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  Lições do Wiki Leaks  
 
Por Sarah Esther Crispe –  20 de dezembro, 2010
 

Esses Wiki Leaks me fizeram pensar. Quando é apropriado esconder informação? Quando é imoral, se não ilegal? Informação demais é prejudicial? Até mesmo perigosa? Mortal? Como traçamos aquela linha tenue entre proteção vs. supressão?

Na verdade não tenho interesse em debater a política aqui ou mesmo lidar com os detalhes desses vazamentos. Também não vou me aventurar a discutir as complexas ramificações da Lei Judaica sobre fofoca ou calúnia (lashon hará) e como os intrincados aspectos práticos dessas leis se aplicariam ou não ao Wikileaks.

Porém eu gostaria de discutir os muitos paralelos que podemos usar a partir dessa situação em nossas vidas.

Para começar, todos temos segredos. E todos deveríamos ter. Contanto que a informação que não estamos compartilhando seja no melhor interesse tanto de nós mesmos quanto daqueles das quais a estamos escondendo. Todos sabemos que o excesso de informação pode afastar alguém. Somente à medida que as coisas se solidificam e haja uma base e confiança para partilhar é que revelamos cada vez mais. Isso precisa ser seguro, e precisa ser benéfico ao crescimento do relacionamento. Porém quanto mais acontece, mais informação é divulgada.

Isso é claramente demonstrado na partilha de informação com a própria família. Especificamente entre pais e filhos. Seja como os pais administram suas finanças, ou as decisões que tomam sobre as necessidades dos filhos, há detalhes e informações intermináveis que são mantidos em sigilo. Não somente não é adequado que o filho saiba como essas decisões são calculadas e determinadas, mas não seria saudável que o filho soubesse. Portanto, como pais estamos constantemente escondendo informação pertinente aos nossos filhos, mas em benefício deles. E obviamente aquilo que é revelado a um filho de três anos vs. um na escola primária vs. um filho no ensino médio pode variar bastante. Quanto mais velho o filho se torna, mais será discutido e partilhado. Mas mesmo com um filho adulto, há certas coisas que jamais podem ser explicadas ou informação que jamais deveria ser divulgada.

Porém essa situação ente pai e filho, ou qualquer situação na qual a informação não está sendo compartilhada, somente pode funcionar de maneira sadia quando existe… CONFIANÇA. A respeito de algo como dinheiro e filhos, nossos filhos devem confiar de que quando se trata de como tomamos decisões financeiras estamos freqüentemente tentando economizar para eles ou se estamos gastando, é para suas necessidades e despesas. Quando eles confiam em nós, em última análise confiam que tanto aquilo que sabem quanto aquilo que não sabem é em seu melhor interesse. Portanto quando escondemos algo deles, é porque estamos na verdade lhes fazendo um favor.

Infelizmente, é a falta de confiança que existe entre governos e políticos que levou ao Wiki Leaks, em primeiro lugar. Se realmente confiamos que a informação sendo escondida de nós era para a segurança nacional e para nossa proteção, ninguém estaria interessado em vazar coisa alguma! Mas não confiamos. Tememos que a informação esteja sendo escondida de nós. Que não estejamos sendo informados de coisas que merecemos saber. E por causa disso estamos procurando maneiras de entender por nós mesmos. Foi assim que nasceu o Wiki Leaks, e vemos quão rapidamente cresceu até ter se tornado algo tão poderoso.

Quando não há confiança, não pode haver verdadeiro relacionamento. E a confiança somente pode surgir quando você está certo de que aquele que está liderando você o faz em seu melhor interesse. No misticismo judaico vemos isso fortemente. O aspecto de liderança, de soberania, da capacidade de governar é o nível de Malchut. Porém Malchut é considerado o último, o nível final dos aspectos intelectuais e emotivos, as sefirot, O motivo para isso é que um verdadeiro líder no Judaísmo é o maior servo. Pois para liderar, a pessoa deve estar procurando e preocupada com as necessidades de todos aqueles que está liderando. E da mesma forma, quando você sabe que seu líder está ali para você, e realmente atendendo às suas necessidades, então você pode confiar de que as decisões estão sendo tomadas para o melhor.

Costumava ser muito fácil esconder informação, mentir sobre os fatos. Porém os tempos mudaram. Através da Internet e da tecnologia, tudo está se tornando mais e mais transparente. E com todas as preocupações e negativas, também há algo muito positivo nisso. Precisamos saber como indivíduos que se você fizer algo aparentemente em privacidade, pode levar segundos para chegar ao Facebook ou se tornar um vírus no YouTube. Não existe mais isso de ter uma foto que ninguém mais jamais irá ver. Porém isso significa que ficaremos muito mais cuidadosos sobre aquilo que faremos, onde seremos vistos ou como iremos nos comportar. E isso é bom. Pois deveríamos saber que os outros estão nos assistindo e outros estão cientes das nossas ações.

Essa nova era de transparência na verdade está finalmente nos fazendo reconhecer que jamais estamos realmente sozinhos e que nosso comportamento, tanto público quanto privado, afeta os outros. Assim como você diminui a velocidade quando avista um carro da polícia atrás de você, assim também, saber que nossas ações podem se tornar públicas instantaneamente significa que aquelas ações serão as melhores, o nosso melhor comportamento. E vamos ser sinceros… estamos sempre sendo observados. Certamente lá do Alto e com frequência, também por aqueles perto de nós.

Porém de maneira alguma estou advogando que tudo se torne revelado e que não deveríamos ter nada que permaneça privado ou protegido. Mas estou feliz por estarmos chegando a um ponto onde não podemos mais enganar, ocultar ou mentir sobre verdades que outros têm o direito de conhecer. E obviamente, com esses Wiki Leaks, não somos apenas nós como indivíduos que estamos fazendo essa descoberta, mas governos e países estão se tornando cada vez mais expostos. E essa parece ser uma lição importante para todos nós. Está na hora de começarmos a reconhecer que ao final do dia, quando algo sai do nosso âmbito privado do pensamento e se transfere para nossa fala e ação, tem o potencial de se tornar domínio público. E isso é algo para se pensar.

 

 

 
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