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Dez anos atrás minha
mãe, sobrevivente húngara do Holocausto, disse-me que tinha
desistido da ideia de museus do Holocausto. Foi uma estranha declaração
vinda de alguém que sofrera tanto, Aos cinco anos, minha mãe
se tornou praticamente órfã: seu pai tinha sido morto num
campo de trabalho na Ucrânia e sua mãe fora levada a Bergen-Belsen,
de onde retornaria somente depois da guerra. Após ser passada primeiro
para seus avós num gueto judeu em Budapeste e depois para uma família
não-judia, minha mãe finalmente foi abrigada numa casa segura
para crianças judias estabelecida pela Cruz Vermelha. Nem mesmo
ali ela estava invulnerável. Em pelo menos uma ocasião os
nazistas atacaram a casa e levaram as crianças até o Rio
Danúbio para serem fuziladas. No último instante, sua tia
a arrancou da fila e ela foi salva.
A declaração de minha mãe não era insensível.
Como uma sobrevivente crescendo numa família de sobreviventes e
cercada por uma comunidade de sobreviventes em Skokie, onde morávamos,
ela era bem consciente de que outros tinham sofrido destinos ainda piores
que o seu. Ela tinha o maior respeito – e ainda tem – por
aquelas pessoas que não apenas sofreram os horrores da guerra,
mas ainda tiveram a coragem e a força para reconstruir a vida e
a vida de suas famílias após a guerra. Quando éramos
crianças, meus irmãos e eu ouvíamos histórias
de incontáveis pessoas que tinham transformado suas vidas alquebradas
em vidas prósperas. Sempre respeitei a força dos sobreviventes
e me considero um abençoado beneficiário de sua força
coletiva.
Não, a declaração de minha mãe não
foi cruel, foi meramente prática. Olhando em profundidade, ela
entendia que o dilema enfrentado pela comunidade judaica não era
lembrar do Holocausto, mas produzir a próxima geração
de jovens judeus. Ela entendia que uma criança sem uma boa educação
judaica estava fadada a assimilar-se e que um jovem, homem ou mulher,
que sentisse pouca conexão com sua história, cultura e religião
tinha uma boa chance de fazer um casamento misto, rompendo uma corrente
de milhares de anos que incontáveis outros tinham fortalecido e
protegido.
Portanto, foi com sentimentos mistos que abordei a inauguração
do Museu do Holocausto em Illinois e Centro de Educação,
o mais recente e provavelmente o último Museu do Holocausto a ser
construído nos Estados Unidos. Por um lado, senti um grande orgulho
cívico. Minha pequena comunidade, Skokie III, ficaria para sempre
no mapa judaico.
Em 1977, um pequeno grupo de sobreviventes tinha se reunido para opor-se
a uma marcha planejada por neo-nazistas. Sua luta para manter os nazistas
fora das ruas de Skokie (onde um número desproporcional de sobreviventes
do Holocausto tinha se estabelecido após a Segunda Guerra) agora
recebe o crédito por ter lançado o movimento de educação
sobre o Holocausto nos Estados Unidos. Um museu grande e impressionante,
com o aval do Presidente Obama, Elie Wiesel e outros, é um monumento
às persistência e determinação da comunidade
sobrevivente em Chicago.
Não posso deixar de sentir que nossas prioridades estão
equivocadas. Enquanto estamos construindo museus ao nosso sofrimento do
passado, nosso povo está desaparecendo. As estatísticas
são familiares e numerosas: uma taxa de casamentos mistos acima
de 50 por cento, tem pouco ou quase nenhum interesse na vida na sinagoga,
exceto nos círculos observantes; jovens cada vez mais desencantados
e desconectados com o Estado de Israel. Uma população que
tem crescido pouco desde o final da guerra, apesar dos esforços
dos dedicados profissionais da comunidade que têm colocado milhões,
se não bilhões, para nutrir a vida judaica nos Estados Unidos.
Milhões gastos num Museu do Holocausto irão produzir netos
judeus? Ajudarão um jovem judeu a valorizar a profundidade e relevância
da sabedoria judaica? Ajudarão jovens judeus a entender por que
o casamento judaico é tão vital para a sobrevivência
da comunidade?
Ofensa, Não Defesa
Talvez essas sejam perguntas injustas. Após passear pelo museu
e comparecer a uma cerimônia de inauguração, ficou
claro que a missão do museu não é reforçar
a identidade judaica, mas educar o público sobre o genocídio.
Uma vez que os visitantes sejam compelidos a entender o puro mal dos motivos
dos agentes e a impotência das vítimas, prossegue o argumento,
outro Holocausto tem menos probabilidade de acontecer.
Esse museu vai um passo além dos outros museus do Holocausto que
tenho visitado, relacionando explicitamente a Shoah com outros genocídios
recentes – Armênia, Cambodja, Ruanda – numa tentativa
de universalizar a mensagem do sofrimento judaico.
Mas eu acredito que comparações somente são úteis
se você acredita que educar alguém sobre alguma coisa tão
irracional quanto o antissemitismo irá realmente melhorar o seu
comportamento. Porém a educação sobre o Holocausto
foi eficaz? Impediu os hutus de levantar facões contra os tutsis?
Mudou os desígnios da Sérvia para os campos de concentração
na Bósnia? Impediu as Nações Unidas, aquilo que temos
de mais próximo a um governo mundial, de promover uma conferência
“anti-racismo”, na qual o presidente de um país que
tem defendido a total destruição de outro recebeu elogios?
Embora eu tenha certeza de que há pessoas que entram em ação
após uma visita a um museu do Holocausto e estou certo de que desempenham
um papel importante na educação, não creio que sejam
vitais para a sobrevivência de nossa comunidade. Em última
análise, teremos de salvar a nós mesmos.
Primeiro, vamos entender que construir museus do Holocausto é para
defesa, não ofensa. Criar uma instituição cujo objetivo
é ensinar os visitantes a não se aliarem a tiranos e não
perseguir estrangeiros é um ideal maravilhoso, mas creio que podemos
fazer mais. Penso que podemos ensiná-los sobre o sofrimento judaico
em particular e explorar as maneiras pelas quais a perseguição
e assassinato de judeus é totalmente diferente de outras, como
é o caso no Yad Vashem de Israel. Segundo, concentrar-se no futuro
e projetar força, não fraqueza.
Como jornalista judeu, leio praticamente tudo que afeta a comunidade judaica
e Israel. E no decorrer dos últimos anos tenho começado
a sentir que a obsessão comunal com o Holocausto está enviando
a mensagem errada para o mundo. Envia uma mensagem de fraqueza e não
de força. Diz às pessoas que ainda estamos lambendo nossas
feridas, enquanto nossa verdadeira força está nas incríveis
comunidades que temos construído após a guerra, comunidades
que não teriam sido construídas sem as enormes contribuições
de sobreviventes. Ironicamente, os sobreviventes têm nos ensinado
uma valiosa lição sobre como viver seguindo em frente com
a vida. Embora devamos nos lembrar, também devemos considerar a
lição deles, construindo a vida judaica.
Então o que devemos fazer?
Creio que há somente uma resposta. Por mais que viagens a Israel
possam ajudar a construir a indetidade entre os jovens americanos e programações
culturais possam convencê-los que ser judeu é “legal”,
uma educação judaica abrangente é a suprema solução.
Estudos mostram que crianças judias com educação
na escola de tempo integral são propensos a se filiarem à
comunidade no decorrer da vida e casar-se dentro da comunidade –
numa taxa de cerca de 90 por cento. Se quisermos investir em nossa comunidade,
vamos tomar a ofensiva. Precisamos construir escolas judaicas de período
integral e torná-las uma prioridade comunitária. Dê
às crianças judias um motivo para serem judias e não
teremos de convencê-las a se orgulharem de sua identidade mais tarde.
Finalmente, vamos considerar não apenas os sobreviventes, mas os
6 milhões de mártires que foram assassinados no evento mais
hediondo da história humana. O que meu avô e outros mártires
do Holocausto teriam preferido: um monumento ao seu martírio, ou
saber que seus filhos e netos estão vivendo vidas judaicas plenas,
ricas e prósperas?
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