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Não é
interessante? Sempre que começamos a falar sobre Purim, lá
pela segunda ou terceira frase o estamos comparando com Chanucá.
E vice-versa. Purim e Chanucá, Chanucá versus Purim. Como
se para entender um deles fosse preciso entender também o outro.
De fato, os dois formam um par natural. São os membros mirins da
família de Festas Judaicas: Chanucá tem uns meros 2.140
anos, e Purim somente uns 200 anos mais velho, ao passo que as outras
Festas datam da época de Moshê, cerca de mil anos antes de
Purim (Rosh Hashaná pode ser rastreado ainda mais longe, até
o primeiro dia de vida de Adam). Purim e Chanucá são considerados
instituições rabínicas, ao passo que Pêssach,
Shavuot, Sucot, Rosh Hashaná e Yom Kipur são biblicamente
ordenados; também não são "dias de descanso"
como os outros Dias Festivos.
E há os contrastes entre eles, que os ajudam a defini-los face
a face. Os oito dias de Chanucá o tornam a Festa mais longa do
Calendário Judaico (O oitavo dia adicionado a Pêssach é
observado apenas fora da Terra Santa); Purim, com apenas um dia, é
o mais breve (uma distinção que partilha com Yom Kipur,
que segundo a tradição cabalista significa "um dia
como Purim" – mas este já é um outro assunto).
Chanucá celebra um evento sobrenatural, ao passo que o milagre
de Purim foi conseguido por meios naturais, até mundanos. Em Chanucá
a fé judaica estava sob ataque; em Purim nossa própria existência
foi ameaçada. Chanucá é assinalado com observâncias
"espirituais" (preces especiais, acendimentos das luzes); Purim
pelos festejos, bebidas, o envio de presentes de comida para os amigos
e dinheiro para os pobres. A história de Chanucá é
masculina, com seus guerreiros macabeus e seus sacerdotes oficiantes;
Purim tem uma heroína como figura principal e um "Rolo de
Ester" para fazer o relato.
Em outras palavras, Chanucá é azeite, Purim é o vinho.
O azeite, dizem os mestres chassídicos, representa o paradoxo da
espiritualidade. A natureza do azeite é tal que, quando entra em
contato com algo, satura-o por completo, embebendo e invadindo cada parte.
Porém o azeite também possui uma natureza oposta: quando
misturado a outro líquido permanece à parte, recusando-se
a se misturar. Assim é a natureza do espiritual: sublime, transcendente
e pura, mesmo assim permeia tudo, transformando-o em seu interior. Este
é o paradoxo de Chanucá: uma vitória militar que
é um triunfo espiritual; uma chama delicada, representando nossa
alma íntima, secreta, é colocada no batente ou na janela
– o limite que separa nosso eu privado de nosso eu público
– procurando iluminar a escuridão da rua.
Porém o vinho está além do paradoxo. O vinho não
tem um eu privado e um eu público – somente o eu. O vinho
não tem segredos; quando uma coisa é aquilo que é,
é a mesma olhando-se de dentro para fora e de fora para dentro.
Não que Purim não seja espiritual; é que em Purim
o espiritual é tão real e concreto quanto o material, e
o material tão elevado e sagrado quanto o espiritual. Não
que o feminino não seja complexo; é que sua complexidade
está naquilo que é, em vez de naquilo que faz, portanto
as complexidades não são complicadas e os paradoxos não
são misteriosos – são simplesmente a verdade.
Em Chanucá vacilamos entre duas fronteiras; em Purim não
existem fronteiras. Isso, obviamente, é algo perigoso – em
qualquer outra ocasião, o vinho é algo a ser saboreado somente
com moderação. Mas em Purim não há perigo.
É o único dia em que somos aquilo que somos, autênticos
e livres. Quando você é aquilo que é, não há
perigo de que seja aquilo que não é.
Feliz
Purim
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