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  Uma Fortuna em Bondade
 
Por Jenny Hazan – Aish.com
  Helen e Joe Berman estavam entre dezenas de jovens judeus recém-casados vivendo em meio à pobreza na área de Kensington Market, Toronto, durante a Grande Depressão.. Helen tinha 19 anos e estava grávida do primeiro filho.

Era o auge do inverno e no lugar de um casaco de inverno apropriado, Helen se envolvia num cobertor de lã grossa até que o jovem casal conseguisse economizar dinheiro suficiente para comprar-lhe um casaco. Quando eles finalmente juntaram o dinheiro, Helen saiu de casa e foi até uma loja de departamentos, toda contente, quando viu um garoto da vizinhança caminhando de sandálias no pé sobre a neve. Quando ela lhe perguntou por que, ele disse que sua família não podia comprar sapatos ou botas.

“Minha mãe levou o menino com ela,” relata Shellie Grafstein, que fez aliyah de Toronto há três anos com seu marido e cinco filhos, “e em vez de comprar um casaco para si mesma, comprou botas para ele. Ele me disse que aquelas botas aqueciam seu coração mais do que qualquer casaco. Minha mãe sempre diz: ‘O coração é um músculo que você precisa exercitar o tempo todo.’ Meus pais, ambos, foram o sal da terra – seus corações eram simplesmente maciços.”

Após uma carreira longa e extremamente bem-sucedida como fundador da Cadillac Construction, a empresa que construiu o Eaton Center e Erin Mills, entre outros marcos de Toronto, Joe berman faleceu em 2003 aos 81 anos, deixando Helen para trás.

“Meu pai era surpreendente. Mesmo depois que D'us o abençoou com incrível riqueza material, ele ainda tomava o metrô todo dia para trabalhar e comprava suas roupas em Kensington Market,” diz Shellie.

Após uma vida inteira de doação, Helen, 89 anos, vive agora numa casa modesta em Tornhill, tendo distribuído a maior parte de sua fortuna. “Minha mãe acha realmente que sua riqueza foi um presente do Todo Poderoso, e que deve ser partilhada. Foi um presente que eles dividiram por completo. Ela sempre diz: ‘Uma mortalha tem bolsos?’”

Helen agora sofre de Alzheimer e, diz Shellie com um suspiro, “não consegue lembrar todas as maravilhosas coisas que fez. Ela gosta de ouvir as histórias, assim como todos nós gostamos.”

Shellie fez sua a missão de manter acesa a tocha da lembrança e a usar a bondade de seus pais para inspirar outras pessoas.

A Forma mais Elevada de Doar
Joe e Helen Berman, com 1,60 m e 1,56 m respectivamente, - “pessoas pequenas que granjearam enorme respeito,” como Shellie os descreve – deram apoio filantrópico a dezenas de organizações, com frequência lhes provendo a base financeira. A longa lista inclui: a Yeshiva Nefesh Dovid para deficientes auditivos em Toronto; a Fundação Reena para crianças deficientes em Toronto; a escola Boys Town Jerusalém para os filhos de novos imigrantes a Israel; a primeira filial Aish HaTorá em Toronto e o Instituto Educacional Ohr Somayach em Jerusalém.

Porém o que Shellie mais lembra não são as organizações ou o dinheiro que seus pais doaram, mas a maneira pela qual o fizeram. “No local onde fui criada há muitas pessoas ricas, e todas elas preenchem cheques. Há uma grande diferença entre preencher cheques e demonstrar um interesse pessoal na vida de alguém – dar empregos, dar auto-estima. Essas são as formas mais elevadas de tsedacá, e era isso que meus pais faziam.”

Shellie, a mais nova dos cinco filhos dos Berman, cresceu numa mansão em Bridal Path, um dos bairros mais ricos de Toronto. “Eu detestava crescer naquela casa grande e luxuosa,” admite ela, “mas adorava que meus pais fizessem tanto bem com ela.”

Além de abrir a casa para a comunidade – a residência deles era como uma piscina pública do bairro – eles também abriam as portas a famílias necessitadas.

A primeira família que os Berman “adotaram” para morar em sua casa há 35 anos foi uma mulher escocesa e seus dois filhos pequenos. Helen tinha conhecido a mulher 15 anos antes, quando ainda não era casada nem tinha seus próprios filhos. Ela fora para Toronto para trabalhar como babá para uma família do bairro. Tragicamente, o recém-nascido morreu de Síndrome do Berço e a mulher foi mandada de volta para a Escócia, onde conheceu o marido e iniciou a própria família. Quando Helen soube que o marido da mulher tinha morrido, deixando-a em situação precária com dois filhos pequenos, ela trouxe-a de volta ao Canadá para morar com eles.

Por fim a mulher casou-se novamente em Toronto, relembra Shellie.

Os Berman “adotaram” uma segunda família cinco anos depois. Helen tinha lido um apelo no jornal de uma jovem mãe que tinha imigrado recentemente ao Canadá vinda do Caribe, e tinha tido quadrigêmeos. A jovem família era carente, e estavam pedindo ajuda à comunidade.

Após enviar um cheque naquele mesmo dia, Helen admitiu para Joe que não conseguia dormir. Ela entrou no carro e insistiu para que o marido a levasse a um dos novos conjuntos residenciais da empesa. Quando chegou ao conjunto, perguntou a ele: “Joe, quais dessas casas podemos dar à família Ricky?”


HelenBerman com seus filhos

Após se recuperar do choque de doar uma casa para estranhos, ele deixou-a escolher qual ela queria doar. Dali, ela foi direto à loja de departamentos e comprou todos os móveis necessários para mobiliar a casa de alto a baixo, incluindo quatro berços, quatro cercadinhos, quatro cadeiras altas, cobertores e brinquedos. Dali, ela foi ao supermercado e estocou a casa com todos os mantimentos. Em dois dias, a casa estava perfeita. “Ela até cozinhou para eles!” lembra Shellie. “Então ela fez meu pai dirigir até o jornal que tinha publicado o anúncio e deu a eles a chave para que entregassem à família.”

Os Ricky se tornaram parte da família dos Berman. Os pais chamavam Helen e Joe de “Papai e Mamãe” e as crianças os chamavam de “Bobe e Zeide”. Os Ricky iam a todas as festas dos Berman e quando os bebês completaram um ano, Helen fez para eles uma imensa festa de aniversário na mansão. Enviava-os a acampamentos de verão e aulas após a escola, e pagou as lições de direção dos pais. Joe até arrumou um emprego para o Sr. Ricky. “Eles eram realmente parte da nossa família,” diz Shellie.

Seus pais sabiam os nomes e histórias de vida de todos os empregados na construtora da família; todo operador de caixa no armazém; todo atendente no posto de gasolina do bairro e todo caixa de banco. “É assim que eles eram,” conta Shellie.

Nunca é tarde demais para aprender
Somente após completar setenta anos foi que o casal entrou realmente para o Judaísmo. Após responder a um apelo para ajudar a abrir uma filial de Aish HaTorá em Toronto, o casal começou a estudar Torá. “Quanto mais eles aprendiam, mais gostavam daquilo,” diz Shellie, lembrando que quando o pai estava doente demais para comparecer às aulas ele costumava participar via viva-voz.

“Quando se tratava de lições sobre tsedacá, era assim: ‘Eu sabia disso,’ ou ‘eu sabia daquilo’. O estudo era uma validação da maneira pela qual eles tinham vivido até então.”

Quando tinham 75 anos ele casherizaram sua casa, mudaram-se para um bairro judaico em Tornhill, e começaram a guardar o Shabat. “Foi preciso uma grande dose de coragem para eles mudarem a vida daquele jeito. Eles são a prova viva de que você jamais é velho demais para recomeçar,” diz Shellie.

“Quando olho para meus pais e o que fizeram durante a vida, penso que são uma grande inspiração. Meus pais são verdadeiros heróis. Eles mostram que é possível para pessoas com dinheiro, para pessoas sem dinheiro, para religiosos, para não-religiosos. Toda pessoa tem em seu poder tornar o mundo um lugar melhor, doando. Como minha mãe costumava dizer: ‘D'us é como essa voz no meu ouvido; o truque é ouvir a Ele.’”
     
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