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  O Sobrevivente  
  Por Shemuel Marcus
 

A neve da sexta-feira se transformou em gelo escorregadio.
Sabe, você pode ser multado por não tirar a neve na calçada em frente à sua casa.
E já era domingo à noite.
Era uma noite fria no Brooklyn.
Eu tinha passado o dia todo na yeshivá estudando Torá.
Melhor eu trabalhar depressa.
A água pode ficar bem dura quando congela.
Whack. Whack.

Eu estava fazendo pouco progresso,
As vibrações do metal esmagando rocha cortada faziam tremer minhas mãos.
Whack. Whack.

As casas de tijolos ao fundo estavam lentamente desaparecendo.
Whack. Whack.

O jipe estacionado e o poste da rua já tinham sumido.
Whack. Whack.

As vozes estão ficando mais altas.
Trabalha, judeu.
Trabalha!
Os soldados latiam para mim por sob seus casacos quentes de pele.
Whack. Whack.

Eu precisava do Kleenex do bolso da minha jaqueta.
Mas ele se fora.
O funcionário da KGB o tirara de mim na semana passada.
Delinqüentes juvenis não merecem isso, disse ele.
Whack. Whack.

Vamos, Moshe, depressa, ou eu o farei usar as mãos.
Meu nome não é Moshe.
O nome do meu avô era Moshe.
Em 1928 ele foi apanhado estudando a Torá proibida e enviado à Sibéria.
Whack. Whack.

Comecei a rezar.
Eu não pedi a libertação ou um café quente.
Eu rezei para que meu neto continuasse a luta.
Fiz meu turno de oito horas de trabalho em quinze minutos,
O campo de trabalho desapareceu e voltei para dentro de casa.
Bebericando meu drinque fumegante, perguntei-me como eles fizeram aquilo.
Eles, os prisioneiros.
Eles, os soldados.
Moshe nunca deixou a Sibéria.
Mas ele é um sobrevivente.
Eu sou a prova viva disso.

     
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