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O Tanya - parte 51

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Serviço e Luz

No capítulo 115 do Tanya, Rabi Shneur Zalman faz distinção entre duas frases encontradas nas Escrituras: "Um servo de D’us" e "Aquele que serve a D’us". À primeira vista, estes termos parecem quase idênticos.

Para esclarecer as diferenças entre eles, notemos primeiro que cada um dos termos contém duas palavras com diferenças aparentemente insignificantes entre elas. O primeiro refere-se a um servo", ao passo que o segundo a "aquele que serve". O primeiro termo, novamente, refere-se a um "servo de D’us" (o Nome usado é o Inefável Nome de D’us, o Tetragrama), ao passo que a segunda frase refere-se a "aquele que serve a D’us" (o nome Elokim é usado. Nossos Sábios explicam que este nome geralmente denota o aspecto de severidade ou restrição).

Ambas as expressões "um servo" e "aquele que serve" denotam estados interiores de alma diferentes. O termo "aquele que serve" está no tempo presente, sugerindo que a pessoa está atualmente trabalhando em seu serviço Divino. Em contraste, a palavra "servo" descreve alguém que já conseguiu realizar seu serviço. O Tanya classifica "aquele que serve a D’us" como o benoni, cuja vida inteira é dedicada à guerra interna contra seu yetser hará. Ele descreve uma pessoa de quem cada passo positivo para a frente é acompanhado por mudanças em sua personalidade e as normas às quais ele se acostumou. Em contraste, o "servo de D’us" está classificado no Tanya como o tsadic que conseguiu tirar de dentro de si o yetser hará, portanto "seu coração está vazio dentro dele". Isso equivale a dizer que ele não tem conflito com o mal. Assim como o termo "sábio" aplica-se àquele que já adquiriu sabedoria, não a alguém no processo de aprendizado, e como o termo "rei" que é concedido a alguém que já se tornou um rei, assim também o tsadic não é chamado "um servo de D’us" até que tenha atingido o estágio em que não luta mais contra o mal dentro de si.

Há uma terceira categoria de pessoa que também cumpre todos os mandamentos, do maior ao menos importante. No entanto, ele é caracterizado pelo fato de que sua vida não é acompanhada por uma batalha interna. Isso não é porque não exista mal dentro dele, mas ao contrário, ele é estudioso por natureza e tem um yetser hará sem paixão, que não o incomoda nem o tenta a praticar más ações. Como o Tanya enfatiza a importância de servir a D’us, a pessoa que acabamos de descrever é chamada de "alguém que não serve a D’us". Não apenas ele não é "um servo de D’us", ele nem ao menos é alguém que está no processo de servir. Apesar disso, surpreendentemente, de uma perspectiva específica, esta pessoa está classificada na mesma categoria que "um servo de D’us", e não com sua companhia, o benoni, ao qual se refere como "aquele que serve a D’us".

Uma dupla recompensa

Não há qualquer comparação entre as recompensas espirituais e as realizações de "aquele que serve a D’us", e aquele que estuda Torá e cumpre mitsvot sem labuta e esforço. Nossos Sábios expressam isso resumidamente no Tratado Chaguigá: "Aquele que revisa seus estudos cem vezes não pode ser comparado àquele que revisa seus estudos cento e uma vezes."

Nos dias de nossos Sábios, para que a tradição oral fosse adequadamente transmitida através das gerações desde o tempo de Moshê, tinha de ser completamente absorvida pela memória, pois era proibido anotar a Torá Oral. Assim, o costume era revisar cada parte do estudo por cem vezes. Embora estudar aquela parte por cem vezes fosse claramente acompanhado de muita labuta e esforço, mesmo assim, como esta era a norma aceita, aquele que o fazia não era chamado "aquele que serve a D’us". Somente após revisar seus estudos uma vez adicional, além de seu hábito regular, a pessoa merecia o valorizado título de "aquele que serve a D’us". Do ponto de vista psicológico, esta revisão adicional é extremamente difícil de conseguir, pois exige que a pessoa quebre seu hábito e a norma estabelecida.

O Talmud ilustra este ponto pela analogia de um mercado de condutores de burros. Os condutores cobravam um zuz por dez parsi (milhas persas) percorridas, mas exigiam dois zuz para dirigir por onze parsi, pois dirigir uma décima primeira milha excedia a prática costumeira, e portanto o preço era desproporcional à distância envolvida.

Da mesma forma, revisar seus estudos pela centésima primeira vez não expressa a assiduidade extra da pessoa, ou um esforço adicional comparável ao esforço feito em todas as revisões prévias de seus estudos. Ao revisar mais uma vez, ocorria uma mudança fundamental dentro do estudante, pois agora ele é intitulado "aquele que serve a D’us". Todo judeu atrai santidade para si e para o mundo, por meio do cumprimento de uma mitsvá. Mas este nível de santidade é incomparável àquele que é atraído para si mesmo e ao mundo quando a pessoa serve ao Criador além de seu costume natural. A santidade atraída por intermédio de tal serviço ao Criador é incomparavelmente maior que mitsvot e serviço Divino que não são acompanhados por esforços incomumente extenuantes.

     
   
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