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  Planejando o Orçamento
  Por Leah Fine  
 

Numa aula do Ensino Médio, minha irmã recebeu uma tarefa: Com U$ 90.000,00 por ano e quatro filhos, ela deveria criar um orçamento que funcionasse. Após lutar com a incumbência durante algum tempo, minha irmã pediu ajuda à minha mãe.

“Mãe”, disse ela, “cortei tudo que poderia ser cortado, e ainda não consigo equilibrar o orçamento!” Em última instância, ela se livrou do carro fictício, treinou seu filho fictício a se livrar das fraldas fictícias, e abriu mão do celular fictício. Finalmente, o orçamento ficou equilibrado.

Quando eu estava na escola, também estudei Economia, durante dois semestres. Aprendi sobre macro e micro economias, sobre taxas de juros, Banco Central e “otras cositas más”. Tirava excelentes notas no curso e minha professora achava que eu tinha futuro no campo da economia. Porém ninguém jamais me falou sobre equilibrar orçamentos.

A vida seguiu em frente, e todas estas questões teóricas sobre orçamentos se tornaram reais. Como então as pessoas conseguem? perguntei a mim mesma. Será que conseguem? As questões me incomodaram durante muito tempo. Como eu gostaria de poder dar uma olhada no talão de cheques e no livro de contas de alguém! Não para sentir inveja, apenas para aprender o mecanismo, saber como a coisa toda funciona.

À medida que ficava mais velha e conversava com mais pessoas, esperava aprender o segredo do sucesso econômico. Finalmente, descobri a verdade: não há segredos. Apesar disso, um olhar para a realidade nua e crua me foi benéfico, como espero que seja para você.

Como eles conseguem?

Talvez a primeira pergunta que deva ser feita não é como outras famílias conseguem; a questão deveria ser: elas conseguem?

Sim, existem famílias que são fabulosamente ricas, tendo se destacado no mundo empresarial. Há outras cujos empregos cobrem bem suas despesas; e no mundo de hoje, um emprego de fato precisa ser lucrativo para fazer isto. Porém e quanto àqueles que não se enquadram nessas categorias? Famílias com rendas mais modestas, que mesmo assim parecem capazes de comprar imóveis, carros último tipo, e outras armadilhas da vida luxuosa?

Por qualquer ângulo que se olhe, é impossível ter um estilo de vida de moderado a luxuoso sem uma renda compatível. Um olhar por trás das portas fechadas pode revelar uma dessas possibilidades: as famílias estão recebendo ajuda de outros membros da família ou da comunidade; sobrevivem graças a diversos programas de ajuda do governo; ou estão profundamente endividadas.

Desde tempos imemoriais, sempre existiram os ricos, os pobres e a classe média. O que pode ser diferente nos tempos de hoje é a grande quantidade de dinheiro que as famílias precisam, apenas para seguir vivendo. Uma família religiosa pode ser considerada classe média alta ou até rica pelos padrões não-judaicos, e mesmo assim estar lutando para colocar comida sobre a mesa. E isso sem contar as despesas com bar mitsvot, seminários e casamentos para os filhos.

A tensão é enorme, para onde quer que você se volte. Talvez o aspecto mais difícil seja o medo do impacto sobre os filhos. Se eu não comprar uma mochila da Hello Kitty, não pagar férias nas montanhas, um dote generoso, pensamos, como ela conseguirá fazer amigos no primário/passar pela privação de um verão na cidade/encontrar um bom rapaz para se casar?

Vendo-se sem opção, as famílias podem entrar no abismo das dívidas, empréstimos e cartões de crédito, gemach, ou contra a liquidez de suas casas. Quando usadas de maneira inteligente, essas opções podem ser as unicas possibilidades de sobrevivência; quando mal usadas ou abusadas, podem levar a família à completa ruína financeira.

Planejar o orçamento dentro do próprio estilo de vida
Presumindo que você não entrou em dívidas chocantes, e não está vivendo acima dos próprios meios, o que faz quando simplesmente não consegue fazer o dinheiro durar até o fim do mês? Ou quando a conta bancária chega a zero todo mês, e a família tem a eterna sensação de estar vivendo no limite?

Se o déficit é relativamente pequeno, a solução pode ser criar um plano viável de orçamento.

“Fazer o orçamento é na verdade apenas uma questão de sentar-se e olhar no espelho financeiro,” explica Avraham Ostreicher de Seviços Financeiros em Lakewood. “Itens desnecessários têm o hábito de se tornarem essenciais sem que você perceba.”

Conselhos simples logo no início. No entanto, a lista de itens que podem ser considerados “desnecessários” é extremamente ampla. É muito fácil olhar sobre o ombro para a sociedade de outrem e rotular seus gastos como excessivos, materialistas e repletos de ostentação. No entanto, cada sociedade tem sua gama de estilos de vida. Para qualquer grupo que se olhe, sempre haverá “os mais ricos” e os “mais pobres”. Em toda sociedade, as pessoas têm conflitos com compras para o ego e estilos de vida para afagar o ego.

Em uma sociedade, seria considerado “normal” para uma família com sete pessoas morar num apartamento de dois quartos, “ostentação” para eles morar num apartamento com cinco dormitórios, e “pobre” para eles morar num apartamento com um só quarto. Em outra sociedade, uma família de sete membros consideraria “normal” morar numa casa com cinco quartos, “ostentação” morar numa casa com dez dormitórios e “pobre” morar num apartamento com três quartos. Na verdade, podemos todos ser considerados ostentosos por possuir artigos de luxo como telefone, eletricidade e água encanada’ porém quantas pessoas atualmente são capazes de abrir mão da máquina de lavar roupas?

O planejamento precisa ser feito dentro do âmbito da realidade, cada pessoa segundo suas necessidades e de acordo com a sociedade onde vive.

Eli Pollock é um conselheiro em Baltimore que ajuda famílias frum a planejar seus orçamentos. Quando o Sr. Pollock se encontra com um cliente para ajudá-lo a planejar seu orçamento, ele começa relacionando a renda e as despesas fixas. Essas incluem o pagamento da casa, contas como luz, telefone, despesas com o carro, plano de saúde, empréstimos e quaisquer outras despesas fixas. Depois que isso tudo foi relacionado, fica aparente o quanto sobra para despesas envolvendo comida, roupas e lazer.

Um engano comum a muitas pessoas é “fazer o orçamento de trás para diante”: primeiro gastam o dinheiro nas despessa móveis, ficando então sem dinheiro para as despesas fixas como o pagamento da casa. Apesar disso, você não pode planejar o orçamento numa maneira que o deixe de espírito alquebrado,” explica o Sr. Pollock. “Você não precisa estar por um fio, mas também não precisa vestir roupas que herdou da sua avó.”

Avraham Ostreicher relata ter conversado com um homem que tinha uma renda razoável, mas não conseguia economizar. Após revisar cada gasto no talão de cheques do homem, ficou óbvio que havia gastos exorbitantes em roupas para as crianças.

“Que tipo de roupas vocês compram para os seus filhos?” perguntou Ostreicher.

“Não sei,” respondeu o homem. “É minha mulher quem compra.” Ao perguntar, souberam que a jovem costumava comprar doze roupas para cada criança a cada estação, e cada roupa custava acima de cem dólares.

“Eu não diria a uma mulher como esta para começar a comprar em liquidações de roupas usadas,” relata Ostreicher. “Seria muito drástico para alguém acostumado a este estilo de vida. Porém sugeri que em vez de doze roupas, ela passasse a comprar dez.”

Por outro lado, para alguém acostumado a comprar pechinchas em liquidações, ou até artigos usados, esta pode ser uma solução. Planejar o orçamento é na verdade olhar no espelho, mas não apenas para as finanças; o planejamento financeiro corta até o âmago da pessoa, e a dispõe a gastar menos para ter um bem maior.

Cortando o orçamento – realisticamente

Num mundo realista, que opções existem para planejar o orçamento? A lista, uma vez que se faça uma pausa para pensar a respeito, é longa.

“Sim, você precisa comer,” diz Ostreicher. “Mas e todas aquelas iguarias que as pessoas compram e não comem e terminam sendo jogadas no lixo, semana após semana? E você precisa comprar um presente tão caro para a festa de seu amigo, ou pode pesquisar nas lojas e cortar seus gastos em um terço? E todos aqueles livros e publicações que as pessoas compram, mas não conseguem ler?

“Não tento fazer com que as pessoas mudem completamente seu estilo de vida,” continua Ostreicher. “Porém tento fazer com que prestem atenção aos gastos desnecessários dentro do seu estilo de vida. Praticando algumas restrições, elas terminam por ficar mais saudáveis, financeiramente.

Eli Pollock recomenda alguns livros populares para auxiliar no orçamento doméstico, para aqueles interessados em explorar todo o conjunto de medidas que podem ajudar no planejamento dos gastos.

“Tente durante um mês, mesmo que pareça um tanto drástico,” diz Pollock aos seus clientes. “Quando as pessoas me procuram com problemas financeiros, parte da solução é reduzir a compra de comida de conveniência e lanches rápidos.. Às vezes, deve-se aprender todo um conjunto de maneiras de comprar.”

Sim, alguns protestam que estas medidas vão além do reino da normalidade. Por outro lado, qual a Halachá que declara que o desjejum deve consistir de cereal? Algumas mães podem decidir que as economias simplesmente não valem a pena o esforço. Outras podem achar que vale a pena se isso permitir que elas sejam financeiramente independentes, ou que fiquem em casa com os filhos.

Pollock recomenda dar uma pequena recompensa a si mesmo pelo cuidado com os gastos. “Se você foi cuidadoso e conseguiu economizar 10 dolares por semana durante os últimos cinco anos, parabéns! Você merece usar aquele dinheiro numa viagem para Israel, ou algo mais que sempre desejou. Enfatizo sempre que as pessoas devem ter metas pelas quais trabalhar e se esforçar.”

Qualquer que seja a decisão para as suas circunstâncias pessoais, a noção de planejar o orçamnto não pode ser deixada de lado. Até os multimilionários devem praticar alguma forma de restrição: ninguém tem recursos ilimitados.

E se isso não der certo…
“Quando um casal com renda de $150.000 por ano me procura com problemas financeiros, isso é muito menos frustrante: tenho algo para trabalhar,” diz Pollock. “Sei que vou conseguir colocá-los de novo na linha: um déficit de $10.000 pode definitivamente ser coberto cortando despesas e fazendo planejamento. Mas e quando a família ganha $50.000 por ano, estão numa crise total. Quanto mais eles podem cortar?”

Estas famílias provavelmente estão raspando e economizando de todas as maneiras possíveis. Até o melhor planejador financeiro não consegue criar renda a partir do nada. Quando uma família chega ao ponto em que a lacuna entre a renda e as despesas chega a dezenas de milhares de dólares, [no nosso caso, reais] planejar o orçamento não é a única resposta.

Quais são as possibilidades? Os pais talvez tenham de encontrar empregos adicionais. A família pode ter de considerar uma mudança de moradia. Algumas talvez tenham de recorrer a vendas das propriedades ou bens. E outras talvez tenham de receber fundos de tsedacá se não há pessoas na família que possam ajudar. De uma maneira ou de outra, a lacuna precisa ser preenchida.

Uma característica especialmente difícil do sistema americano é que, uma vez que a família esteja acima da linha da pobreza, tem muita probabilidade de ser atirada numa crise imediata. Embora isso pareça um paradoxo, considere os fatos: famílias cuja renda cai abaixo de um certo nível são geralmente elegíveis para seguro médico subsidiado, auxílio moradia e isenção de impostos, além de desconto nas matrículas. Quando a família começa a se sair razoavelmente bem, é jogada num festival de despesas. De repente, precisam pagar seguro saúde integral, aluguel ou hipoteca, matrículas muito mais elevadas e impostos.

Dessa forma, o fenômeno de médicos, advogados e profissionais liberais em dificuldades se tornou muito mais comum. Empresários podem ser atingidos por problemas ainda maiores; devido à natureza imprevisível do mundo comercial. Um negócio que deu errado pode transformar pessoas ricas em pessoas com dificuldades da noite para o dia.

Curvas na Estrada

Com o mundo na velocidade imprevisível em que gira hoje, é duplamente importante olhar para a frente e planejar. Como diz o slogan de Ostreicher: “As pessoas não planejam falhar; elas falham em planejar.”

“Assim como você olha para as curvas na estrada quando dirige,” diz Ostreicher, “precisa estar preparado para fazer as curvas quando elas aparecem no âmbito financeiro. Há determinadas épocas do ano que geram despesas maiores. Sucot, Pêssach, casamentos e colônias de férias… Você precisa estar preparado. Se pretende gastar muito em presentes de Chanucá, a hora de começar a economizar para isso é entre Sucot e Chanucá. Se está planejando ir para uma colônia de férias ou enviar as crianças para acampamentos neste verão, deve começar a guardar $1000 por mês o ano inteiro, para que não seja surpreendido por uma conta de $10.000 em junho. Um pouco de planejamento leva você longe, muito longe. Planejar o orçamento não é uma ciência sideral: muitas vezes, o bom senso é que está sendo negligenciado.”

Dentre as necessidades, Ostreicher sente que é importante as famílias terem um fundo para emergências, para um dia de chuva. O fundo deve incluir o suficiente para manter a família por um ou dois meses, “Al kol hatová sheyavo

- para tudo de bom que pode acontecer.” Deveria ser apenas para simchás! Você esperava ter um filho, e nascem gêmeos’ agora precisam de dois carrinhos, dois berços, duas cadeirinhas para o carro. A geladeira quebra; o carro está com problemas. Seja o que for, o fundo de emergência precisa ser uma prioridade em seu orçamento.”

Após levar em conta todas as eventualidades e despesas anuais, o orçamento teórico da minha irmã no Ensino Médio ficou equilibrado. No entanto, antes de deixar a sala de aula, e antes de encerrar este artigo, devemos nos lembrar das lições que foram ensinadas na mesma sala de aula durante as sessões limudei kodesh: Parnassá (sustento) com todas as suas dificuldades e bênçãos incipientes, é na verdade uma questão de siyata d’Shmaya. Como explica o Chovos HaLevavos em Shaaar HaBitachon, nosso trabalho é fazer nosso hishtadlus, e, ao mesmo tempo, saber que nossas ações não têm efeito na quantidade definitiva de sustento que nos será proporcionado. Precisamos rezar: precisamos olhar para a sabedoria da Torá por orientação. Esteja ou não a pessoa se saindo bem, a quantidade real de sustento que cada pessoa recebe é resultado direto de um decreto Celestial. O ponto principal, de exatamente quem irá receber e quando, é decidido em Rosh Hashaná, a ser recebido por nós da Mão do Todo Poderoso.


Uma Sugestão

Com tudo que se fala atualmente sobre as dificuldades de se sair bem financeiramente, o que pode ser feito sobre isto? No decorrer de sua provisão de tsedacá a famílias necessitadas, Rabino Schochett tem notado grande quantidade de maneiras que as famílias usam para lidar com seus problemas financeiros.

Baseado nessa experiência com famílias com problemas de orçamento, Rabino Schochett acha que deve-se dar alguns passos para prevenir esse tipo de situação. Talvez conselheiros e especialistas em finanças possam dar cursos ou seminários sobre orçamento e responsabilidade financeira para jovens casais, muito antes que eles caiam em dificuldades financeiras reais. Um olhar para a realidade das necessidades das famílias frum e uma diminuição nos números exigidos apenas para se manter pode ajudar a abrir os olhos.

Na opinião de Rabino Schochett, um pouco de conhecimento prévio pode a longo prazo ajudar pelo menos algumas famílias a se livrarem das dificuldades financeiras.
 
 
       
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