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Onde mesmo realmente reside a vida?
Foi um daqueles pontos altos na jornada da vida, quando toda a paisagem
é colocada à sua frente em alta definição.
De repente, você sabe onde está, aonde está indo e
o que tem de fazer ali.
Eu atualizei meu iPhone. Foi difícil. Eu queria o novo aparelho.
Mas não conseguia ficar sem o antigo.
Ora, durante quase três anos eu tinha passado o tempo todo com aquele
aparelho morno de metal firmemente seguro em minha mão, em segurança
no meu bolso, no painel do carro, ou perto do meu travesseiro, medindo
cada movimento meu a ponto de reportar meus padrões de sono pela
manhã. E agora o vendedor estava dizendo que eu tinha de deixá-lo
ir. Por um desconto de $70 no meu novo iPhone, tudo que eu precisava fazer
era deixar o velho para trás.
“O que você vai fazer com ele?” perguntei. “Minha
vida inteira está aí!” “Não se preocupe,”
disse ele, “vamos limpá-lo totalmente antes de revender.”
Meu segundo suspiro reverberou pela loja ruidosa. O pânico bloqueou
todos os meus estímulos visuais, exceto a imagem do meu precioso
aparelho. O suor estava umidecendo as palmas das minhas mãos; o
pânico deixava minha voz aguda.
Felizmente, o vendedor manteve a calma. Aparentemente, ele já passara
por isso antes.
“Todos os dados”, disse ele, “vão aparecer no
seu novo iPhone. Todos os seus aparelhos, toda sua música, seus
e-mails, anotações, documentos, fotos… tudo.”
“Eu não tenho de transferir tudo primeiro?” perguntei.
“Não é necessário. Está tudo na Nuvem.”
“Na Nuvem?”
O esclarecimento começava aqui. O vendedor falou:
“Bem, tudo não. Os aparelhos que você comprou estão
na loja, de onde foram primeiro carregados no seu aparelho. Vão
carregar novamente, assim que este novo aparelho estiver conectado com
seu ID. O mesmo irá ocorrer com todas as músicas que você
comprou da loja iTunes, ou livro do iBook. É de onde eles vêm,
e onde ainda estão. Você poderia dizer que é o verdadeiro
lugar deles.”
“E tudo aquilo que eu criei neste iPhone?” Eu estava tentando
parecer calmo, agir conforme minha idade, mas não estava dando
certo.
“Os documentos que escrevi? As fotos que tirei? Os registros que
fiz?”
“Já chequei. Tudo que você fez está arquivado
na Nuvem. Até seus arquivos pessoais.”
“E estão seguros ali?”
“Muito mais seguros que no seu aparelho. Seu aparelho tem somente
alguma bateria, pode apenas viver por algum tempo. Mas na Nuvem, poderia
muito bem ficar ali para sempre.”
Então ele continuou com seu papo de vendedor sobre a Nuvem.
“E depois que estiver na Nuvem, é muito mais fácil
compartilhar com outros. Em nossos aparelhos, cada um de nós está
em seu próprio mundo. Nós nos comunicamos, interagimos,
mas os aparelhos – eles nos dividem. Mas aqui, na Nuvem, é
tudo um. Tão fácil de criar aquela sinergia que chega através
da partilha.”
Seguindo sua instrução, digitei minha identidade e minha
senha naquele pequeno aparelho. Olhei com reverência enquano a própria
alma do aparelho aparecia perante meus olhos.
Olhando em seus olhos, vi que ele estava confiante e disposto. Confiei
nele. Eu tinha de seguir em frente com a vida.
Dentro de instantes, meus preciosos conteúdos começaram
a aparecer, como ossos secos ganhando vida a partir do pó. Todos
os dados que tinham residido no meu aparelho velho, juntamente com tudo
que eu tinha criado nele, até meus dados pessoais, apareceram,
um por um. Sua própria alma reaparecia perante meus olhos. Segurei-o
na mão e comecei a mexer na superfície, interagindo com
seus botões. Sim, era meu antigo eu, mas muito mais sensível,
mais esperto e brilhante, mais rápido e espaçoso. A vida
tinha dado um salto adiante.
Vida. Sim, é tudo que está ali. Há esta nova voz
que não entende a maior parte daquilo que eu digo. Mensagens nas
quais tenho pouco interesse. Bobagens com as quais não sei o que
fazer. Vida.
Só que agora, é uma vida mais sofisticada.
Deito na cama naquela noite, meu iPhone cuidadosamente colocado perto
do travesseiro (ligado, e não debaixo das cobertas, segundo as
instruções – e no módulo Não Perturbe),
e eu me perguntei: “O que é este corpo, se não for
o verdadeiro eu? Onde eu realmente moro? O que acontece com o Corpo 2.0?
E tudo que eu criei ali, onde está armazenado? Com quem estou compartilhando?
Quem somos nós, realmente, Quem sou eu?”
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