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O
local para oferecer condolências é em casa, durante os sete
dias especiais de luto chamados shivá.
Uma obrigação sagrada que recai sobre todo judeu é
confortar os enlutados, sejam ou não da família, amigos
chegados ou apenas conhecidos. No Judaísmo, exercer a compaixão
fazendo uma visita de condolências é uma mitsvá, considerada
por alguns dos nossos maiores eruditos como sendo biblicamente ordenada.
A Torá registra que D'us visitou Yitschac: "E foi depois da
morte de Avraham, que D'us abençoou Yitschac, seu filho" (Bereshit
25:11). Os Sábios deduzem deste versículo que o próprio
D'us, por assim dizer, estava confortando o enlutado Yitschac.
É dever do homem imitar a D'us: assim como D'us consola os enlutados,
o homem deve fazer o mesmo. Consolação é considerada
uma ação Divina – que todos os Filhos de Israel devem
realizar. Quando, após a destruição de Jerusalém
e a dizimação do povo judeu, Yeshayáhu proclamou
a mensagem de D'us: "Consolo a vós, consolo a vós,
Meu povo" (Yeshayáhu 40:1), isso indicou não apenas
uma recomendação vinda do Alto, mas uma ordem específica
obrigando o profeta a levar consolo ao seu povo.
O propósito fundamental da visita de condolências durante
a shivá é aliviar o enlutado do fardo intolerável
da intensa solidão. Em nenhuma outra hora o ser humano está
mais necessitado desse companheirismo.
Avelut significa afastamento, o retiro pessoal e físico do convívio
social e da preocupação com os outros. É uma perda
que só ele sofreu. Todas as tradições do luto expressam
esta difícil solidão em diversas maneiras, cobrindo o espectro
da vida social – desde o crescimento excessivo do cabelo em indiferença
ao costume social, até evitar os cumprimentos, a mínima
cortesia social.
Reconhecendo esse estado de espírito, o visitante vai à
casa enlutada, discretamente, para fazer companhia ao enlutado em sua
solidão, para sentar-se com ele, acompanhar seus pensamentos e
alongar-se sobre sua perda. O calor dessa presença humana é
inestimável. Praticada como a tradição prescreve,
a verdadeira consolação é demonstrar empatia. O efeito
da visita de muitos amigos e parentes, alguns há muito não
vistos, outros membros da comunidade que raramente prestaram alguma atenção
ao enlutado, diminui a solidão, o alívio do pesado fardo
de desespero interior, e a afirmação de que o mundo em gral
não é um lugar hostil e desagradável, mas caloroso
e amigável. É um chamado de braços abertos para o
enlutado retornar à sociedade. Confortar os enlutados, diz Maimônides,
é gemilut chassadim, um bondade genuína tanto aos mortos
quanto aos vivos.
O objetivo da visita de condolências não é convencer
o enlutado de qualquer coisa. Esta é a hora de acompanhá-lo
em seu próprio caminho, não para argumentação
ou debate. É um tempo para a contemplação da tragédia.
Embora o próprio enlutado possa querer discutir o assunto, não
é o objetivo principal desta visita aliviar seus temores para o
futuro, ou sua culpa pelo passado. Não é conveniente, dizem
os Sábios, (na verdade isso beira o sacrilégio), impor ao
enlutado a idéia da inevitabilidade da morte, como se duvidando
do propósito e justiça do decreto emitido por D'us, mas
mudaria se apenas Ele estivesse livre para fazê-lo. Não é
conveniente, talvez seja até inútil, assegurar ao enlutado
que outros sofreram tragédias semelhantes, ou ainda piores, como
se por direito ele tivesse de estar menos desesperado. "Poderia ter
sido pior". é um consolo vazio. Esta é uma hora de
subjetividade, para uma intensa avaliação pessoal da vida,
e os enlutados não deveriam ser privados dessa indulgência.
Alguns visitantes inoportunos dizem que "a vida deve continuar",
e que o enlutado deveria "ser grato por não ter ocorrido o
pior". São expressões bem-intencionadas, mas vazias
e às vezes desagradáveis.
A estratégia da verdadeira compaixão é presença
e silêncio, a eloqüência da proximidade humana, Palavras
tristes, murmuradas, são mais desajeitadas que o sussurro suave
expresso pelos olhos. O companheirismo demonstrado pela expressão
da face fala palavras que os antigos bardos não conseguiam dizer
com meras palavras, não importa quão lindas fossem. Preenche
a desesperada necessidade do enlutado tanto por companhia quanto pela
privacidade. Foi, portanto, um antigo costume, infelizmente perdido para
nossas gerações, os visitantes se sentarem sobre o chão
junto com o enlutado. Que magnífica expressão de compaixão!
O primeiro princípio de consolar os enlutados, encontrado nos principais
códigos da Lei Judaica, é que a pessoa deve permanecer em
silêncio e deixar o enlutado falar primeiro. Em muitas comunidades
judaicas de antigamente, os congregantes acompanhavam o enlutado quando
ele caminhava da sinagoga para casa no Shabat ou num feriado, e sentavam-se
com ele. Como é calorosa a mera presença física de
outros seres humanos! Como alivia a aguda dor da tragédia! O clássico
enlutado, Job, visitado por três amigos, sentou-se com eles por
sete dias e ninguém pronunciou uma palavra. Cohêlet sabiamente
declara que há "um tempo para ficar em silêncio e um
tempo para falar". O Midrash (Cohêlet Rabbah 3:5) registra
que a esposa de Rabi Mana faleceu. Seu colega, Rabi Abin, foi fazer uma
visita de condolências. Rabi Mana perguntou: "Há algumas
palavras de Torá que você gostaria de nos oferecer em nossa
hora de sofrimento?" Rabi Abin respondeu: "Nessas horas a Torá
se refugia no silêncio!"
É nesse espírito que Maimônides aconselha os visitantes
a não falarem muito abertamente pois, de alguma forma, as palavras
têm a tendência de criar um clima de frivolidade tão
contrário ao espírito de shivá. Na verdade, o Talmud
nota isso quando declara com muita percepção: "A verdadeira
recompensa chega àquele que fica silente na casa enlutada, e volúvel
no salão de casamento!"
É verdade, obviamente, que é muito difícil confortar
com calor, esperança e compaixão, quando sentado relativamente
em silêncio. Talvez seja este o motivo para a frase de consolo "Que
D'us te console entre os outros enlutados de Tsion e Jerusalém."
Pois somente D'us pode confortar realmente, assim como Ele consolou Yitschac
após a morte de Avraham, e como Ele tem confortado, no decorrer
dos tempos, os outros enlutados de Tsion após a trágica
destruição do antigo Templo, e os exilados, e aqueles que
sofreram em pogroms e cruzadas. Se o visitante sente-se pouco à
vontade na tensão do silêncio, ele pode conversar com o enlutado,
mas pouco e sabiamente.
Nichum Avelim
– a mitsvá de consolar o enlutado
Do livro “Os Últimos Momentos”
De Rabino Shamai Ende
A Mitsvá
1. Há uma mitsvá de ordem rabínica de consolar um
enlutado. Esta faz parte das leis de Guemilut chassadim que faz parte
da mitsvá da Torá de ‘amar o próximo’,
(nossos sábios nos ensinam que D’us foi o Primeiro a consolar
um enlutado, como consta no versículo (Bereshit 25:11): “..após
o falecimento de Avraham, D’us abençoou seu filho Yitschac”.)
O Talmud (Sotá 14) interpreta este versículo dizendo que
D’us veio consolá-lo.
2. É maior a mitsvá de visitar um enlutado do que visitar
um doente, pois este faz uma mitsvá com os vivos e os mortos, por
isto, se não tem condições de fazer os dois, deve
se dar preferência ao enlutado. Caso porém tenha condições
de fazer os dois, deve visitar primeiro o doente, pois isto irá
ajudar em sua recuperação e é considerado como se
desse a ele nova vida.
3. Esta mitsvá consiste em visitar os enlutados durante a semana
de shivá para consolá-los. Mesmo quem retorna várias
vezes à casa do enlutado, cumpre esta mitsvá. No entanto,
deve-se distribuir as visitas de forma que sempre tenha alguém
na casa do enlutado, e não que venham todos na mesma hora sendo
que a maioria do dia não vem ninguém.
4. Faz parte desta mitsvá prover a falta dos enlutados. Por exemplo,
se faleceu o chefe da família, ou seja, aquele que sustentava a
casa, é mitsvá coletar dinheiro para sustentar os órfãos
e a viúva.
5. Da mesma forma que consiste em uma mitsvá consolar o enlutado,
também é uma mitsvá do enlutado se consolar, pois
caso isto não ocorra, a mitsvá do consolo não foi
completa.
6. Os enlutados devem também consolar-se uns aos outros.
7. O correto é homens consolar homens enlutados, e mulheres as
mulheres. De preferência as mulheres devem sentar em outro ambiente
para que não haja mistura. Caso um homem deseje consolar uma mulher,
este deve ficar à porta e consolá-la.
8. Pode-se cumprir esta mitsvá também por telefone, por
carta ou por fax, se não há possibilidade de visitá-lo
pessoalmente.
9. Faz parte desta mitsvá completar o minyan nas orações
da casa do enlutado.
10. Não se deve visitar um enlutado que odeia o visitante, somente
se este pede licença antes de visitá-lo.
Quando cumprir esta mitsvá
11. A primeira vez que se consola um enlutado é ainda no cemitério
logo após o enterro.
12. Há pessoas que costumam não consolar o enlutado nos
primeiros três dias de luto. No entanto, pela lei é permitido
e muitos costumam fazê-lo, principalmente se o enlutado é
uma pessoa importante e tem muita gente para consolá-lo. Como também
os parentes próximos e amigos ou aqueles que não poderão
fazê-lo após o terceiro dia, ou aqueles que freqüentam
o minyan nos primeiros dias, podem consolá-los desde o inicio conforme
todos os costumes.
13. Tem costumes que evitam de consolar o enlutado de noite, porém
atualmente, o costume geral é consolá-lo também a
noite. No entanto deve-se tomar o cuidado de não vir visitar o
enlutado muito tarde para não atrapalhar seu descanso.
14. Se não for possível consolar nos dias de shivá,
pode consolar o enlutado após este período, mas dentro dos
shloshim. No caso de enlutados pelos pais, pode-se prestar consolo durante
os doze meses de luto.
15. Costuma-se evitar consolar um enlutado em shabat e Yom Tov.
Como cumprir esta mitsvá
16. A mitsvá de consolar um enlutado consiste em falar com ele
palavras de consolo e palavras agradáveis que façam ele
esquecer um pouco de seu sofrimento, e mude um pouco sua expressão
facial, e não apenas sentar em silêncio. Porém caso
o visitante que veio consolar falar apenas a frase comum de consolo ‘Hamacom...’
também cumpriu a mitsvá.
17. Quando se entra na casa do enlutado é proibido cumprimentá-lo,
mas é permitido apenas baixar a cabeça como saudação.
Como também o enlutado não costuma levantar-se em honra
de ninguém. É permitido ao enlutado agradecer a visita.
18. Os visitantes não devem iniciar a conversa deixando o enlutado
dar o inicio. Caso o enlutado não inicie a conversa por não
conhecer a lei, por vergonha, por respeito ou por sofrimento, os visitantes
podem iniciar a conversa. Como também pode se pedir a ele que comece
a falar.
19. Não se pode dizer ao enlutado “o que você podia
fazer”, pois parece que se pudesse ele faria algo contra a vontade
Divina. O correto é aceitar o decreto Divino com amor.
20. Quando notarem que o enlutado quer encerrar a conversa, os visitantes
devem se retirar. Deve-se constantemente prestar atenção
na face do enlutado, para perceber se este quer que a visita termine.
Normalmente, costuma-se que o enlutado baixe a cabeça quando quer
encerrar a conversa.
21. O costume geral é sentar do lado do enlutado por algum tempo
para falar com ele, e ao se levantar para ir embora fala-se a frase:
“Hamacom
yenachem etchem betoch
shaar avelê tsion viyerushalaim”.
Deve-se
explicar esta frase ao enlutado para que entenda o que estão falando.
Esta é a tradução em português:
“Que
o Onipresente console vocês
dentro dos enlutados de Tsiyon e Jerusalém”.
Pode-se
acrescentar outras bênçãos após esta frase,
como ‘boas noticias’; ‘somente alegrias’, etc.
Após esta bênção o enlutado responde ‘Amen’
.
22. Esta frase pode ser dita uma vez para todos os enlutados juntos, como
também, no caso de indisponibilidade, todos os visitantes podem
falar esta frase ao mesmo tempo. No entanto há aqueles que costumam
dizê-la para cada enlutado separadamente.
23. É proibido o enlutado bater papo a toa, para não demonstrar
que já se esqueceu do luto. Como também, os consoladores
não devem falar conversas vãs em demasia.
24. Os visitantes podem sentar numa cadeira na hora que trazem o consolo,
como podem também permanecer de pé. A principio o enlutado
deve sentar na hora do consolo, mas pela lei o enlutado pode estar de
pé quando o consolam, sendo proibido dizer-lhe ‘sente’
( Isto pode ter uma conotação negativa, como que estamos
lhe dizendo para que continue sentando por luto.) Mas podem dizer-lhe
‘não precisa ficar de pé por nossa causa’ ou
algo parecido.
25. Rezar na casa do enlutado, como orar pelo enlutado e sua família
fazem parte da mitsvá de consolá-lo.
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