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Elliot
Abrams, num recente artigo no Wall Street Journal, mostra como desde que
o Presidente Obama foi empossado em 20 de janeiro, e em seguida o Primeiro
Ministro Benjamin Netanyahu em 31 de março, o principal tema nas
relações entre os dois países tem sido o atrito.
Enquanto quase 80% dos judeus americanos votaram em Obama, aquele atrito
tem sido suficientemente visível para fazê-lo marcar um encontro
recentemente com líderes judeus americanos para reassegurá-los
sobre suas politicas. Porém no mês passado, apesar dessas
reafirmações, tanto a Conferência de Presidentes das
Grandes Organizações Judaico-Americanas como a Liga Anti-Difamação
emitiram declarações criticando o tratamento de Obama à
questão de Israel. Devido às calorosas relações
durante os anos do governo Bush e as repetidas declarações
do candidato Obama de comprometimento no sentido de manter as melhores
relações com Israel, isto está preocupando muitos
judeus.
O ponto de contenção discutido com maior frequência
são os “assentamentos”. A administração
Obama está buscando um “congelamento” total no “desenvolvimento
dos assentamentos israelenses”, presumindo que eles são o
grande obstáculo para a paz.
Infelizmente, o tema dos assentamentos e seu futuro estão novamente
na pauta das discussões. Tentemos adquirir perspectiva, à
medida em que embarcamos numa humilde jornada através do pensamento
bíblico, sabedoria talmúdica, doutrina sionista e os fatos
que temos em mãos.
Graças Após as Refeições
Em Devarim, na porção semanal Ekêv a Torá nos
instrui a bendizermos a D'us após fazer uma refeição.
“Tu comerás e ficarás satisfeito, e agradecerás
ao teu D'us pela terra maravilhosa que Ele te deu1.
Assim foi inventado o ritual de “benching” (yidish, para bênção),
ou “Graças Após as refeições”,
recitado após toda refeição de pão, e consistindo
em varias seções, ou bênçãos. Na primeira
expressamos gratidão pelos recursos que D'us criou no mundo para
alimentar Suas criaturas. A segunda bênção é
um agradecimento pela linda terra que Ele deu ao povo judeu. Na terceira,
agradecemos e rezamos por Jerusalém. Essas três bênçãos
foram criadas para ecoar a ordem bíblica “Comerás
e ficarás satisfeito e agradecerás a D'us pela terra maravilhosa
que Ele te deu,” relacionando gratidão por uma refeição
com gratidão pelo solo que produziu a refeição2.
Porém há uma lei estranha associada a este ritual. O Talmud
declara3 que a segunda bênção, na qual expressamos
nossa gratidão pela terra, deve incluir algumas palavras sobre
o pacto que D'us fez com o primeiro judeu, Avraham. Nesse Pacto, registrado
em Bereshit, D'us prometeu a Avraham que Ele lhe daria a Terra de Canaã
como um legado aos seus descendentes (a circuncisão de todo bebê
judeu do sexo masculino representa este Pacto). Além disso, nessa
bênção devemos também mencionar a Torá,
a Divina constituição para o povo judeu, que promete –
muitas vezes – a terra de Canaã para os judeus.
Em outras palavras, os Sábios estão sugerindo que é
necessário não apenas agradecer a D'us pela linda terra
em si, mas também devemos articular a fonte para os nossos direitos
a esta terra: o Pacto de Avraham e a Torá. Daí, a versão
padronizada das Graças Após as refeições:
“Oferecemos graças a Ti, Eterno nosso D'us, por teres nos
dado como herança aos nossos ancestrais uma terra boa, espaçosa
e preciosa… pelo Teu Pacto que selaste em nossa carne, e pela Tua
Torá que nos ensinaste.”
Benching vs. Hatikvah
O Talmud é tão enfático sobre a inclusão desses
dois conceitos – o pacto e a Torá – que declara:4 “Quem
não mencionar o Pacto e a Torá na bênção
pela terra (a segunda bênção de Graças Após
as refeições) não cumpriu sua obrigação.”
A pessoa deve repetir suas Graças Após as Refeições.
Isso parece estranho. A Torá meramente declara: “Comerás
e ficarás satisfeito e agradecerás a D'us pela terra maravilhosa
que Ele te deu.” A Torá apenas deseja que expressemos apreciação
pela terra. Ponto final. Por que a necessidade absoluta de mencionar o
Pacto com Avraham e a Torá? O que há de errado com uma simples
oferta de agradecimento por um lindo país?
De fato, o Hino Nacional de Israel, que tem abrilhantado incontáveis
funções judaicas nos últimos 61 anos, faz exatamente
isto. Fala sobre “a esperança judaica de 2.000 anos de ser
um povo livre em sua terra, a Terra de Tsion e Jerusalém.”
Não faz menção do pacto entre D'us e Avraham ou à
Torá como a base moral para estabelecer o moderno Estado de Israel.
Similarmente, os signatários da Declaração de Independência
Israelense, feita em maio de 1948, não fizeram menção
a D'us ou à Torá. Após muito debate, resolveram inserir
a frase ambígua “a Rocha de Israel” (Tzur Yisrael),
para ser interpretada como se quisesse.
“Colocando nossa confiança na Rocha de Israel, colocamos
nossa mão e testemunho a esta Declaração, aqui no
solo da Terra, na cidade de Tel Aviv, neste dia, na véspera do
Shabat, 5 de Iyar de 5708, 14 de maio de 1948.”
Esta parece ser uma abordagem racional. Por que misturar religião
com condição de estado? Para uma democracia prosperar, o
pluralismo liberal deve ser mantido. Igreja e Estado precisam ser separados.
Introduzir noções bíblicas no esforço sionista
apenas minaria o sucesso de Israel como uma democracia liberal.
Nachman Syrkin, importante teórico do sionismo socialista, declarou
certa vez: “A religião é o maior impedimento confrontando
a nação judaica no caminho da cultura, ciência e liberdade.”
Torá vs. ONU
Porém os rabinos talmúdicos, há 1.700 anos, aparentemente
entendiam algo sobre a psique judaica e a política do Oriente Médio
que escapou a muitos dos fundadores do moderno Israel.
A conversa política contemporânea convenceu a muitos de nós
que se Israel se retirasse para suas fronteiras pré-1967, os palestinos
pelo menos ficariam em paz com o estado judeu. Daí, o elogio feito
pelo mundo e pela mídia israelense à evacuação
de Gaza em agosto de 2005: este é um passo na direção
correta, o começo do fim da ocupação israelense,
o primeiro passo numa estrada que leva à reconciliação
e à coexistência.
Porém essas esperanças insultam totalmente os palestinos
zombando de seus sonhos e crenças explicitamente declarados. As
palavras deles, repetidas muitas e muitas vezes pelos seus líderes,
não deixam espaço para dúvidas. “Toda a Palestina
pertence a nós,” é a mensagem palestina. O líder
palestino Abu Mazan disse que a saída de Gaza era o início
de um processo que traria como resultado todos os refugiados árabes
retornando aos seus lares pré-1948.
É por isso que não houve paz antes da guerra de 1967, uma
época sem assentamentos judaicos e sem assentados. Gaza pertencia
ao Egito, a Margem Ocidental e a Jerusalém Ocidental à Jordânia,
e as Colinas de Golan à Síria. Por que seis países
árabes decidiram invadir e exterminar Israel? Porque, segundo eles,
toda a entidade sionista é ilegal. Israel inteiro repousa sobre
solo árabe ocupado. Segundo o Corão, os judeus não
têm direito de estabelecer um país auto-governado em solo
islâmico.
É por isso que após a evacuação de Gaza há
exatos quatro anos, Israel não teve um dia de serenidade com os
novos moradores de Gaza. Em vez de demonstrarem a menor apreciação
por Israel ter cedido toda a região de Gaza, milhares de foguetes
têm sido lançados com a intenção de assassinar
o maior número possível de civis.
Você já ouviu algum líder muçulmano sugerir
que os judeus não estão, pela sua própria existência
no solo do Oriente Médio, ocupando terra que não pertence
a eles?
Somente quando Israel cessar de existir a ocupação cessará.
É por isso que ceder Gaza e toda a Margem Ocidental e Jerusalém
Ocidental aos palestinos não trará a paz. A paz não
virá com Israel cedendo território. A paz chegará
quando líderes árabes responsáveis reformarem a cultura
palestina de modo a não enxergar o judeu como “o diabo”
e Israel como “o inimigo de Alá”. A paz virá
quando o mundo, em vez de pressionar Israel a ceder território,
pressionar os pais e educadores palestinos a ensinarem tolerância,
respeito e moralidade civil. Até que este dia chegue, a cessão
de terra por parte de Israel somente vai intoxicar os palestinos com a
esperança de que a agenda deles de libertar toda a Palestina do
inimigo sionista é factível.
A administração Obama aparentemente não se assusta
com o “pequeno” detalhe de que metade da eventual “Palestina”
é controlada pelo grupo terrorista Hamas, que declara claramente
seu objetivo de exterminar Israel inteiro.
A Quem Pertence Este Lar?
Porém eis aqui o que torna tão complicada essa ideia aparentemente
tão simples. Se os muçulmanos em Detroit começassem
a explodir ônibus ou pizzarias exigindo um estado palestino em Michigan,
ninguém questionaria o direito dos Estados Unidos de eliminar os
terroristas e não ceder sequer um centímetro de terra para
eles. Quando um inimigo está decidido a destruir você, então
você deve eliminá-lo. O motivo pelo qual Israel é
tratado de maneira tão diferente é porque muitos veem Israel
como “parceiros no crime”. Alguns palestinos podem ser terroristas
mas Israel, também, partilha a culpa. É um estado ocupado.
Ninguém tem dúvidas de que o estado de Michigan pertence
aos Estados Unidos. Daí vem o direito de lutar por ele e esmagar
qualquer tentativa de dominá-lo. Porém no caso de Israel,
a questão persiste: Israel tem o direito de defender-se enquanto
habita em propriedade roubada?
Onde exatamente Israel traça uma linha e declara: “A partir
daqui estamos de maneira legal?” E baseado em qual ponto legal estas
linhas podem ser traçadas?
A distinção entre Israel pós-1967 e Israel pré-1967
é artificial e mítica. Os árabes dizem que todo o
solo de Israel está ocupado. Devemos enfrentar a dolorosa verdade:
se os judeus que moram em Gaza, na Margem Ocidental e Jerusalém
Ocidental são ocupantes, então os judeus que moram em Tel
Aviv, Yaffa, Haifa e Rosh Piná são os mesmos ocupantes.
Muitas cidades de Israel pré-1967 costumavam ser assentamentos
árabes, agora ocupados por Israel.
Segundo a doutrina árabe, os judeus, especialmente os judeus europeus,
são um implante estrangeiro, forasteiros que colonizaram e ocuparam
a terra árabe nativa desde 1948. Todos os argumentos razoáveis
no mundo e todas as resoluções da ONU combinados não
mudarão a crença de que os judeus são ladrões,
ocupando a terra de milhões de árabes desalojados. É
justo que porque os europeus foram movidos pela culpa após o Holocausto
e foram bons o suficiente para dar aos judeus um pedaço do Oriente
Médio, os árabes tenham de pagar o preço e sofrer?
A Base Moral
Eis aqui uma das maiores falhas do sionismo secular. Sua filosofia não
possui as ferramentas para instilar em seus filhos os fundamentos morais
para chamar Israel de terra judaica.
Se a conexão judaica com o solo entre o Jordão e o Mediterrâneo
brota meramente do sonho sionista de Theodore Herzl de dar aos judeus
desalojados e exilados uma identidade nacional, endossada pela Declaração
Balfour de 1917 e pelo plano de divisão das Nações
Unidas de 1947, sua conexão com a terra permanece frágil
e ambígua. Quando os palestinos gritam: “Vocês estão
roubando nossa terra,” e a comunidade internacional troveja “Parem
a ocupação,” perdemos a briga. Israel pode gritar
o dia inteiro “Temos o direito de nos defender,” mas na mente
do mundo estamos nos defendendo enquanto nos sentamos em terra roubada.
Porém o ponto mais importante está de fora. Durante 3.300
anos os judeus respiraram e viveram com a convicção de que
o Criador do mundo designou um pedaço de terra para eles. Até
nos momentos mais infernais do exílio judaico, o povo do Livro
se apegou à fé de que um dia eles retornariam à sua
terra Divinamente prometida. O único motivo pelo qual os judeus
retornaram de Odessa, Vilna e Varsóvia para Israel foi por causa
de sua paixão e crença de que o Criador do céu e
da terra escolheu dar a Terra Santa aos filhos de Avraham, Yitschac e
Yaacov, como é declarado centenas de vezes na Torá. Há
três bilhões de pessoas no mundo que acreditam na Bíblia,
vivem com a Bíblia e que citam a Bíblia. Os sionistas seculares
não deveriam ter medo de transmitir essa tradição
e essa fé aos seus filhos, pois esta, e somente esta, é
a justificativa moral para a presença judaica na Terra Santa –
em Jerusalém, Hebron, Tel Aviv, Haifa e Gaza também.
Paradoxalmente, parece que o mundo está esperando por isso. Não
somente o mundo cristão e muçulmano, que vê a Bíblia
como a definição da verdade. Até o mundo secular
parece respeitar os judeus que respeitam a si mesmos e à sua fé.
O mundo está esperando que Israel trate a terra da maneira que
Israel deve ser tratado, como presente pessoal de D'us ao povo judeu.
Bênção ou Maldição?
É por isso que os Sábios dizem que “Todo aquele que
não menciona o Pacto e a Torá na bênção
para a terra não cumpriu sua obrigação.” Se
o nosso senso de gratidão e conexão com a Terra está
baseado no Pacto Divino com Avraham e a Torá, continuará
sendo apaixonado, moralmente inspirado e eterno. Caso contrário,
nossa lealdade à nossa terra está por um fio.
Os sábios talmúdicos entenderam que se a gratidão
do judeu pela Terra de Israel não estiver baseada no Pacto feito
por D'us com Avraham há 3.700 anos, e na Torá, o projeto
com 3.300 anos para a existência judaica, poderemos um dia sentir
que não damos valor – em vez de sermos gratos – pela
terra que flui com leite e mel. Poderíamos nos sentir compelidos
a nos desfazer dela.
O Sol e a Lua
O Talmud declara5: “Moshê é a face do sol; Yehoshua
é a face da lua.” Qual é o simbolismo por trás
desta declaração poética?
Uma explicação poderia ser esta:
Moshê representa a Torá; Yehoshua incorpora a Terra de Israel.
Moshê nos deu a Torá; Yehoshua nos deu Israel.
A luz da lua é linda, calmante e romântica. O luar tem inspirado
muita imaginação e romantismo. Porém o brilho da
lua é apenas um reflexo do sol. Enquanto a lua reflete o brilho
do sol, lança sobre a terra sua luminesciencia singular e poética;
se a lua for separada de sua fonte de luz – como é o caso
num eclipse lunar – torna-se uma grande massa escura e matéria
rochosa.
O relacionamento entre Moshê, a face da Torá, e Yehoshua,
a face da nação judaica, é aquele do sol e da lua.
Desde que Israel reflita a Torá – sua fé, seus sonhos
e suas paixões – é difícil encontrar algo mais
belo e inspirador. Quando Israel, no entanto, deixar de se ver como um
reflexo da Torá, mas sim como uma nação secular para
os judeus, um membro das Nações Unidas, perderá muito
de seu brilho interior e de sua beleza. Sua própria identidade
e futuro são questionados.
Toda nação precisa de uma alma. Até Israel. E a alma
do povo judeu durante 4.000 anos tem sido a Torá.
Não podemos nos dar ao luxo de perder nossa alma agora. Obama vai
conseguir, se nós conseguirmos.
Notas:
1. Devarim 7:10
2. Assim, as primeiras três bênçãos são
biblicamente exigidas. Na cidade de Yavne, cerca do ano 100 da EC, os
Sábios acrescentaram uma quarta bênção, agradecendo
a D'us pela Sua bondade durante a época de exílio após
a destruição de Jerusalém pelos romanos (Talmud Berachot
48b).
3.Talmud, ibid.
4.Talmud, ibid. 49a.
5.Bava Basra 75b.
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