Filho Único
índice
   
 

Influenciado pelo drama da Crise dos Mísseis de Cuba e o desejo de um jovem de tomar parte no cenário internacional, decidi graduar-me em Ciências Políticas e iniciar uma carreira no corpo diplomático.

A guerra é uma certeza. Os Países Árabes mobilizaram forças muito superiores às de Israel…No ano de 1967, já adido diplomático, trabalhava para o embaixador dos Estados Unidos, Arthur Goldberg, nas Nações Unidas.

Na primeira semana de junho recebi um telefonema de uma prima. Com voz ansiosa, pedia-me que passasse pelo seu apartamento após o trabalho. Quando sentei-me em sua sala naquela noite, ela e o marido contaram-me a causa de seu aborrecimento. O único filho deles, Abraham – um jovem vários anos mais moço que eu que se tornara báal teshuvá no ano anterior – estava estudando numa yeshivá de Lubavitch em Israel. Alarmados pelos crescentes rumores sobre uma guerra, enviaram-lhe uma passagem de avião e imploraram que voltasse para casa. Abraham manteve-se firme em sua recusa: o Rebe de Lubavitch dizia-lhe para ficar.

“Tentamos abordar o Rebe,” minha prima continuou. “Queríamos explicar a ele que Abraham é nosso único filho, que é toda nossa vida, e apelamos a ele que deixasse Abraham voltar para casa. Porém, parece que é preciso esperar vários meses por uma audiência com o Rebe. Escrevi uma carta, a conselho de seus secretários, e recebi esta resposta.”

O mesmo semblante nobre, o mesmo olhar penetrante encarou-me à mesa aquela noite, quase quinze anos depois de meu último encontro com o Rebe. Ela mostrou-me uma curta nota com a frase: “O guardião de Israel não dorme nem cochila.”

Ela parecia um pouco mais calma pela citação dos Salmos.

“Diga-nos, Joe,” perguntou minha prima, “O que está acontecendo realmente?” Você sabe da história por detrás dos bastidores. Israel corre perigo real?”

Eu não queria aumentar seus receios, mas senti-me obrigado a dizer-lhes a verdade: o Estado de Israel realmente corre grande perigo. A guerra é uma certeza. Os Países Árabes mobilizaram forças muito superiores às de Israel e têm grande chance de derrotar o minúsculo país judeu; se isso acontecer, eu não gostaria de imaginar o destino dos judeus que lá moravam. Meu chefe, Sr. Goldberg, um judeu profundamente engajado, não pode dormir à noite. “Não consigo deixar claro o suficiente como é grave a situação,” concluí. “Vocês devem tirar Abraham de lá o mais rápido possível!”

“Mas como?” gritou minha prima. “Para ele, a palavra do Rebe é lei. Se o Rebe lhe diz para ficar, ele fica!”

“Ouça,” disse eu. “Falarei com o Rebe. Quando eu me apresentar como adido do Sr. Goldberg, certamente conseguirei persuadi-lo a permitir que Abraham volte para casa.”

Na manhã seguinte, contatei o secretário pessoal do Rebe, Rabi Chadakov. Apresentei-me como membro da delegação dos Estados Unidos na ONU e disse ter um “assunto urgente” a discutir com o Rebe. Rabi Chadakov prometeu responder-me em breve. Meia hora mais tarde, chamou-me para informar-me que o Rebe iria me receber na noite seguinte, às 2 horas da madrugada.

Havia mais branco em sua barba, mas não fosse por isso a face e os modos joviais pouco haviam mudado. O mesmo semblante nobre, o mesmo olhar penetrante encarou-me à mesa aquela noite, quase quinze anos depois de meu último encontro com o Rebe.

O aperto de mão foi firme e caloroso. “Já tive o privilégio de conhecer o Rebe,” – comecei – “vovô trouxe-me aqui antes de meu bar mitsvá.”

O largo sorriso do Rebe assegurou-me que ele de fato lembrava-se de mim.

“Devo desculpar-me com o Rebe,” – continuei – “temo que esteja usando minha posição um tanto injustamente para conseguir esta audiência. O ‘problema urgente’ que mencionei é pessoal.”

Novamente, o acolhedor sorriso do Rebe pôs-me à vontade. Encorajado, falei-lhe sobre meus primos e o filho. “Os pais estão fora de si de tanta ansiedade” – concluí. “Eles apreciariam muito se o Rebe permitisse que seu único filho voltasse para casa antes que exploda o perigo.”

O sorriso acolhedor desaparecera. Uma grave expressão agora ensombrecia o semblante do Rebe. “Tenho milhares de filhos únicos na Terra de Israel,” disse ele. “Se eu lhes disse para permanecer lá, é porque estou certo de que nenhum perigo se abaterá sobre eles. Diga à sua prima e ao marido que podem esquecer seus temores. O Guardião de Israel não dorme nem cochila. D’us vigia Seu Povo onde quer que ele esteja, especialmente na Terra Santa.”

“Rebe,” disse eu, com o devido respeito, “eles não conseguem esquecer seus temores. Tampouco eu posso. Talvez o Rebe não esteja a par da gravidade da situação, mas devido a minha posição tenho acesso à informações extremamente confiáveis. Infelizmente o Estado de Israel está em grave perigo.”

“Israel,” replicou o Rebe com absoluta convicção, “não está em grande perigo. Está no limiar de uma grande vitória. Com a ajuda do Todo Poderoso, este mês será uma época de grandes milagres para a nação judaica.”

“Agora,” continuou, “se não se importa, gostaria de pedir-lhe algo. Diga ao pai de Abraham que ele, também, pode ajudar nossos irmãos na Terra de Israel: diga-lhe que pedi que ele comece a cumprir a mitsvá de colocar tefilin todos os dias. Peço a você, também, que comece diariamente a cumprir esta mitsvá. Não sei o quanto você pode ajudar Israel no seu cargo de assistente do Embaixador nas Nações Unidas, mas colocando tefilin diariamente, certamente contribuirá para a vitória de Israel – sem,” adicionou o Rebe com um ligeiro sorriso, “encontrar nenhuma complicação por conflito de interesses…”

 
   
top