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O que faríamos para nos divertir sem os cientistas
nos dizendo, com empolgação ofegante, que “D'us não
criou o universo”, como se eles fossem os primeiros a descobrir
essa surpreendente proposição? Stephen Hawking é
o mais recente, mas certamente não o primeiro. Quando Napoleão
perguntou a Laplace, há duzentos anos, onde estava D'us em seu
sistema científico, o matemático respondeu: “Je n’ais
besoin de cette hypothese,” ou seja, “Não preciso de
D'us para explicar o universo.” Nós jamais fizemos. Isso
é o que os cientistas não entendem.
Há uma diferença entre ciência e religião.
A ciência é sobre explicação, a religião
é sobre interpretação. A ciência pega as coisas
separadas para ver como funcionam. A religião junta as coisas para
ver o que significam. São empreendimentos intelectuais diferentes.
Eles até ocupam hemisférios diferentes no cérebro.
A ciência – linear, atomística, analítica –
é uma atividade típica da parte esquerda do cérebro.
Religião – integrativa, holística, relacional –
é de maneira suprema uma obra da parte direita do cérebro.
É importante para nós entendermos o engano que o Professor
Hawking cometeu, porque a hostilidade mútua entre religião
e ciência é uma das maldições de nossa era,
e prejudica tanto a religião quanto a ciência.
A melhor maneira de abordar isto é através da autobriografia
de Charles Darwin.
Darwin nos diz que quando jovem ele tinha ficado impressionado com o caso
pró D'us como apresentado por William Paley em sua Teologia Natural
de 1802. Paley atualizou o clássico “argumento do desenho”
ao estado de conhecimento científico como existia na sua época.
Encontre uma pedra num campo, diz Paley, e você não vai perguntar
quem a criou. Mas encontre um relógio e você pensará
de maneira diferente. Um relógio parece algo que foi projetado.
Portanto teve um projetista. O universo se parece mais com um relógio
que com uma pedra. É intrincado, interligado, complexo. Portanto,
também teve um projetista, cujo nome é D'us.
Darwin, numa ideia simples mas transformadora do mundo, mostrou como o
surgimento do projeto não exige um projetista. Pode emergir no
decorrer de um longo período de tempo, como diríamos hoje,
um processo interativo de mutação genética e seleção
natural. Portanto o universo não é como um relógio,
ou se é, o relojoeiro estava cego. QED (Expressão latina
que significa Que devia ser demonstrado).
Mas para começar, quem pensou que o universo era como um relógio?
Os cientistas e filósofos dos séculos dezessete e dezoito.
Newton, Leibniz, Laplace, Auguste Comte. O que estava errado no argumento
de Paley não era a teologia, mas a ciência na qual estava
baseado. A boa ciência refuta a má ciência. Ela nada
nos diz sobre D'us.
O Professor Hawking fez algo bastante similar, exceto que dessa vez ele
desempenhou ambas as partes. Ele é tanto Paley quanto Darwin, e
com grande prestidigitação e ousadia, Hawking II, o bom
cientista, refutou brilhantemente Hawking I, o fraco teólogo.
Hawking I foi a pessoa que escreveu, ao final de Uma Breve História
do Tempo, que se encontrarmos o santo graal da ciência, uma teoria
do tudo, saberíamos “por que é que nós e o
universo existimos.” Nós conheceríamos “a mente
de D'us”.
Esta é uma falácia tão elementar que é difícil
crer que o Professor Hawking quis dizer isso mesmo. Saberíamos
como nós e o universo vieram a existir, não por quê.
Nem, de forma alguma, conheceríamos “a mente de D'us”.
A Torá simplesmente não está interessada em como
o universo veio a existir, Devota meros 34 versículos sobre o tema.
Ocupa quinze vezes mais espaço descrevendo como os judeus construíram
um santuário no deserto.
A Bíblia não é proto-ciência, pseudo-ciência
ou um mito mascarado como ciência. Está totalmente interessada
em outras questões. Quem somos nós? Por que estamos aqui?
Como então devemos viver? É para responder a essas perguntas,
não as científicas, que procuramos conhecer a mente de D'us.
Hawking II agora refutou Hawking I. O universo, segundo a nova teoria,
criou a si mesmo. (Isso me lembra uma piada que ouvi quando era estudante,
sobre um magnata: “Ele é um homem que se fez por si mesmo,
portanto livra D'us de uma grande responsabilidade.”) Se você
respondesse que o universo deve ser de uma inteligência impressionante
para ter se ajustado tão precisamente para o surgimento das estrelas,
planetas, a vida e nós, mesmo tudo isso sendo tão improvável,
então e resposta é que há uma infinidade de universos
nos quais todas as possibilidades e permutações ocorrem.
Nós tivemos sorte. Encontramos o universo que conteve a nós.
Ouvi essa teoria pela primeira vez daquele cientista brilhante e sábio,
Lord Rees, Presidente da Royal Society. Ele também, como explica
em seu livro Just Six Numbers (Apenas Seis Números), ficou intrigado
pela precisão das seis constantes matemáticas que definem
a forma do universo. É tão improvável que o universo
tivess simplesmente acontecido, por acaso, para encarxar naqueles parâmetros
que ele também foi forçado a sugerir a hipótese dos
universos paralelos. Se você comprar uma infinidade de bilhetes
de loteria, um deles vai ser sorteado.
Isso é verdadeiro, mas não elegante. O princípio
de Ockham’s Razor diz: não multiplique entidades desnecessárias,
Se for dada uma escolha entre um único criador inteligente e uma
infinidade de universos auto-criadores, o primeiro vence de largada.
Mas vamos louvar um gênio científico. O Professor Hawking
é uma das mentes realmente notáveis do nosso tempo. Há
dois mil anos os rabinos criaram uma bênção –
você pode encontrá-la em qualquer livro judaico de preces
– ao ver um grande cientista, independentemente de suas crenças
religiosas. Aquela me parece a atitude correta da religião para
com a ciência: admiração e agradecimento.
Porém há mais na sabedoria que ciência. Ela não
pode nos dizer por que estamos aqui ou como devemos viver. A ciência
mascarada como religião é tão imprópria como
a religião mascarada em ciência. Continuarei a acreditar
que o D'us que criou um ou uma infinidade de universos em amor e perdão
continua a nos pedir para criar, para amar e para perdoar.
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