Um Mergulho em Aruba  
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Por Helene Storch
 

A comida era espetacular, as acomodações luxuosas, empolgantes esportes aquáticos, noites encantadoras, brisa tropical, e dias em technicolor rodeados pelas águas cor de turquesa, cristalinas.

Mergulhamos. Andamos de jet ski. Escalamos alguns rochedos. Fizemos um passeio de submarino com piso transparente no qual se podia ver o oceano.

Foi como um sonho de família se tornando realidade. Meus pais tinham nos dado estas férias de presente no Hotel Americana, cinco estrelas, em Aruba. Conosco estavam meu irmão, minha irmã, seus cônjuges, minhas sobrinhas e meus sobrinhos. Eram férias bem diferentes da costumeira viagem às Montanhas Catskill no estado de Nova York.

Tínhamos tudo – exceto um micvê. Devido a uma falha no meu ciclo menstrual, a ausência de um micvê apresentava um desafio.

O que fazer? Para mim parecia óbvio. Meu marido ficou incrédulo – não, perplexo – quando disse a ele que eu transformaria o Mar do Caribe num micvê.

“Helena,” disse ele, “acho que você enlouqueceu! Quer se arriscar a um ataque de tubarão ou a uma pneumonia?! Espere alguns dias até voltarmos para casa e poderá usar o micvê da nossa comunidade!”

Conheço meu marido. De maneira alguma ele desejaria que eu me arriscasse para que pudéssemos voltar a ter relações conjugais. Porém estávamos num cenário romântico, um verdadeiro cartão postal, desfrutando férias quase perfeitas, rodeados de água!

Meu marido, médico e cientista, Ph.D, tentou me desencorajar, mas minha irmã conspirou comigo. Ela seria minha cúmplice. Minha irmã ficaria vigiando enquanto eu mergulhava três vezes sob a cobertura da escuridão. Meu marido finalmente concordou com meus planos loucos e ofereceu-se para ficar de olhos abertos à procura de “curiosos” num posto na areia da praia. Na escuridão da praia imensa, meu marido estaria a uma distância suficiente para ouvir nossos gritos caso ocorresse algum desastre.

Já era tarde da noite quando minha irmã e eu deixamos o hotel. Vestindo robes brancos e carregando toalhas, qualquer um pensaria que estávamos a caminho da piscina do hotel. Porém atravessamos o pátio e fomos na direção do mar.

Alguns casais passeavam pelas praias. Seus passos eram iluminados somente pela lua e pelas luzes distantes do hotel. Esperamos até o caminho ficar livre, literalmente. Após meia hora, às onze, o último dos passantes voltou para o hotel.

Meu marido estava a postos, e minha irmã e eu começamos nossa aventura.

Ao nos aproximarmos da água, tentamos acalmar nossos temores e convencer uma à outra que aquela era uma praia bem cuidada, com o lixo recolhido diariamente; que a areia era limpa e macia; que a água era limpa e clara, e que não havia tubarões naquela área – especialmente à noite.

Porém não importa o quanto usássemos a lógica, a escuridão não era nossa amiga, e surgia todo o tipo de pensamento assustador em nossa mente. Poderia haver conchas quebradas ou cacos de vidro sob os nossos pés, tubarões e outras criaturas marinhas, buracos inesperados no chão, colônias de algas tenebrosas – ou, ainda pior, um nadador noctívago!

A areia morna e branca tinha se transformado em cinzenta e úmida. A água clara agora era negra, ocultando sabe-se lá o quê. E sem o sol caribenho, a água estava fria – realmente fria. Odeio frio. Meu corpo é avesso ao frio. Uso roupas de baixo térmicas durante todo o inverno, e durmo com três cobertores.

Tirei a roupa, minha irmã vigiou minha corrida até a água segurando meu robe, e chapinhei pela água rasa. Minha meta era chegar até a altura do peito, a distância de um quarteirão; minha irmã seguia atrás de mim na água. Ela tinha de entrar na água para ver-me cumprir a exigência haláchica de submergir três vezes.

Já na água, tentei pensar em D’us e na mitsvá. Porém precisava reunir toda a minha coragem para lutar contra o desconforto e o medo. Recitei minha bênção em tempo recorde. Você poderia chamá-la de mergulho a jato ou mitsvá expressa. E saí da água o mais depressa que minhas pernas bambas conseguiram me carregar. Mas consegui.

À medida que meus pés pisavam na areia seca, ocorreu-me o pensamento de que minha experiência poderia ter sido pior. E se eu estivesse de férias num hotel no deserto ou na região ártica?

Caminhando pela praia, os primeiros sons que ouvi foram as notas de um calipso que vinham do hotel, onde uma festa do tipo “monte seu próprio sorvete” estava em andamento. Pensar em sorvete me fez sentir ainda mais frio.

Parecendo dois ratos molhados com os lábios roxos, abrimos nosso caminho triunfante pelo saguão. Sem prestar atenção aos sorvetes com cerejas ao maraschino e calda quente de chocolate, fomos direto para o quarto.

Na noite seguinte, eu estava repleta de sentimentos agradáveis e calorosos. Toda embonecada, passeei com meu marido pela calçada, contemplando a praia que na noite passada me parecera tão assustadora.

“Minha querida,” disse ele, “você é uma mulher corajosa.”

Banhada pelo seu olhar amoroso e pelo céu pontilhado de estrelas, eu não me sentia mais uma mulher comum.

     
     
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