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As
ruas estão tomadas quase que diariamente em todo o país.
Um despertar do gigante adormecido. As postagens são de que finalmente
“a ficha caiu”, “a bolha estourou”, “não
são os 0,20” etc. Muito significativo e histórico
o momento que estamos vivendo: o povo unido sai às ruas, sem partido,
para reivindicar por causas justas em benefício de todos. Basta
de corrupção, impunidade, injustiças, insegurança
e aumentos abusivos. A vida ficou cara demais e perigosa demais. Infelizmente
junto a estas passeatas assistimos a um cenário paralelo, sem precedentes,
de roubo e destruição. Na onda, surgem os tubarões
que na maré das massas se aproveitam para depredar o patrimônio
público, roubar, matar e sair impune espalhando revolta e indignação.
Onde está o controle e para onde a falta dele irá nos levar?
Seguem trechos do livro do Dr. Meir Tamari, Economista-Chefe do Gabinete
do Presidente do Banco de Israel em Jerusalém. Talvez possam mostrar
a contribuição que o judaísmo pode dar ao mundo sobre
moral e ética, base para uma sociedade equilibrada com alicerces
firmes que fornecem o combustível para impulsioná-la para
a frente em paz e ordem, com amor e segurança. Afinal no judaísmo
ter ética é um dever, não um mérito.
A ganância e a inveja que conduziram às rivalidades e ao
derramamento de sangue nas épocas antigas ainda existem. O desejo
insaciável de riqueza do homem continua dominando-o e, por esta
razão, deve ser tratado. Assim como os problemas permanecem os
mesmos, as respostas da Torá também são as mesmas.
O que se faz necessário é traduzir os textos a fim de demonstrar
sua relevância para a nossa economia mercantil.
A base de qualquer economia é a proteção dos direitos
de propriedade de todos os envolvidos no comércio: comprador e
vendedor, empregador e empregado, fomentador e comunidade. Seu efeito
prático pode ser observado atualmente em muitos países em
desenvolvimento, que não conseguem obter investimentos ou intensificar
seu comércio exterior por falta de uma estrutura legal. E fácil
argumentar, como Maimônides, que as leis mosaicas contrárias
aos negócios desonestos (que, de fato, privam uma das partes de
suas propriedades, simplesmente como sanções racionais e
1ógicas) são essenciais à existência do comércio.
Isso, contudo, colocaria a moralidade das transações judaicas
em equivalência com aquelas dos ensinamentos de outras religiões
ou, então, em igualdade com qualquer pessoa secular, moderna e
honesta. Nesse campo, como em muitos outros, não são as
semelhanças que importam, mas sim as diferenças, que derivam
dos princípios judaicos básicos.
A maioria dos comentaristas bíblicos nota as injunções
contra roubo como revelações de sabedoria Divina, que vão
muito além dos aspectos racionais ou sociais. Por meio dessas leis,
a desonestidade se transforma numa transgressão contra a vontade
de D'us, uma aberração espiritual, acima e além dos
aspectos legais do crime cometido ou do dano causado. Consequentemente,
a retaliação Divina deve perseguir esses crimes, assim como
acontece com qualquer outro desvio humano de Sua lei.
Este aspecto se torna claro quando lemos o comentário dos sábios
talmúdicos, mostrando-nos que o destino da geração
do Dilúvio só foi selado por causa de Chamás (roubo
ou furto), mesmo de objetos sem valor intrínseco. O Rebe chassídico
de Sochochov perguntou por que seria esta a causa do Dilúvio, uma
vez que temos conhecimento de que aquela geração realmente
cometera os três mais graves pecados - idolatria, adultério
e assassinato - para os quais a penalidade é a morte, enquanto
que tal punição não se aplica ao roubo. Respondendo
a essa questão, ele explicou que o roubo é o começo
do esfacelamento de toda uma estrutura que culmina nesses três pecados
fundamentais. Assim, foi o roubo que selou seus destinos.
Uma vez que os judeus são conhecidos como portadores da palavra
Divina para o mundo, a sua desonestidade nos negócios reflete na
Sua desonra, um ato de Chilul Hashem (a profanação do nome
Divino). Pela Halachá, somos absolutamente proibidos de tomar qualquer
atitude que possa resultar em tal profanação. Assim, o comportamento
comercial deve ser examinado minuciosamente em função do
efeito que possa ter sobre a compreensão e o respeito humano por
D'us. Isso se expressa positivamente na forma de Kidush Hashem (a santificação
do nome Divino), normalmente associado ao martírio e à perseguição
dos judeus. No entanto, há o Kidush Hashem também no comércio:
nos negócios, somos obrigados a nos comportar como testemunhas
da Sua grandeza e do Seu reino.
A Halachá também trata desse tema. Contudo, o efeito do
crime sobre o próprio criminoso ou o aspecto moral de ações
que não podem ser retificadas no tribunal são normalmente
ignorados em nossa sociedade. Depois de qualquer escândalo comercial
ou crime relacionado aos negócios, frequentemente ouvimos o argumento
de que as pessoas devem ter conhecimento de como os negócios precisam
ser conduzidos e, por isso, as próprias vítimas têm
de arcar com o peso da culpa. Já foi sugerido que, talvez, tais
indivíduos nem devessem estar no comércio. Respeitáveis
jornais financeiros chegaram a dizer, por exemplo, que o uso de informação
confidencial nas transações da bolsa de valores constitui-se
num crime sem vítimas; logo, as pessoas que o praticam não
deveriam ser condenadas.
A Torá, contudo, tem muito a dizer sobre o dano causado ao próprio
ladrão pelas suas atitudes, somando-se à questão
do prejuízo material causado pelo roubo em si. Quando o roubo é
reconhecido como um crime contra D'us, com todas as suas conotações
religiosas, então continua sendo um crime, mesmo quando a sociedade
o tolera ou reconhece áreas obscuras socialmente aceitáveis.
Furtos, por brincadeira ou simplesmente para causar aborrecimento, mesmo
que sejam de objetos insignificantes, são proibidos, porque D'us
assim o ordenou.
No mundo dos negócios existem inúmeros exemplos de atitudes
halachicamente proibidas. Por exemplo, quando produtos com defeitos são
vendidos ou quando qualquer forma de deturpação está
envolvida, sendo omitida ao comprador, o vendedor é culpado de
cometer Guenevat Daat (literalmente, “roubando o pensamento da pessoa”)...
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