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  A Tragédia na Noruega
 
Por Sara Esther Crispe
  Ainda me recuperando do brutal assassinato do pequeno Leiby, conferi as notícias após o final do shabat e soube do horrível massacre na Noruega, no qual 93 pessoas morreram e outras tantas foram feridas. Este foi o pior massacre até agora, e o maior número de mortes na Noruega desde a Segunda Guerra.

Um país está de luto, o mundo em choque. Mais uma vez somos testemunhas da depravação humana.

Juntamente com as notícias da Noruega, outra tragédia de um tipo diferente foi noticiada. Esta era a história de uma jovem judia, conhecida em todo o mundo pela sua voz e talento criativo, que morreu aos 27 anos.

Outra vida jovem, encurtada, desnecessariamente.

Acabamos de perder dezenas de pessoas inocentes, que ainda tinham muito a fazer, para contribuir e melhorar o mundo, mas que não estão mais aqui por causa de doidos fanáticos e perturbados que não dão valor à vida de outros. E ao mesmo tempo temos tantos outros cujas vidas são apagadas na juventude por causa de um monstro que habita seu interior, não permitindo que valorizem a própria vida.

Um país está de luto, o mundo está em choque.

E aonde isso nos deixa? Aqueles lendo essas histórias, assistindo às entrevistas, sentindo a dor?

A filosofia chassídica nos ensina que devemos viver conforme os tempos. Em outras palavras, devemos extrair significado, rumo e percepção na nossa vida cotidiana da época do ano, da porção da semana da Torá, etc. Estamos atualmente nas “Três Semanas” de luto pela destruição do Templo Sagrado em Jerusalém, que culmina com Tisha B’Av, o dia da maior destruição para o povo judeu. As Três Semanas começaram em 17 de Tamuz, que assinala o dia em que as muralhas de Jerusalém foram destruídas. Três semanas depois, em Tisha B’Av, nosso Templo estava destruído.

Porém todas as três semanas são consideradas um período de luto. Não somente reconhecemos o dia da verdadeira destruição, mas reconhecemos que a raiz daquela destruição começou muito antes. Se tivéssemos sido capazes de reconhecê-la, detê-la, talvez o pior tivesse sido impedido.

Temos assistido a tantas tragédias se desenrolando, e em nosso choque e tristeza perguntamos “por quê”? Porém ninguém pode nos dar essa resposta. Certamente não agora. Ainda não. Não enquanto nosso Templo ainda está destruído. Não enquanto nossas muralhas estão em ruínas e precisam ser reconstruídas. Somos ensinados que quando Mashiach vier, ele terá muitas perguntas a responder. Mas enquanto esperamos, o “porquê” é a única coisa que não saberemos.

Porém há algo que podemos e devemos fazer. E não apenas por aquelas tragédias que têm acontecido, mas para ajudar a impedir que mais delas ocorram.

Devemos todos dar um olhar perscrutador em nossa vida e na vida dos nossos entes queridos ao nosso redor. Há muralhas que ficaram enfraquecidas? Muralhas que foram rompidas, muralhas que se quebraram? Essas muralhas estão precisando de reconstrução ou conserto?

Muralhas servem tanto a propósitos positivos quanto negativos. Podemos construir um muro para manter os outros fora ou a nós próprios escondidos, ou podemos construir muros para oferecer proteção e segurança. Aqueles muros que escondem problemas devem ser destruídos, pois escondem aquilo que deve ser tratado, e não permitem que os outros ajudem.

Simultaneamente, quando nos escondemos por trás dos nossos muros, recusando a deixar os outros entrarem, com frequência descobrimos que nos tornamos prisioneiros dentro de nossa mente e nosso coração.

Ao mesmo tempo, aqueles que não têm muros em sua vida estão vulneráveis ao mal que os cerca, e devem ser ajudados a construir muralhas que ofereçam a segurança que precisam. Muitas vezes é a falta de muros que leva a situações em que as muralhas são construídas para esconder, e não para proteger.

Nossa época coletiva de luto como povo judeu nos ensina que o luto não é apenas para o dia em que ocorre a tragédia, mas inclui o período em que os sinais de aviso estão ali e os problemas aumentaram e não conseguimos detê-los. Precisamos protestar, nós mesmos, nossos filhos e nossa comunidade, olhando para as nossas muralhas. E precisamos nos lembrar que assim como uma ou mais pessoas sãop capazes de provocar tanto terror e destruição, também uma única pessoa pode salvar a vida emocional, física ou espiritual de tantas outras. Assim, também, uma pessoa pode impactar o mundo e mudá-lo para melhor.

Porém a mudança somente pode acontecer quando olhamos para a brecha nas muralhas. Quando não esperamos que um evento ocorra pera lidar com a raiz do problema.

Um predador não se torna predador da noite para o dia. Uma pessoa que tira sua vida, seja de propósito ou indiretamente por meio de comportamento descuidado, não desenvolveu um vício ou comportamento estranho da noite para o dia. Um terrorista não planeja um ataque de repente. Há sinais. Há avisos. Há comportamentos. E nós como comunidade devemos aprender a identificá-los e lidar com eles antes que levem à ação.

Estamos sofrendo. Estamos de luto. E devemos estar. A perda é grande. Mas vimos, e veremos através de cada tragédia, a unidade que surgirá. A comunidade se tornará uma através do apoio estendido, da ajuda e do envolvimento. Devemos usar essa preocupação e amor para nos fortalecer e lutar contra aquilo que procura nos destruir, sejam os demônios que estão dentro ou aqueles que estão fora do nosso coração e nossa mente. E devemos buscar e encontrar aquelas muralhas, e as brechas e fraquezas que estão lá dentro.

Juntos, podemos consertar essas muralhas quebradas, e construir novas onde necessário. Juntos passaremos por isso. E juntos levaremos consolo mútuo enquanto esperamos pelo supremo consolo e fim a este sofrimento com Mashiach, que finalmente explicará o “porquê”.
Sara Esther Crispe é escritora, palestrante e mãe de quatro filhos. É editora de TheJewishWoman.org. É também esitora da seção Society e Living do Chabad.org.
     
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