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Terrorismo: uma ferida no mundo

  Por Professor Jonathan Sacks, Rabino chefe da Inglaterra
 

O terrorismo desonra qualquer causa que alega representar

Como que zombando das cenas de alegria pela escolha de Londres como sede das Olimpíadas, as explosões terroristas deixaram um rastro de devastação em seu caminho.

Hoje em todas as sinagogas estaremos juntando nossas preces àquelas de outros, lamentando pelos mortos, rezando pelos feridos, e compartilhando as lágrimas dos enlutados.


O terror falha, e falhará sempre, porque desperta em nós um profundo instinto de viver

O terror se tornou o flagelo da nossa era, e precisaremos de toda a nossa força interior para lidar com isso. Já conheci muitas vítimas do terror: sobreviventes das bombas na sinagoga de Istambul em 2003; do ataque terrorista ao centro comunitário judaico de Buenos Aires em 2004; em Israel, onde quase todos conhecem alguém que foi afetado; sobreviventes dos massacres no Cambodja, Bósnia, Ruanda e Kosovo. Como muitos outros, eu chorei pelas famílias destroçadas e vidas despedaçadas; os ferimentos, físicos e psicológicos, jamais desaparecerão.

Porém eu chorei também pela coragem das vítimas. A cada ano um grupo nosso realiza visitas e dá apoio para pessoas que sofreram ataques terroristas. Num deles encontramos um garoto de 11 anos que havia perdido a mãe, pai e três outros membros da família num ataque suicida. Ele próprio havia perdido a visão. Na enfermaria do hospital, ele cantou com o coro uma linda canção religiosa. Nós tínhamos ido lá para dar-lhe forças, e em vez disso, foi ele que nos deu.

O terror falha, e falhará sempre, porque desperta em nós um profundo instinto de viver. Poderemos esquecer o heroísmo dos bombeiros de Nova York no Onze de Setembro, ou a coragem dos passageiros no Vôo 93, ou a bondade dos estranhos que foram levar conforto aos sobreviventes traumatizados?

O terror nos faz vigilantes em defesa daquilo que, não fosse ele, tomaríamos como certo: a santidade da vida, a importância da liberdade, e as incontáveis restrições naturais que nos permitem viver juntos em segurança e com confiança.

As sociedades livres sempre são mais fortes que os seus inimigos as consideram. Os inimigos do Ocidente confundem sua abertura com vulnerabilidade, sua tolerância com decadência, seu respeito pela diferença com falta de convicção moral. A Grã-Bretanha tem vínculos excepcionalmente fortes de amizade entre diferentes crenças e comunidades étnicas. Esta é uma fonte vital de estabilidade quando os nervos estão fragilizados e surgem os temores. A própria Londres tem uma longa história de coragem. Isso também ficou evidente na calma que prevaleceu na quinta-feira.

A melhor reação ao terror não é a raiva, mas a força calma de continuar, não ceder ao medo. Penso em Judea Pearl, pai do jornalista americano assassinado Daniel Pearl, que fez campanha por um melhor entendimento entre o Islã e o Ocidente. Quando perguntei a ele o que lhe dava motivação, ele respondeu: "O ódio matou meu filho, e não se pode derrotar o ódio com o ódio."
Penso em um dos jovens mais promissores que nossa comunidade produziu, Yoni Jesner, que foi morto aos 19 anos num ataque suicida em Tel Aviv. Sua família, movida por uma profunda convicção religiosa, doou seus órgãos para salvar vidas – dentre elas uma menina palestina de sete anos que esperava por um transplante de rim há dois anos.

Michael Waltzer escreveu: "Terroristas são como assassinos num acesso de fúria, exceto que seu ataque não expressa apenas raiva ou loucura; a raiva é dirigida e programada."

Suas vítimas, deliberadamente, são os inocentes e não-envolvidos; trabalhadores num escritório, passageiros de um trem, pedestres numa calçada. Sua meta é assustar. Avança sem considerar o que está pela frente. Não tem uma reivindicação de justiça. Desonra qualquer causa que alega representar.

A verdadeira resposta ao terror foi posta em ação em Londres e em outros locais cinco dias antes. Milhões de pessoas saíram às ruas e parques para demonstrar sua solidariedade com as vítimas da pobreza na África. Seus métodos foram pacíficos; suas armas, música e celebração, e sua maior força foi a justiça de sua causa.

As pessoas com quem eles estavam se identificando – as centenas de milhões de crianças que precisam de comida, abrigo, água limpa e assistência médica, sustento e esperança – jamais recorreram ao terror para chamar a atenção do mundo ao seu sofrimento, nem precisaram disso.
A opção que a humanidade enfrenta foi lançada há muito tempo por Moshê: "Coloquei perante vocês a vida e a morte, a bênção e a maldição. Portanto, escolham a vida, para que vocês e seus filhos possam viver."

A resposta mais forte para as forças da morte é um compromisso renovado com a santidade da vida.

       
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