Todo judeu
tem duas almas
Rabi Shneur Zalman
de Liadi certa vez contou a seu neto, Menachem Mendel (que se tornou o
terceiro Lubavitcher Rebe, mais conhecido como Tsemach Tsêdec),
o seguinte: "Quando eu tinha cinco anos, já sabia o significado
do versículo: 'E neshamot (almas) que eu fiz.' Eu sabia que em
todo judeu, homem ou mulher, residem duas almas, uma das quais é
a alma Divina, e a outra a alma animalesca. Sempre me empenhei muito,
fazendo grandes esforços, para entender a profundidade de cada
conceito, e assim passei muito tempo ponderando a diferença entre
estas duas almas. Afinal, ambas são formadas pelo Criador, e a
respeito de ambas o versículo declara: 'Eu fiz.'"
A idéia de duas almas é o princípio fundamental do
Tanya, e serve como uma chave a todo o mistério do coração
humano. Segundo o princípio de que todo judeu tem duas almas, entenderemos
a batalha travada entre elas no homem, e seu mau comportamento ocasional.
E seremos apresentados ao serviço de itkafiya – subjugação
do yetser hará que é exigido do benoni, e de it'hapcha –
sublimação, ou transformação do mal em bem,
que foi atingida por um tsadic.
Em todo judeu
No primeiro capítulo do Tanya, baseado nos ensinamentos da Cabalá
"que cada judeu, seja justo ou perverso, possui duas almas",
Rabi Shneur Zalman afirma que estas duas almas são encontradas
em todo judeu, independentemente de seu status, sua posição
ou sua visão do mundo. Com estas duas almas o judeu nasce, e a
existência delas dentro dele é um fato que não depende
de sua vontade. Evidentemente, usá-las de uma maneira ou de outra,
para o bom ou para o melhor, segundo seu próprio entendimento,
é seu livre arbítrio.
Cada uma dessas almas tem um completo conjunto de poderes e qualidades.
Entendimento intelectual, atributos emocionais, desejos e ânsias,
são expressos por estas almas em maneiras diferentes. Há
numerosos detalhes e combinações de qualidades, e para entender
corretamente a natureza do homem, estas coisas devem ser entendidas claramente.
Na segunda metade do capítulo Um, Rabi Shneur Zalman nos introduz
de maneira geral à alma animalesca, nefesh ha-behamit. Seu motivo
para começar esta análise com a nefesh ha'behamit é
que esta alma é a primeira a ser revelada no homem, como declara
o versículo: "Pois a inclinação do coração
do homem é o mal, desde sua juventude." No capítulo
Dois, o autor nos familiarizará com a natureza da Alma Divina (que
se torna revelada num estágio mais tardio, principalmente depois
que a criança chega à idade de bar/bat mitsvá).
Almas e inclinações
É importante enfatizar que até este ponto, estávamos
familiarizados com as fontes na Guemará e no Midrash que descrevem
as duas inclinações, o yetser hatov e o yetser hará.
A idéia de "almas" é algo novo. Superficialmente,
almas e inclinações poderiam parecer conceitos paralelos.
De fato, um exame mais detalhado mostrará grandes diferenças
entre elas. É explicado na Chassidut Chabad que enquanto "alma"
envolve os conceitos mais amplos de vida e vitalidade ou força
de vida, "inclinação" expressa apenas as tendências
ou impulsos na direção do bem e do mal. As emoções
que derivam do intelecto da alma animalesca são chamadas de yetser
hará, ao passo que as emoções derivadas do intelecto
da alma Divina são chamadas de yetser tov.
Rabi Shneur Zalman agora delineia algumas características fundamentais
da alma animalesca em todo judeu. Esta alma não está incluída
na categoria de santidade, mas ao contrário, origina-se na kelipá
(literalmente "invólucro", uma metáfora para aquelas
forças que ocultam a força de vida Divina encontrada em
toda a criação, como uma casca ou concha que oculta o fruto),
e a sitrá achra (literalmente, "o outro lado" –
a antítese da santidade e pureza). Esta alma animalesca é
revestida pelo sangue de um ser humano, dando vida ao corpo, como atesta
o versículo: "Pois a nefesh [i.e., a força de vida]
está no sangue." Obviamente, o conceito de nefesh também
implica qualidades espirituais da alma, mas para enfatizar sua proximidade
específica com a carne e com assuntos físicos, também
é chamada "a nefesh, alma, da carne". Desta alma derivam
as qualidades humanas naturais, e juntamente com elas, todas as más
características com as quais estamos familiarizados. Além
disso, "desta alma brota também os bons traços inerentes
ao caráter de todo judeu".
Não foi sem motivo que a "alma animalesca" recebeu este
nome. Ela se caracteriza pela vontade poderosa e forte paixão que
são típicas do reino animal. Apesar disso, estas características
não são necessariamente negativas. Embora sejam qualidades
naturalmente voltadas para coisas físicas e materiais, o homem
tem a capacidade de mudar sua direção, de guiá-las
no rumo positivo, e a usá-las para propósitos corretos,
como é explicado nos ensinamentos chassídicos. Este é
o desafio do homem.