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  Os Revolucionários
  Por Tzvi Freeman
 

Há muitas maneiras de mentir. Até a verdade pode mentir.

O que você ouviu falar sobre Chabad-Lubavitch e o Rebe? Que Chabad-Lubavitch é uma maravilhosa organização com uma estratégia eficaz de atingir judeus afastados do Judaísmo e devolvê-los à tradição? Que tem crescido fenomenalmente em poucas décadas até se tornar uma força onipresente no mundo judaico em muitas partes do mundo onde judaísmo era inexistente?
Que o Rebe praticamente inventou a divulgação judaica e foi a força maior por trás da miraculosa ressurreição do povo judeu depois do Holocausto?

Tudo verdade, e tudo muito bonito – como glacê sem o bolo, molho sem as batatas.
Se você deseja saber a verdade verdadeira sobre Chabad-Lubavitch e sobre o Rebe, fale com Alexander Nikolayevich.

No tempo de Nikolayevich, ser um chabadnik na Rússia equivalia a uma sentença de morte. As crianças eram ensinadas num porão diferentes todas as noites, não sabendo em qual noite a KGB irromperia pela porta e apanharia todo mundo. Construía-se um micvê (banho ritual), sabendo que iriam demoli-lo. A pessoa reavivava as chamas que pudesse do legado judaico, sabendo que um dia, eles chegariam para levá-la e interrogar, espancar, torturar, e depois enviar a um campo de trabalhos forçados na Sibéria para morrer de inanição, exaustão e maus tratos, deixando sua esposa destituída, e seus filhos órfãos indefesos.

O Rebe anterior, Yossef Yitschac Schneersohn (1880-1950) ele próprio foi preso sete vezes. Na sétima vez, havia um esquadrão armado esperando por ele. Por milagre, sua execução foi cancelada e sob pressão internacional ele terminou sendo libertado.
Alexander Nikolayevich conhecia muito bem aqueles chabadniks. Ele era o agente senior da KGB encarregado de sua perseguição.

Betzalel Schiff é um chabadnik israelense. Ele procurou Nikolayevich em busca de registros dos heróis e heroínas de Chabad-Lubavitch que Nikolayevich tinha atirado na prisão. Particularmente estavam nos registros de Mummeh Sarah ("Tia Sara") Katzenelenboingen, uma das agentes mais importantes da resistência Chabad-Lubavitch na época do pós-guerra.

A Glasnost chegara, o Partido Comunista se fora, mas Nikolayevich ainda estava à sua escrivaninha. Seu escritório ficava num daqueles edifícios altos que o antigo regime tinha construído para gelar os ossos de todo cidadão que ali entrasse.

Schiff tinha audácia. Ele entrou e entregou um presente a Nikolayevich: quatro grandes álbuns de fotos das famílias Chabad-Lubavitch fazendo trabalho de divulgação judaica ao redor do globo. Algumas páginas estavam marcadas; Schiff contou a ele o por quê: estas eram as fotos dos filhos e netos dos homens e mulheres que Nikolayevich tinha encarcerado.

Nikolayevich contemplou as imagens e balançou a cabeça, seu velho coração falseando uma batida. Voltou-se então ao secretário: "Olhe para o rosto deles!" exclamou. "Eles estão felizes! Veja os olhos deles! São fortes!"

E então sentou-se de volta, ponderando.
"Se pelo menos eu soubesse," Nikolayevich sacudiu novamente a cabeça. "Se pelo menos eu tivesse sabido que tipo de pessoa eu estava enfrentando!"

Inclinou-se para a frente em sua mesa, franziu o cenho cinzento e falou diretamente com Schiff. "Eu estive em sua sede, como sabe. E não apenas como turista. Eu tinha uma missão, Sem muita dificuldade, eu a encontrei – embora você a escondesse num porão."

É verdade. O número 770 na Eastern Parkway no Brooklyn, NY, é o endereço da sede mundial de Chabad-Lubavitch. Chegando da rua, desça as escadas e chegará a um salão que parece alguma coisa entre uma estação de trens lotada e um depósito. Um mar turbulento de homens barbudos formam grupos grandes e pequenos para a prece, estudo, canções e discussão acalorada.

Bancos duros de madeira e mesas são a única mobília e dezenas de milhares de livros estão espalhados por toda parte. Acredite ou não, esta é a sinagoga principal. E no andar de cima não é muito diferente.

"Então por que você acha que Schneerson tem sua sinagoga num porão?" perguntou o velho espião, estreitando os olhos enrugados. "Os Schneerson não têm dinheiro?"

Nikolayevich continuou. "Estive dentro da sinagoga. Havia muita gente, estava muito lotada. Mas estamos nos Estados Unidos, pensei. Onde estão as cadeiras estofadas? Cadê os luxuosos lustres de cristal? Os tapetes felpudos? Em lugar algum! É um porão e se parece com um porão!
"Vi os chassidim sentados nos bancos duros de madeira e comendo em mesas de madeira sem sequer uma toalha de mesa! E o que eles comem? Atum e pão, com vodca! Eu pensei: 'É isso que você tem para comer nos Estados Unidos?' Por quê? Por que o Schneerson faz os seus chassidim viverem dessa maneira?

"Foi então que confirmei minha suspeita de muitos anos. Percebi aquilo que eu deveria ter sabido sempre."
Nikolayevich inclinou-se novamente. "Vocês não são apenas mais outra seita religiosa. Vocês são revolucionários. São partisans. É assim que vocês operam: em pequenos grupos, adotando ação súbita e imprevisível, com fortes vínculos de fraternidade entre vocês, com devoção completa ao seu líder e à sua causa. Partisans.

"Sabemos sobre o seu primeiro líder, há sete gerações, ele também esteva aqui na prisão do Czar. Ele, também, foi um revolucionário, Duzentos anos atrás. Sete gerações! Vocês são sete gerações de revolucionários!

"Conheço também a sua história antes dessa. Como vocês começaram? Como escravos rebelando-se contra seus amos no Egito! E todo ano, vocês comem o pão duro e achatado que os escravos rebeldes comem, para lembrar que é isso que vocês realmente são, que são os rebeldes.
"E é por isso que o seu Rebe deseja que vocês rezem num porão, assim como os rebeldes partisans vivem, comendo a comida que os partisans comem, sentados em duros bancos de madeira, embora vivam no país mais rico do mundo. Porque Schneersohn deseja que sempre se lembrem: Vocês não são burgueses americanos! São revolucionários! Vocês são partisans!"

Não, nem mesmo Alexander Nikolayevich entende por completo. Por que ainda somos partisans quando vivemos livremente em todas as partes do mundo? Chabad está calcificado num exemplo anacrônico de desafio? Qual a revolução que estamos lutando? Onde está o opressor?
Mas pelo menos ele tem uma pista: começamos como revolucionários. É assim que os judeus realmente são.

Como Avraham se tornou o pai de todos nós? Como um adolescente recalcitrante esmagando os ídolos na casa de seu pai. Moshê matou um feitor e liderou uma revolta de escravos. Os profetas pregaram a paz mundial e a reforma social ao risco de suas vidas, quando o perverso despotismo e ditaduras eram a norma. Os Macabeus lutaram no primeiro conflito da história pela liberdade religiosa. Akiva liderou uma revolta contra o governo romano e a aristocracia.

Toda idéia radical que se conhece transformou a sociedade humana – a doutrina da dignidade humana inata, da justiça social, propósito, progresso, paz mundial, um D'us que Se preocupa com Seu mundo e escuta o grito dos pobres e oprimidos – não se rastreia isso até os gregos, persas ou aos chineses, mas aos judeus e somente aos judeus. À visão de Avraham, de que o mundo não é da maneira que deve ser e à voz no Sinai que nos disse como endireitá-lo.

O que aconteceu?
Passamos dois mil anos como aves fazendo ninhos na boca de leões. Quando a reforma varreu a Europa e o leão começou a imitar nossas maneiras, a liderança judaica teve uma opcão: começar a aceitar a extinção ou voltar-se para dentro, como uma tartaruga escapa em sua concha. A missão de reformar a humanidade voltou-se para a preservação da tradição. Onde certa vez fomos impelidos por uma visão profética do mundo e uma era de sabedoria e dignidade humana, agora simplesmente ansiamos por um alívio da opressão, como um homem aflito rezando para sua dor de cabeça ir embora.

Portanto, quando o mundo finalmente parecia estar maduro para aceitar aquela visão, os únicos judeus a agarrarem seus chifres foram aqueles já afastados do poder e tradição da Torá. Com raras exceções – como o Rebe.

Chabad-Lubavitch não é apenas para conservar as tradições, não somente pela continuidade judaica, não apenas pelo passado. Chabad-Lubavitch é, acima de tudo, sobre uma visão mística do futuro – e um plano místico para atingir aquele futuro. O passado é importante apenas como uma chave para o futuro. Chabad é a visão de Avraham viva hoje; o Rebe era Moshê cumprindo sua parte num teatro moderno e global.

Agora você pode entender porque o Rebe encontrou tanta resistência quando falou sobre a Era Messiânica que estava para chegar. Os críticos eram aqueles para quem o Judaísmo é sobre tradição, sobre conservação de nosso legado, porque, afinal, fizemos isso durante tanto tempo. Quando um líder judeu se esforça para redespertar a ânsia antiga do judeu por um futuro ideal e alega que este está logo ali na esquina, isso não soa ortodoxo para eles.
Nesse sentido, o Rebe nunca foi "ortodoxo". O Rebe foi um revolucionário, um líder dos partisans.

       
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