O Paradoxo do Livre Arbítrio  
 
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  Primeira questão: Determinismo
   
 

Tudo já não está pré-determinado pela mecânica do universo?

A resposta curta:

D'us geralmente age seguindo padrões bastante previsíveis. A primavera ocorre depois do inverno. As éguas dão à luz cavalos. Se um objeto move-se sem barreiras a 60cm por minuto, viajará 120cm em dois minutos. Um filho nascido de dois pais louros provavelmente será louro. Mas, como tudo brota de Sua imaginação desenfreada, dentro daqueles padrões, D'us tem flexibilidade ilimitada. E, naturalmente, Ele sempre reserva a opção de fazer o totalmente inesperado.

Uma resposta um pouco mais longa:

O Determinismo foi uma teoria que evoluiu por muitas eras, atingindo seu auge no século dezenove. O universo era visto como uma grande máquina funcionando com o mesmo princípio de causa e efeito de um relógio suíço. Foi associada a uma outra idéia chamada Reducionismo, a qual declara que, se sabemos o que as partículas básicas do universo estão fazendo, poderemos explicar o comportamento de todas as coisas que são feitas daquelas partículas. Isso incluiria elementos químicos, plantas, animais, e até os seres humanos.

Sistemas determináveis têm sido observados e medidos por milênios, e mais exatamente desde o tempo de Galileu. A suposição de que todos os sistemas, incluindo os mais complexos, são determinados, jamais foi demonstrada, e nem o reducionismo. Também não foi demonstrada a asserção na qual se apóia, de que o universo é construído por partículas irredutíveis, com comportamentos previsíveis. Estas todas eram nada mais que suposições feitas com base em que, bem, pareciam boas. Máquinas feitas por seres humanos funcionam assim, portanto, por que não o universo? Pode chamá-lo de "Criando D'us à nossa imagem."

Quando os cientistas desenvolveram instrumentos precisos e métodos rigorosos o suficiente para examinar o universo de perto, descobriram para sua surpresa que nenhuma destas três suposições tinha qualquer fundamento. Pelo contrário, o princípio da incerteza tem sido universalmente aceito pelos físicos. Uma popular interpretação deste princípio - com crescente evidência - é que a consciência humana desempenha um papel principal na determinação da realidade. Existem mesmo cientistas respeitáveis que declaram categoricamente que as coisas acontecem porque as observamos acontecer. (Veja Eugene Wigner, Simetrias e Reflexões, cap. 13; veja também o artigo do Dr. Naftali Berg em B'or HaTorah, vol. 9, págs. 34-49).

Aqueles que trabalham no campo da teoria do caos e sistemas complexos enfatizam que uma pequena alteração em um único átomo pode repercutir através do cosmos, causando um maior impacto no macrocosmo. Como atualmente entende-se que os elétrons são indeterminados, o estado do cosmos também deve ser. Podemos fornecer previsões gerais, mas os detalhes sempre nos escaparão. Não porque sejam muito difíceis de determinar, mas porque eles simplesmente não são determinados por seus precedentes.

É claro que se está longe de um consenso quanto às nuances destes problemas. Mas por todo o panorama das posições, todos concordaremos com o seguinte: Se alguém deseja acreditar que o universo vai por um único caminho, predeterminado, deve fazê-lo com base na fé, não na ciência.

Por que não deixamos simplesmente que os mecanismos falem por si próprios? Estas palavras foram pronunciadas perante uma reunião representativa de cientistas em 1986:

"Eu... devo falar... em nome da vasta fraternidade global de profissionais da mecânica. Nós gostaríamos de nos desculpar coletivamente por termos orientado erroneamente o público educado em geral, ao divulgarmos idéias sobre o determinismo dos sistemas, satisfazendo as leis de Movimento de Newton que, após 1960, foram provadas incorretas." [1]

A opinião da Torá é clara e inequívoca: não são as leis e estado do universo que determinam o que virá em seguida, mas a Suprema Consciência que transcende todo este esquema. É que simplesmente esta Consciência geralmente prefere seguir Seu caminho dentro dos limites de padrões consistentes. Esta consistência é o que aparece para nós como Leis da Natureza.

Além disso, esta Suprema Consciência não é para ser vista como alguma força externa que por acaso deparou com o universo e resolveu brincar com ele. Ao contrário, aquela Consciência é a perpétua origem de tudo que existe. A cada momento, toda a matéria e energia é gerada novamente a partir do vácuo, mais ou menos como um filme sendo projetado sobre a tela - exceto que, neste caso, o tempo e o espaço são também perpetuamente renovados. Nas palavras de Maimônides: "Se Ele cessasse o estado de ser, tudo o mais não seria." E como explica Rabi Shneur Zalman: "Se as forças que D'us usa para fazer o cosmos existir cessassem por um momento e voltassem à sua fonte, todo o cosmos seria o nada absoluto, simplesmente como se jamais tivesse sido, retornando ao vácuo que precedeu os seis dias da Criação."

Atualmente, esta opinião também tem sido adotada por muitos cientistas respeitados. Nas palavras de um notável astrofísico, Professor William Stoeger: "O ato de fazer algo a partir do nada (desde que este algo seja contingente) é necessário em cada ponto temporal e espacial. A causa primária não pode cessar de agir em apoio às causas secundárias, contingentes, processos, ou entidades - não pode deixar de ser influencial e eficaz - sem que o universo, que é contingente, deslize de volta para o nada absoluto." (Cosmos, Bios, Theos, pág. 259, ed. Margenau e Varghese, Open Court, Chicago, 1992).

A diferença prática entre este esquema e a visão mecânica do cosmos é dupla: em primeiro lugar, não há nada impedindo esta Consciência Original de curvar ou mesmo quebrar as regras da consistência de vez em quando. Segundo, as assim chamadas Leis da Natureza (i.e., regras de consistência) não são tão rigidamente conectadas - qualquer situação pode se ramificar em uma vasta gama de consequências. Depende da Grande Consciência escolher em cada ponto. Fundamentalmente, tudo se resume a isso: O mundo não é um artefato de leis cegas e mudas. É um ato continuamente deliberado, de vontade e inteligência.

Como Ele escolhe? Conforme o que escolhemos. Isso é o que a Torá repete infinitas vezes: D'us diz: "Se você fizer isso, então assim farei." Como o Rei David descreveu o relacionamento: "D'us é sua sombra."

Nem tudo depende de nosso livre arbítrio. O inverno seguirá o outono, o sol se erguerá a leste, alguns nascerão inteligentes e outros com talentos mais limitados. Mas as coisas que são importantes na vida - ou seja, o que você faz com aquilo que recebeu, e qual será o resultado disso - eis o que depende de você.

Nota
[1] - J. Lighthill, "A falha recentemente reconhecida da previsibilidade na Dinâmica de Newton", em Previsibilidade na Ciência e Sociedade, editado por J. Mason, uma edição especial de Procedimentos da Sociedade Real, A407, 35-60 [1986].

Vamos para a pergunta seguinte:

D'us sabia exatamente o que estava para fazer quando me fez assim. Sou apenas uma máquina programada. Como posso ser culpado por ser do jeito que sou?

 

 

 
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