outro durante todo este tempo. (David Brystowski).
No outono de 1945, um soldado soviético encontrou um menino de
5 anos perdido e levou-o até uma sinagoga lituana que fora fechada
no decorrer de uma longa ocupação nazista.
Goldman
[à esquerda] era um soldado soviético ao encontrar
Foxman pela primeira vez [abaixo], ainda menino. O encontro entre
ambos tornou-se uma lenda dentro de suas respectivas famílias.
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Durante 65 anos, o menino e o soldado guardaram aquele
momento na mente e no coração. Desconhecidos um para o outro,
eles contaram a história para a família e amigos. Um compositor
de Toronto imortalizou o fato numa canção. O menino tornou-se
um homem e incluiu o fato em seu livro, escrito em 2003.
Este ano, eles se encontraram pela primeira vez desde então, na
sala de visitas de Rabino Leo Goldman em Oak Park.
“Foi emocionante, muito mais do que eu teria esperado,” diz
o ex-menino. Ele é Abraham Foxman, o diretor da Liga Anti-Difamação
baseada em Nova York. Neste cargo, ele tem uma voz pública contra
a intolerância racial e religiosa.
O soldado é Goldman, 91 anos, um rabino ortodoxo em Oak Park e
educador, que trabalhou como capelão no Hospital Beaumont até
poucos meses atrás.
“Contamos essa história todo ano,” diz Rose Brystowski,
a filha do rabino, dizendo que seu pai tornou-se frágil demais
para ser entrevistado. “Para nós é muito comovente,
porque trata-se de sobrevivência, sobre uma criança simbolizando
o futuro de nosso povo.”
A lembrança continua vívida para Foxman: Ele tinha morado
com sua babá católica, separado de seus pais e escondido
dos nazistas, como uma “criança oculta”, durante quatro
anos.
Ele tinha vivido com sua babá católica,
separado de seus pais e escondido dos nazistas.A babá salvou-lhe
a vida – mas também ensinou- a cuspir no chão quando
um judeu passava.
Em 1945, ele foi reunido aos pais. Seu pai esperou quatro meses para levá-lo
a uma sinagoga na festa de Simchat Torá, um dia festivo que celebra
a leitura da Torá – o Velho Testamento – em rolos escritos
à mão. “Aquilo foi muito inteligente da parte dele,
porque é uma festa divertida para as crianças,” diz
Foxman, que se lembra de passar por uma igreja e fazer o sinal da cruz
ao entrar na sinagoga pela primeira vez.
Para Goldman, que foi ferido duas vezes quando soldado e que perdeu os
pais para os nazistas, o retorno à sinagoga em Vilna naquele dia
também foi importante. Os campos de concentração
tinham sido liberados, os judeus estavam se reunindo com suas famílias
em toda a Europa, e na Lituânia, ser judeu não era mais um
crime capital. A maioria tinha sido dispersa ou exterminada. Somente 3.000
dos 100.000 judeus de Vilna remanesceram.
“Você é judeu?” perguntou o soldado soviético
ao menino. Quando ele respondeu que sim, Goldman disse: “Viajei
milhares de quilômetros sem ver uma criança judia.”
Então ele abaixou-se, ergueu o menino e dançou com ele pela
sala.
O soldado – um estranho – o tinha
abraçado em público, numa sinagoga.Nenhum dos dois
se esqueceu daquele dia, daquela celebração de religião
e sobrevivência sob circunstâncias extraordinárias.
Porém somente no verão passado, depois que um pesquisador
israelense compôs uma canção chamada “O Homem
de Vilna”, sobre o incidente com um rabino de Michigan, foi que
Foxman soube que o soldado soviético judeu sobre o qual escrevera
em seu livro de 2003 “Nunca Mais?” era Goldman, ainda vivo
e morando nos Estados Unidos. O compositor tinha citado Goldman como a
fonte da história.
Chegar à reunião para o encontro foi tortuoso: Três
anos atrás, Foxman contou a história no Yad Vashem, o Museu
Memorial do Holocausto em Israel. Ali, uma pesquisadora embarcou numa
busca pelo homem dançante de uniforme que Foxman descrevera: por
fim, ela encontrou a canção, inspirada pela história
de Goldman, e o nome do rabino nos créditos. Para Foxman, aquele
dia “era uma lembrança, uma lembrança agridoce.”
O soldado – um estranho – o tinha abraçado em público,
numa sinagoga. Ele o carregara como um troféu na sinagoga.
Goldman era um soldado soviético quando encontrou Foxman pela primeira
vez, então um menino. O encontro ao acaso tinha se tornado lendário
em suas respectivas famílias.
“Foi o início de minha vida como
judeu”“Aquela foi a primeira vez que alguém
se orgulhou de mim,” diz Foxman, que como “uma criança
escondida não sabia quem ou o quê eu era.”
Para os dois homens, a lembrança estava congelada no tempo, sem
estar conectada a qualquer pessoa viva.
“Pensei que a história era uma espécie de lenda,”
recorda Brystowski. “Sempre acreditei em meu coração,
mas em outro nível, eu me perguntava: Aquilo realmente aconteceu?”
Ela ficou surpresa quando soube, no último verão, quando
Foxman telefonou, que “este homem importante, adulto,” era
o menino sobre o qual ela crescera ouvindo falar.
O menino mítico tinha se tornado um homem real e bastante proeminente.
“Isso nos mostra que qualquer gesto, qualquer mitsvá ou boa
ação podem ter um impacto,” diz ela.
No enconytro entre os dois homens, eles se abraçaram, conversaram
e recitaram uma tefilá, prece; uma bênção que
é um lembrete da importância de celebrar a vida no momento.
“E um privilegio ter vivido o suficiente para chegar a este momento,”
Foxman disse que Goldman comentou com ele.
Os pais de Goldman e seu irmão mais velho foram mortos pelos nazistas.
Os primeiros anos de Foxman como “criança escondida”
vivendo com segredos e mentiras, o levaram a escolha de uma carreira de
falar publicamente contra injustiça e ódio.
Para cada um dos homens, a lembrança de dançar numa sinagoga
em Vilna foi um momento importante. “Cheguei em casa e disse ao
meu pai que queria ser judeu,” recorda Foxman. “Foi o início
de minha vida como judeu.”
Cada um dos homens guarda a memória de um momento – uma dança
na sinagoga – que simbolizou naquela época e durante suas
vidas a promessa de liberdade, fé e vida.
Finalmente, o menino e o soldado que trazem fantásticas lembranças,
agora se conhecem como dois adultos que, contra todas as possiblidades,
sobeviveram e se encontraram. |