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Numa cultura infantil,
as crianças querem uma chance para crescer.
Há alguns anos, conheci a Lei de Parkinson: "O trabalho se
expande para preencher o tempo disponível para sua realização."
Desde então, descobri um outro princípio, que nos dá
mais esperança: "Os jovens crescem para preencher o espaço
que criamos para eles."
Peça pouco às nossas crianças e elas continuarão
pequenas – não fisicamente, mas ética e espiritualmente.
Peça muito e elas o surpreenderão pela capacidade de dar
e aceitar responsabilidade.
Uma das perguntas que a sociedade deveria fazer a si mesma: Que espaço
nós criamos para nossos filhos?
São os adultos, não as crianças, que infantilizam
nossa cultura. Isso aconteceu quando as grandes empresas descobriram que
as crianças representam um imenso mercado em potencial, não
apenas para brinquedos mas também para roupas, música, filmes,
vídeo games, refrigerantes, guloseimas, toda a parafernália
que se chama "fashion".
Começaram então a transformar crianças em consumidores,
cuja obesidade é apenas o sintoma mais recente a chamar a atenção
do público. Na cultura do "você é aquilo que
compra", as crianças são transformadas em adultos prematuros,
assim como os adultos se transformam em crianças com mais idade.
Penso, num grato contraste, em minha própria infância. Meu
falecido pai chegou à Inglaterra como uma criança refugiada.
Sua família era pobre. Podia arcar apenas com a educação
de um único filho, e ele não era o mais velho. Portanto,
teve de deixar a escola aos 14 anos para começar a trabalhar. Nunca
reclamou. Ele sabia que a Inglaterra, ao lhe proporcionar abrigo, provavelmente
tinha salvado sua vida. Em vez disso ele se concentrou em assegurar que
nós, seus quatro meninos, tivéssemos a educação
que ele não pôde receber.
Ele nos deu
um presente. Pode parecer ridiculamente pequeno, mas não era. Ele
nos deu a chance de lhe dar orgulho. Ele jamais colocou isso em palavras.
Não era um pai neurótico, ansioso por status, insistindo
para que seus filhos conseguissem o máximo. Nós apenas sabíamos,
sem que nos fosse dito, que estávamos além dele, lendo os
livros, absorvendo as idéias, adquirindo a cultura que ele admirava
mas não tivera a chance de tornar sua. Ele caminhava um pouco mais
ereto por causa de nós – e nós caminhávamos
um pouco mais eretos porque sabíamos que ele o fazia.
Nada é mais verdadeiro do que afirmar que na infância nos
tornamos aquilo que somos inspirados a ser. "Seus filhos e filhas
profetizarão" – disse o Profeta Yoel – "seus
velhos terão sonhos e seus jovens terão visões."
A infância precisa de suas visões e aspirações.
Yossef – a primeira pessoa descrita como adolescente na Bíblia
– foi o sonhador dos sonhadores. O jovem Moshê, movido pela
provação de seu povo, começou a luta contra a injustiça
e escravidão que se tornaria sua vida e seu legado.
Quando somos jovens, queremos mudar o mundo. Se este instinto é
frustrado, há o perigo de que nossos filhos se voltem para a bebida,
drogas, sexo, perigos, violência, fúria e muitas outras patologias
de nossa era.
É por isso que nossa comunidade, juntamente com muitas outras,
fez um esforço especial para reconhecer a contribuição
dos jovens à Semana do Voluntariado deste ano. Vinte e um milhões
de pessoas na Inglaterra tomaram parte em alguma atividade voluntária,
e tentamos, dentro de nossas escolas e grupos de jovens, encorajar isso
da melhor maneira, permitindo que os jovens exercitem sua liderança
no serviço comunitário e social, ajudando os necessitados,
amparando os solitários, compartilhando talentos e promulgando
seus ideais. Nós damos a eles a chance de nos proporcionar orgulho
– e eles correspondem.
Assim deve ser o caminho do futuro. Se queremos que nossos filhos se tornem
cidadãos ativos, temos de induzi-los cedo nos hábitos da
responsabilidade. Eles precisam de espaço para escreverem seu próprio
capítulo na história que compartilhamos, e precisam saber
que confiamos neles para fazê-lo – cometendo erros ao longo
do caminho, mas aprendendo com eles. Mais que os pais ou as escolas, são
as crianças que educam as crianças. Tudo que podemos fazer
é dar-lhes a chance de dar – para outros, para a sociedade
e ao mundo que um dia lhes pertencerá.
Um ideal religioso? Sim, realmente.
D’us é um Pai e nós somos Seus filhos. Nós
Lhe damos dor de cabeça grande parte do tempo, mas Yeshayáhu
ousou pensar que às vezes também Lhe damos orgulho. "Você
é meu servo" – disse ele em nome de D’us –
"em quem me glorifico." Os rabinos dizem: "Chame-os não
de ‘seus filhos’, mas de ‘seus construtores’.
Precisamos compensar o desequilíbrio entre afluência material
e pobreza moral em nossa cultura. Nossos filhos construirão o amanhã
se eles doarem, não consumirem, no dia de hoje.
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