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Atraindo
a Luz Divina
Estudar Torá não somente é uma expressão de
interesse nas Escrituras, e cumprir mitsvot não é simplesmente
um ato simbólico e cerimonial. Dentre seus muitos benefícios
está o poder singular que dá a um judeu de atrair Or Ein
Sof, a Infinita Luz Divina, à sua alma e ao mundo, quando ele estuda
Torá e cumpre mitsvot, como explicam os ensinamentos chsssídicos.
Há muitos e variados níveis nesta Divina Luz. O nível
de luz que é atraído por meio do estudo de Torá é
diferente do nível de luz que é atraído por meio
do cumprimento de mitsvot. E mesmo na categoria de mitsvot, cada mitsvá
específica tem sua própria característica, e atrai
um único nível e aspecto de luz.
No capítulo cinco do Tanya aprendemos sobre a "distintiva,
infinitamente grande e maravilhosa superioridade da mitsvá de saber
e conhecer a Torá, acima de todas as mitsvot envolvendo ação,
e até sobre aquelas cumpridas por meio da fala." A razão
para isso é que quando uma pessoa estuda Torá, "além
do intelecto estar sendo envolvido pela sabedoria Divina, [para que a
Sabedoria Divina envolva sua alma] a sabedoria Divina também está
dentro dele, portanto ele a envolve." Em contraste, cumprir todas
as outras mitsvot traz somente um desses dois aspectos – o Eterno,
bendito seja, apenas envolve a alma, e a Luz Infinita apenas a envolve
a partir de sua cabeça (i.e., os níveis mais elevados das
almas) a seu pé (seus níveis mais baixos).
Comida e Roupa
Em vários locais, tanto nas Escrituras quanto nos textos rabínicos,
encontramos a Torá comparada ao pão. Esta comparação
não é simplesmente uma analogia ou retórica, como
poderia sugerir uma leitura simplista dessas declarações.
Ao contrário, esta metáfora caracteriza a essência
da Torá.
Alimento e roupa são ambos benéficos ao homem, embora obviamente
de modos diferentes. Enquanto a comida permeie a pessoa por dentro, infundindo-lhe
força vital, a roupa afeta a pessoa de maneira externa, sendo colocada
em torno dela. Similarmente, a luz Divina envelopa a alma que cumpre mitsvot
e estuda Torá, assim como uma roupa veste a pessoa, ao passo que
a santidade da Torá que penetra a mente de uma pessoa e é
assimilada em sua compreensão é "alimento" para
a alma. A partir daí, podemos concluir que o cumprimento de mitsvot
tem uma fantástica qualidade, ao passo que a compreensão
da Torá tem duas. É por este motivo que Nossos Sábios
declaram: "O estudo de Torá é igual a todas as outras
mitsvot juntas", pois as mitsvot são apenas "vestes",
ao passo que a Torá é tanto "alimento": quanto
"roupa" para a alma intelectual.
Estes "alimento" e "roupa" espirituais servem a alma
tanto neste mundo quanto no Mundo Vindouro – mas como eles são
revelados para a alma depende do serviço Divino do homem neste
mundo. Através da Torá que um judeu aprende em seu mundo
a sua alma no Gan Eden merece a revelação de or pnimi, uma
habitação, permeando luz que é absorvida e revelada
na faculdade de compreensão da alma, análoga à maneira
pela qual a comida é absorvida pelo corpo. E através do
cumprimento das mitvsot nesse mundo, sua alma merece no Mundo Vindouro
uma revelação de or makif, uma luz envolvente que transcende
o recipiente, análoga à maneira que a roupa envolve o corpo.
Alimento Espiritual
A Torá, que unida a um homem é chamada "o pão
e alimento da alma" por causa do efeito de compreender a Torá
na alma, e a maneira que é absorvida na alma, é comparável
à maneira pela qual o pão sustenta o corpo, como explicado
acima. Ora, o princípio idêntico que se aplica ao pão
físico – que nutre o corpo somente depois que a pessoa o
digeriu e ele tornou-se parte de seu sangue e carne – também
aplica-se à Torá. Somente alguém que "a estuda
bem, com a concentração de seu intelecto, até o ponto
onde a Torá é assimilada por sua mente e se junta a ele
para que se tornem um" – somente numa pessoa assim a Torá
torna-se alimento para a alma, e "vida interior para ela, vinda da
Fonte da vida…"
Os ensinamentos chassídicos explicam ainda que o efeito positivo
do pão no corpo humano pode ser sentido apenas se o pão
está adequadamente assado, pois se esta condição
não for satisfeita o pão pode causar danos ao sistema digestivo
e à saúde em geral da pessoa. E assim também ocorre
com o pão espiritual – a pessoa deve aprender como "assar"
e "digerir" corretamente a Torá.
Uma pessoa deveria estudar Torá pelo seu próprio mérito,
com a intenção de unir sua alma a D’us por meio do
entendimento da Torá. Isso pode ser conseguido somente se seu estudo
é com "fogo" – ou seja, quando seu estudo de Torá
está imbuído com amor e reverência a D’us. Se
esta condição não for preenchida, o "alimento"
espiritual que a pessoa ingere pode prejudicá-la e fazê-la
afastar-se do bom caminho, levando-a para a conduta oposta àquela
que a Torá espera.
Os Alicerces da Chassidut
Como foi explicado, o ideal do estudo de Torá é aprender
Torá pelo seu próprio mérito – com a intenção
de unir sua alma a D’us por meio do entendimento da Torá,
cada qual segundo sua capacidade. Uma pessoa pode atingir este nível
de aprendizado somente despertando amor e reverência a D’us
em seu coração.
Uma das histórias relatadas referente aos eventos na época
da conhecida controvérsia entre os chassidim e seus oponentes,
servirá para ilustrar este ponto. Depois que o Alter Rebe, o autor
do Tanya, foi libertado da infame prisão de Petersburgo onde fora
encarcerado sob falsas acusações, ele viajou para encontrar
diversas figuras rabínicas importantes, que tinham expressado sua
oposição aos Chassidim e à Chassidut, a fim de testá-los
e ser testado por eles. Dentre esses rabinos estava uma destacada personalidade,
Rabi Yehoshua Tzeitlin. Este apresentou várias questões
profundas e complicadas ao Alter Rebe, e todas foram respondidas de maneira
exata e completa. Uma dessas perguntas era com que base o autor do Tanya
declarava que a pessoa deveria aprender Torá com amor e reverência.
"Há uma declaração explícita no Zohar"
– replicou Rabi Shneur Zalman – "que afirma que Torá
sem amor e temor não pode ascender ao Alto."
"Tomamos decisões legais baseados na Guemará, não
no Zohar" – respondeu seu oponente.
"Isso está declarado na Guemará, também"
– disse Rabi Shneur Zalman. "No tratado Pessachim o sábio
Ravva destaca uma aparente contradição entre dois versículos.
Em um lugar está escrito: 'Sua bondade é grande nos Céus';
e em outro local está escrito: "Sua bondade é grande
além dos Céus.' Qual a solução desta aparente
contradição? O segundo versículo refere-se àqueles
que aprendem Torá por seu próprio mérito, ao passo
que o primeiro refere-se àqueles que estudam Torá não
pelo seu próprio mérito." (Esta explicação
pode ser encontrada na obra Biur HaRaNaG).
Sem Errar
Durante Purim do ano 5663, quando Rebe Shalom Dov-Ber Shneersohn (que
seu nome seja uma bênção), o quinto Lubavitcher Rebe,
estava em Viena, na Áustria, ele disse o seguinte: "Quando
uma pessoa estuda Torá pelo seu próprio mérito se
une com a Torá a tal ponto que eles se tornam um!" Seu modo
de falar é aquele da Torá, e seu intelecto é a sabedoria
da Torá. O Gaon de Lublin, Rabi Shneur Zalman (o autor de Torat
Chesed, para não ser confundido com Rabi Shneur Zalman, o autor
do Tanya) contou-me que quando foi a Lubavitch para ver o Rebe, o Tsêmach
Tsêdech (neto do autor do Tanya) no ano 5614, levou consigo um complexo
debate que tinha preparado sobre um tópico difícil da Torá,
como era seu hábito quando visitava o Rebe. O debate continha diversos
pontos de vista novos.
Ao chegar em Lubavitch, o Gaon de Lublin revisou com satisfação
seu debate, sabendo que agradaria a seu Rebe, o Tsêmach Tsêdech.
'"Quando entrei na presença do Rebe" – relembra
o Gaon – "começamos a discutir diversos assuntos de
Torá, e apresentei ao Rebe as questões nas quais meu debate
se baseava. O Rebe sorriu, e pediu-me para apresentar minha análise,
e os novos pontos de vista que eu tinha preparado. Fiquei encantado ao
notar que o Rebe ouvia atentamente as minhas palavras.
"Depois, o Rebe me disse: ‘Esta é uma bela peça
de aprendizado, com excelentes argumentos lógicos. No entanto,
o ponto principal está faltando. O alicerce sobre o qual você
baseia todo seu argumento é incorreto. Na verdade, há uma
mishná explícita que contradiz sua teoria!’
"Fiquei chocado e desalentado, e perguntei ao Rebe em qual ordem
da mishná isso poderia ser encontrado." ‘Kodashim’
– replicou ele. Ponderei toda a ordem por algum tempo, mas minha
busca foi infrutífera. "Rebe" – indaguei –
não consigo encontrar meu erro. O Rebe poderia, por favor, dizer-me
em qual tratado a mishná pode ser encontrada?" "Em Bechorot"
– foi a resposta. Revisei rapidamente todo o tratado de cor, mas
novamente não pude encontrar qualquer mishná que contradissesse
minha posição. "Rebe" – disse eu –
"não consigo encontrá-la."
‘Quando o Rebe recitou a mishná e começou a explicá-la,
percebi o meu erro. Somente então eu entendi'"– concluiu
o Gaon de Lublin – "o que significa estudar Torá por
seu próprio mérito! Alguém cuja essência está
unida com a Torá, de forma que se tornem completamente um, não
pode errar e dizer o que não está escrito!'" (De Likutei
Diburim pág. 577).
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