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Recostando
confortavelmente em sua espreguiçadeira, David aconchega mais a
grossa jaqueta de inverno ao redor de seus ombros trêmulos, e com
os dentes batendo ao ritmo do inverno, aproxima seu rosto perigosamente
perto da tigela de sopa fervente, inalando seu rico aroma fumegante. Enquanto
o s'chach (o teto improvisado da sucá) farfalha com o vento gelado
de outubro e sua respiração paira em nuvens brancas antes
de ser dissipada por asas invisíveis, David pergunta-se qual é
a lição crucial que ele deve aprender desta moradia forçada
neste abrigo temporário. Qual a mensagem que Hashem está
nos transmitindo ao dizer-nos para deixar a segurança e proteção
de nosso lar e ir até a sucá, expondo-nos aos elementos
mais severos? Para entender isso, devemos primeiro discutir a origem deste
dia festivo e o significado de algumas de suas complexas e intricadas
leis.
O Talmud (Tratado Sukkah 11b) declara que as cabanas que habitamos no
dias de Sucot servem como um pungente lembrete de uma destas duas coisas
– as cabanas em que o povo judeu morava como uma nação
durante as caminhadas pelo deserto depois do Êxodo do Egito, ou
as Nuvens de Glória que Hashem nos forneceu durante nossa estadia
no deserto e que nos protegiam do tempo inclemente, de inimigos poderosos,
ou qualquer criatura peçonhenta que ameaçasse nos morder
ou picar.
Todos os momentos de nossa existência naquele deserto escaldante
foi vivido em estado de milagre. Nossa água era fornecida por uma
fonte móvel, o alimento vinha dos céus, nossas roupas jamais
se gastavam, e nossos mais poderosos inimigos eram esmagados sem esforço
perante nós. A mão de Hashem era uma força constante
e visível.
Mas logo, o povo judeu entraria em seu país, e a mão discernível
de Hashem e os milagres deslumbrantes terminariam por se tornar invisíveis
aos olhos comuns. Por esta razão, Hashem ordenou-nos deixar nossas
casas confortavelmente aquecidas e ficar sob o grosseiro s'chach, para
lembrar-nos de que ainda somos completamente confiantes na misericórdia
de D-us, assim como éramos no deserto. Apesar da aparente segurança
de nossas casas e nosso controle sobre nossa fortuna, estamos todos, de
certa forma, vivendo numa sucá. Somos protegidos apenas pela devoção
incessante e amorosa de Hashem, assim como os Filhos de Israel eram protegidos
pela presença constante das Nuvens de Glória.
O Talmud declara que, embora o teto da sucá deva ser feito de materiais
frágeis oriundos da terra, as paredes podem ser completamente fechadas
e feitas de qualquer substância. Rabi Samson Raphael Hirsch explica
que as paredes da sucá ilustram este conceito crucial – que
apesar de as paredes do rico possam ser feitas de metal, e a do pobre
de duas tábuas finas de madeira, em última análise
ambas confiam na mesma fonte de proteção – Hashem.
Quando a pessoa olha em torno para o mundo confortável e confiável
que criou para si mesma, fica tentada a duvidar da obra de Hashem em todos
os aspectos da existência, e atribui seus sucessos e fracassos a
suas próprias forças e habilidades, a forças naturais,
ou simplesmente à sorte. Através das mitsvot da Torá,
Hashem nos lembra que todas estas suposições são
falsas e que somente por Sua grande bondade nós possuímos
a fartura que nos rodeia.
O Sefer Akeidah nos ensina que a razão por que o s'chach deve fornecer
mais sombra que espaço livre é para exortar-nos a confiar
em Hashem – representado pelo s'chach – ao invés de
colocar nossa fé nas numerosas estrelas cujo brilho preenche os
minúsculos buracos e são uma suposta fonte de sorte. O Talmud
declara também que não podemos usar uma sucá que
foi erigida trinta dias antes do feriado, mas sim que devemos construir
uma nova sucá a cada ano. Rabeinu Bachya explica que isso nos lembra
que o mundo, representado pela sucá, não é simplesmente
governado por leis naturais, mas é criado novamente a cada momento,
sendo portanto novo e não para ser tomado como garantido.
Finalmente, muitos comentaristas perguntam por que o 15º dia de Tishrei
foi escolhido, de todos os dias do ano nos quais os Filhos de Israel vagaram
pelo deserto, para celebrar Sucot. O Rashbam explica que foi nesta época
do ano que todas as colheitas haviam justamente sido reunidas na terra
de Israel, e dentre as abundantes pilhas de cereal, o fazendeiro poderia
se envaidecer e dar-se um tapinha orgulhoso, com a certeza de que ele
tinha feito aparecer todo este grão com o suor de sua testa e a
força de suas mãos. Portanto, é exatamente neste
momento que ele deve entrar na sucá e lembrar-se que é somente
Hashem que concedeu-lhe esta bênção, seja através
da chuva ou da boa saúde, tudo amplamente fornecido por Hashem.
David recosta-se calmamente em sua fria cadeira de metal. Escuta agora
a voz desconhecida da sucá chamando-o melancolicamente e lembrando-o
de confiar em Hashem. Não foi somente por suas mãos que
veio a fartura, comunica o vento de Tishrei. Não é a força
imutável da natureza, o sussurro do s'chach recém-cortado.
Não são também as forças da sorte, adverte
sua superabundância de galhos de bambu. E embora estas vozes possam
ser difíceis de aceitar, também fornecem muito conforto
e alegria; não importa em que situação nos encontremos,
Hashem está constantemente a nosso lado, oculto na névoa,
protegendo-nos do mal e cobrindo-nos com Sua abundante bondade.
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