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Baseado
nos Ensinamentos do Rebe
Houve certa vez um homem que tinha vinte e quatro mil discípulos.
Ele os ensinou a amar, mas o amor deles foi absoluto demais, verdadeiro
demais, para ser amoroso. Eles morreram, e sua morte abrangeu um período
de luto que obscurece nosso calendário até os dias de hoje.
Este homem tinha um discípulo que devotou toda sua vida –
literalmente cada minuto dela – à busca da verdade. Porém
sua verdade era verdadeira o suficiente para amar. Ele, também,
deixou este mundo, e o aniversário de seu falecimento é
celebrado como um dia de júbilo e festividade até hoje.
Esta, em poucas palavras, é a história de Lag BaOmer –
a história de Rabi Akiva e seu discípulo mais notável,
Rabi Shimon bar Yochai.
Uma Morte Celebrada
Dia 18 de Iyar é Lag BaOmer – O 33º dia da Contagem do Omer
que abrange as sete semanas de Pêssach a Shavuot. Duas ocasiões
festivas estão associadas com este dia. Durante o período
do Omer pranteamos a morte dos 24.000 alunos de Rabi Akiva que morreram
numa peste porque, conforme nos informa o Talmud, “Eles não
se conduziram com respeito uns pelos outros. Lag BaOmer é o dia
em que a peste terminou e a mortandade cessou. Lag BaOmer é também
o aniversário de falecimento do discípulo mais importante
de Rabi Akiva, Rabi Shimon bar Yochai. Antes de sua morte (muitos anos
depois, sem conexão com a peste), Rabi Shimon referiu-se ao dia
de sua morte como “o dia da minha felicidade” e instruiu seus
discípulos que deveria ser observado como um dia de celebração
festiva.
Por que o falecimento dos outros discípulos de Rabi Akiva é
pranteado como uma tragédia nacional, enquanto a morte de Rabi
Shimon bar Yochai é lembrada com celebração e júbilo?
Na verdade, o mesmo dia que celebra o fim da mortandade dos discípulos
de Rabi Akiva celebra a morte de seu discípulo mais notável.
Para desvendar o paradoxo de Lag BaOmer, devemos primeiro examinar a raiz
do desrespeito que ocasionou a peste entre os discípulos de Rabi
Akiva.
Rabi Akiva ensinou que “Amar teu próximo como a ti mesmo
é um princípio cardinal na Torá”; de fato,
este é o mais famoso de seus ensinamentos. Portanto, seria razoável
esperar que os discípulos de Rabi Akiva fossem os maiores exemplos
deste princípio. Como foi então que eles, dentre todas as
pessoas, fossem deficientes nessa área?
Porém a própria diligência deles em cumprir o preceito
“Ama teu próximo como a ti mesmo” foi seu erro. Nossos
Sábios disseram que “Assim como a face de cada pessoa difere
da face de seus companheiros, assim também a mente de cada pessoa
difere das mentes dos outros.” Quando os vinte e quatro mil discípulos
de Rabi Akiva estudaram os ensinamentos de seu mestre, o resultado foram
vinte e quatro mil nuances de entendimento, pois os mesmos conceitos foram
assimilados por vinte e quatro mil mentes – cada qual única
e distinta das outras 23.999. Se os alunos de Rabi Akiva tivessem se amado
menos, esta teria sido uma preocupação menor; mas porque
cada discípulo amou seus companheiros como amava a si mesmo, ele
se sentiu compelido a corrigir seu raciocínio e comportamento errôneos,
e esclarecê-los sobre o verdadeiro significado das palavras de seu
mestre. Pelo mesmo motivo, eles se viram incapazes de expressar um respeito
hipócrita pelas opiniões uns dos outros quando acreditavam
sinceramente que a compreensão dos outros era equivocada, mesmo
que em pequeno grau.
Quanto maior é a pessoa, mais elevados são os padrões
pelos quais é julgada; nas palavras de nossos Sábios: “Com
os justos, D'us é exato até ao ponto de um fio de cabelo.”
Assim, aquilo que para pessoas de nosso calibre seria considerado uma
falha pequena, sobre os discípulos de Rabi Akiva teve um efeito
devastador.
O Décimo Terceiro Ano
Houve porém um discípulo de Rabi Akiva que aprendeu a superar
os abismos do amor intransigente e verdade inflexível, como exemplificado
pelo seguinte incidente na vida de Rabi Shimon bar Yochai:
O Talmud relata que quando os governantes romanos da Terra Santa estabeleceram
um preço para as cabeças de Rabi Shimon e seu filho Rabi
Elazar, eles se esconderam numa gruta por doze anos. Durante este tempo,
passavam cada minuto do dia estudando Torá. Quando saíram
da caverna, ficaram chocados ao descobrir pessoas arando e semeando; como
pessoas podiam deixar de lado a vida eterna que é a Torá
e ocupar seus dias com a vida transitória das coisas materiais?
Tão intensa foi sua fúria perante tamanha tolice que tudo
aquilo que eles contemplavam com seu olhar ardente era tomado pelas chamas.
Uma voz vinda do céu proclamou: “Vocês saíram
para destruir Meu mundo? Voltem para sua gruta!” O décimo
terceiro ano de estudo de Rabi Shimon, embora aumentando seu conhecimento
e apreciação da verdade da Torá, também lhe
ensinou o valor dos esforços além do seu próprio.
A partir de então, onde quer que ele fosse, seu olhar curava em
vez de destruir.
Os 4.000 anos de história do estudo judaico conheceram muitos estudantes
de Torá notáveis e diligentes; porém nenhum exemplificou
a absoluta devoção à busca da verdade Divina ao ponto
mostrado por Rabi Shimon bar Yochai. Nos escritos de nossos Sábios,
seu exemplo é citado como o supremo caso de torato um’nato,
“aquele cujo estudo de Torá é sua única vocação.”
Certamente, então, o comprometimento de Rabi Shimon com a verdade
não foi menos absoluto que aquele dos outros discípulos
de Rabi Akiva. Porém sua verdade era suficientemente verdadeira
para amar. Em seu décimo terceiro ano na gruta, ele atingiu uma
dimensão da verdade Divina que tolera, na verdade abraça,
as muitas e diversas trilhas de conexão com D'us que o Criador
deu à uma humanidade cujas mentes, caracteres e temperamentos são
tão diversos quanto seu número. Em seu décimo terceiro
ano na gruta, Rabi Shimon atingiu um nível de verdade no qual ele
pôde se devotar totalmente à vida eterna que é a Torá,
e advogar tal devoção para todos os outros, e ao mesmo tempo
apreciar e respeitar o caminho daqueles que servem a D'us através
da vida temporal dos trabalhos materiais.
Portanto, o mesmo dia que comemora o fim da peste entre os discípulos
de Rabi Akiva também celebra o falecimento de Rabi Shimon bar Yochai.
Os mestres chassídicos explicam que o falecimento de um justo assinala
o ponto no qual “todos os seus atos, ensinamentos e obras”
atingem o pináculo da conquista e realização, e o
ponto de sua influência mais poderosa sobre as nossas vidas. E as
ações, ensinamentos e obras de Rabi Shimon bar Yochai são
a suprema retificação da trágica falha dos discípulos
de Rabi Akiva em atingir a correta síntese de amor e verdade que
tornaria o amor deles verdadeiro e sua verdade amorosa.
Como a Ti Mesmo
Como foi dito acima, é apenas entre homens do calibre dos discípulos
de Rabi Akiva que um erro desses poderia trazer resultados tão
devastadores. Porém nossos Sábios preferiram registrar essa
história para a posteridade e fixá-la em nossas vidas com
uma série de leis que governam nosso comportamento nas semanas
entre Pêssach e Shavuot todos os anos. Obviamente nós, também,
temos algo a aprender com aquilo que aconteceu com os discípulos
de Rabi Akiva.
A lição é dupla: devemos aprender com as suas virtudes
bem como a partir de seus erros. Devemos aprender a nos preocuparmos com
nosso próximo de forma a não sermos indulgentes com seus
erros e desculpar suas falhas. Essa poderia ser a maneira mais fácil
e mais socialmente aceitável de se comportar, mas, em vez de tolerância,
mostra uma indiferença para com seu bem-estar. Por outro lado,
jamais devemos permitir que nosso comprometimento com sua melhoria diminua
nosso respeito e estima para com ele, não importa o quanto ele
possa ser irresponsável e equivocado.
Se isto parece paradoxal, é. Porém a capacidade de abraçar
este paradoxo está no coração do mandamento da Torá
de “Ama teu próximo como a ti mesmo.” Pois no que diz
respeito a nós mesmos, é um paradoxo com o qual estamos
bem à vontade – toda pessoa psicologicamente saudável
ama a si mesma incondicionalmente e, ao mesmo tempo, luta incessantemente
para aperfeiçoar-se. Esse paradoxo devemos cultivar também
em nosso relacionamento com os outros; por um lado, jamais devemos comprometer
nossos esforços para melhorar nosso próximo por respeito
às suas opiniões e seus sentimentos; por outro lado, jamais
devemos permitir que esses esforços comprometam nosso amor e respeito
por ele.
Pois sucumbir a um ou outro seria deixar de amá-lo como amamos
a nós mesmos – um princípio que Rabi Akiva considerava
fundamental ao projeto de D'us para a vida e sobre o qual Hilel declarou:
“Esta é a Torá inteira; o resto é comentário.”
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