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Há pouco tempo,
em nosso Instituto de Estudos Judaicos, organizei uma pequena série
de palestras intitulada "Lágrimas de Alegria, Lágrimas
de tristeza".
Diversos oradores convidados examinaram a alegria e a tristeza sob diferentes
pontos de vista – desde uma perspectiva mística até
o aspecto psicológico. Os rabinos falaram sobre os aspectos espirituais
da alegria e ensinaram os textos fonte que descrevem um tempo de eterno
júbilo. Um psiquiatra explicou as emoções que sentimos
que nos fazem mergulhar nas profundezas dos piores sentimentos de desamparo,
fornecendo ferramentas práticas para emergir "da desolação
para a paz."
Pedi então a uma amiga para falar de sua perspectiva pessoal. Chamei
sua palestra de "D'us Se
importa quando estou triste?"
Eu não tinha certeza se minha amiga ficaria à vontade para
abrir-se num nível tão pessoal. Porém
percebi que o tema era suficientemente amplo para que ela o abordasse
a uma certa distância, ou – se ela quisesse – mais intimamente.
Porém, eu estava certa de que esta amiga tinha experimentado sua
cota de tristezas e tragédia. Eu sabia que ela tinha lidado exatamente
com isso, mais de uma vez.
Embora contasse
apenas vinte e poucos anos na época, minha amiga Esther tinha lutado
e vencido o câncer por duas vezes. E como se isso não bastasse,
ela perdera um filho nas circunstâncias mais penosas.
Esther tinha aconchegado seu filho de dois anos para dormir certa noite,
com um caso simples de catapora. Ela acordou na manhã seguinte
para encontrar o filho morto no berço. Uma infecção
sangüínea o tinha fulminado durante o sono, e na noite negra
e silenciosa os órgãos da criança entraram em falência,
um a um.
O momento em que seu
filho fechou os olhos pela última vez, ou se chegou realmente a
chamar os pais, ninguém sabe. Mas a dureza da realidade confrontou
Esther pela manhã, com o corpo frio do filho que jazia perante
seus olhos descrentes.
Nossa comunidade ficou em estado de choque com o desaparecimento súbito
dessa vida tenra. Porém pessoa alguma podia imaginar a dor e o
abalo sentidos pela jovem mãe.
Passaram-se muitos anos desde aquela noite trágica, e Esther teve
vários outros filhos. Porém o trauma de uma perda tão
imensa é uma ferida que jamais cicatriza por completo. Embora a
dor amaine um pouco, o vácuo deixado é sentido para sempre.
Minha amiga começou seu discurso dizendo: "Embora eu não
conheça muitas de vocês, sei o motivo de Chana ter me pedido
para falar esta noite."
Percebi
que sua apresentação foi a resposta mais poderosa
à dúvida que sempre nos aflige: D'us Se importa
quando estou triste?
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A princípio,
Esther tinha nos pedido: "Por favor, não se incomodem com
minhas lágrimas, pois esta é a primeira vez que falo publicamente
sobre um assunto tão pessoal. Mas quando Chana convidou-me, senti
que chegara a hora de enfrentar o desafio e ver se eu conseguia compartilhar
minha experiência."
Ela explicou brevemente os eventos da morte de seu filho e continuou a
referir-se àquilo como "aquela noite" porque era, compreensivelmente,
difícil demais enunciar as palavras "a morte de meu filho".
Esther discorreu sobre as várias etapas pelas quais passou ao lidar
com sua dor. Durante o primeiro ano, precisou de toda sua energia apenas
para se levantar de manhã e vestir-se. Ela descreveu como tinha
pedido a meu pai, seu rabino, enquanto ele a visitava durante a shivá,
para dizer-lhe algo – qualquer coisa, qualquer lição,
quaisquer palavras de conforto. Ele respondeu, sabiamente: "Não,
agora não. Agora ainda não é tempo."
Esther explicou como isso validava a necessidade, para alguém que
passava pela perda de um ente querido, de prantear, de sentir as profundezas
da dor enquanto ainda cego pelo sofrimento, antes de procurar entender.
Esther nos leu passagens de seu diário. Ela mostrou-nos, entre
suas anotações, seus poemas e reflexões, como ela
passara pelos vários estágios do processo de cura. Descreveu
sua profunda proximidade com D'us durante seus conflitos. Às vezes
ela se sentia cheia de perguntas, raiva, depressão e tristeza,
mas apesar disso, seu relacionamento com D'us ficou ainda mais intenso
do que jamais tinha sido.
Com enorme convicção, descreveu sua recém encontrada
percepção e sensibilidade, à medida que D'us se tornava
uma constante verdadeira em sua vida.
E então ela falou sobre sua consciência, desenvolvendo-se
e expandindo-se em consideração por outros que passavam
por provações semelhantes. Lembrou-se de algo que sua mãe
lhe dissera: "Minha filha querida, apesar do sofrimento que você
está sentindo, precisa entender que você não possui
direitos autorais sobre a dor. Há outros que sentem dor e sofrem.
Ter consciência disso de maneira alguma diminui sua própria
dor, mas ao contrário, lhe dá as ferramentas para ter uma
maior sensibilidade."
Esther encontrou estas ferramentas e aquela força interior para
falar conosco naquela noite.
Todas as palestras naquela série foram interessantes, relevantes
e informativas, mas a de Esther atingiu um lugar mais profundo dentro
de cada uma de nós – exatamente porque ela falara com o coração,
de forma pessoal e honesta.
Ficamos mais fortes com sua coragem; desenvolvemos uma nova fé
a partir de sua fé; e choramos, aberta ou interiormente, junto
com as lágrimas que abriam caminho por seu rosto.
À medida que eu refletia sobre a palestra, mais tarde, percebi
que sua apresentação foi a resposta mais poderosa à
dúvida sempre presente que nos aflige a todos – D'us Se importa
quando estou triste?
Como um ser humano pode encontrar força e coragem para emergir
de tamanho sofrimento pessoal e ainda seguir funcionando? Além
disso, o que deu a ela a força para partilhar suas experiências
mais íntimas e pessoais para que outros, também, pudessem
aprender e crescer?
E o que leva as pessoas a abandonar sua própria indiferença
e apatia para abraçar profundamente as vivências de uma estranha,
revivê-las com ela, e se transformar durante este processo? O que
nos faz sentir tamanha dor quando outro ser humano está triste,
e tamanha preocupação com o sofrimento do outro?
Tamanha empatia, carinho e partilha somente podem ser evocados por meio
do poder do âmago Divino, e da conexão com cada um de nós.
À medida que a centelha Divina em cada um de nós aflorava
naquela noite, o que era tão explicitamente revelado – mais
convincente que qualquer argumento poderia ser – foi que nós
nos importamos, única e simplesmente, porque Tu, D'us, Te importas.
Chana Weisberg é
autora de dois livros – sobre a vida de mulheres bíblicas e
sobre a alma feminina – e atualmente está trabalhando em outros
dois. É reitora do Instituto de Estudo de Torá JRCC em Toronto,
e faz palestras em todo o mundo sobre temas femininos, relacionamentoe e
misticismo. |