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  Um Mundo de Amor
   
 

Um dos supremos objetivos do ser humano é a imitação de D'us. Fazemos isso em cada boa ação, copiando a própria criação do bem por parte de D’us. A maneira mais direta de podermos fazer isso, no entanto, é em nossas ações para com o próximo.

O propósito de D'us na Criação poderia ter sido cumprido com a criação de uma única criatura para aceitar Seu bem. Tal criatura, no entanto, jamais poderia realmente assemelhar-se a D'us. D'us em Si é quem concede o bem, e se apenas uma criatura existisse, então a quem ela faria o bem? Certamente não para D'us, pois D'us não tem necessidades. É por este motivo que D'us criou o mundo como uma arena para uma espécie inteira de homem.

Quando D'us criou o primeiro ser humano, Adam era um. D'us então disse (Bereshit 2:18): "Não é bom que o homem fique sozinho; farei para ele uma companheira." Enquanto o homem estivesse sozinho, não poderia ser realmente bom. Pois ser bom é imitar D'us, Aquele que concede o bem. Um homem sozinho não teria ninguém para quem pudesse ser bom, e portanto, não poderia ser chamado de "bom". Isso foi o que D'us quis dizer quando declarou: "Não é bom que o homem fique sozinho." D'us então criou a mulher como a outra parte do homem.

O homem também imita D'us, tornando-se Seu parceiro na procriação. Assim como D'us é um Criador, também o homem torna-se um criador de vida. Nossos sábios, portanto, ensinam que há três parceiros na procriação de um filho: o pai, a mãe e D'us. O ato sexual é o veículo por meio do qual o homem exibe este aspecto de sua parceria com D'us, e este é um dos motivos pelos quais sua perversão é classificada entre o pior dos pecados (Derech Mitzvotecha por Rabi Mendel de Lubavitch).

Num sentido espiritual, o bem que o homem pratica também beneficia todos os outros seres humanos. Assim, ao fazer o bem, a pessoa está, mesmo que indiretamente, beneficiando seu próximo, mesmo no caso de leis rituais que não o fazem diretamente. Nossos sábios ensinam que todo judeu é moralmente responsável por todos os outros. O autor de Reshit Chochmá explica que todas as almas são atadas juntas, como se fosse com corda, e o movimento de uma se reflete em todas as outras. Isso é o que a Torá quer dizer ao afirmar (Bamidbar 16:22): "Um homem peca, e a fúria é dirigida contra toda a comunidade."

O Midrash nos fornece um excelente exemplo ilustrando este ponto: algumas pessoas estão sentadas num barquinho. De repente, um homem começa a fazer um buraco no barco, sob seu assento. Quando as pessoas reclamam, ele retruca: "Por que estão reclamando? Afinal, estou fazendo o buraco sob meu próprio banco." Finalmente, um homem sábio o adverte: "Estamos todos no mesmo barco. O buraco pode estar debaixo de seu assento, mas a água que entra fará o barco afundar com todos nós dentro."

Num sentido espiritual, estamos todos no mesmo barco. Cada coisa boa que fazemos afeta toda a humanidade. Em toda boa ação que praticamos, imitamos D'us, no sentido de que trazemos o bem a toda a humanidade. Esta, de fato, é uma razão pela qual D'us nos colocou a todos no mesmo barco espiritual.

Obviamente, fazemos isso mais diretamente quando fazemos o bem a outro ser humano. Este é o arquétipo de todo o bem. Não há maneira mais próxima de imitar D'us que ao fazer o bem para os outros.

O Talmud afirma que nós nos atamos a D'us ao imitar Suas maneiras. Mas de que maneiras o Talmud diz que imitamos D'us? Observe cuidadosamente as palavras:

Assim como D'us veste os desnudos, você deve fazê-lo. Assim como D'us visita os doentes, você deve fazer o mesmo. Assim como D'us conforta os destituídos, faça-o você também.


"Amarás o teu próximo como a ti mesmo" é a regra principal da Torá.

Em outra parte, o Talmud diz que devemos também imitar D'us em Sua misericórdia e compaixão. A lição geral é que mais nos assemelhamos a D'us em nosso relacionamento com o próximo.
Este conceito é mais bem exemplificado pela famosa história de Hilel. O Talmud nos relata que um não-judeu foi certa vez até Hilel e disse: "Desejo converter-me ao Judaísmo, mas somente se você me ensinar a Torá inteira enquanto fico num pé só."

Hilel replicou: "O que é odioso para você, não o faça ao próximo. Este é o âmago do Judaísmo. O resto é apenas comentário."
Muitos dos comentaristas consideram esta história intrigante. Os mandamentos que tratam de nosso relacionamento com o próximo certamente são muito importantes. Porém existem também muitos outros mandamentos importantes que aparentemente nada tem a ver com outras pessoas. Como pôde Hilel descartá-los como mero comentário?

O que Hilel estava nos ensinando, no entanto, foi que a principal razão para todos os mandamentos é a imitação de D'us, e que isso é exemplificado por nossas relações com os outros seres humanos. Devemos tratar nosso semelhante assim como D'us nos trata. Ao fazê-lo, cumprimos Seu propósito na Criação. Esta imitação de D'us é o supremo propósito de todos os mandamentos.

Este é também o significado daquilo que D'us disse a Seu profeta Yirmiyáhu (22:16): "Ele julgou a causa dos pobres e necessitados, e foi bem. Isso não é para Me conhecer?" Como foi discutido anteriormente, podemos apenas conhecer D'us ao nos aproximar d'Ele e imitando-O. D'us está nos dizendo que a principal maneira pela qual o conhecemos é imitando-O ao fazer o bem aos outros.

Há um mandamento na Torá (Vayicrá 19:18): "Amarás o teu próximo como a ti mesmo." Um de nossos líderes mais notáveis, Rabi Akiva, declarou: "Este mandamento é o cerne da Torá." Rabi Akiva está nos ensinando a mesma lição de Hilel. Imitamos o amor de D'us pelo mundo através de nosso amor ao nosso semelhante. Desta maneira, nos aproximamos de D'us e cumprimos Seu propósito na Criação.


Num sentido espiritual, estamos todos no mesmo barco. Cada coisa boa que fazemos afeta toda a humanidade.

Num sentido mais profundo, o conceito de amar é o arquétipo da proximidade espiritual. Onde existe um vínculo de amor entre duas pessoas, elas estão próximas – embora possam estar separadas por vastas distâncias. Por outro lado, pessoas que se odeiam estão separadas, mesmo quando se sentam uma ao lado da outra. Amor e ódio existem numa dimensão espiritual, em vez de numa dimensão física. O amor entre duas pessoas implica em harmonia e complementação entre elas. É esta harmonia que as aproxima, independentemente da distância física. Ao obedecer os mandamentos de D'us, procuramos trazer harmonia e proximidade semelhantes entre nós e D'us. "Amarás o teu próximo como a ti mesmo" é portanto a regra principal da Torá. Não somente ela nos leva a uma proximidade com D'us, como também nos ensina o significado dessa proximidade.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, podemos entender o que nossos Sábios queriam dizer quando nos ensinaram: "Aquele que se nega a praticar a bondade (Gemilut Chassadim) é como aquele que nega o princípio mais fundamental (o Próprio D'us).

D'us é o supremo doador da bondade, e quem se afasta destes atos, coloca-se distante de D'us. D'us é o supremo fazedor do bem, e este homem se nega a fazer o bem. Portanto, diz-se que ele é alguém que se divorcia de D'us.

Hashem é a fonte de toda a vida, e portanto, quanto mais alguém se assemelha a Ele, mais partilha da vida. Aquele que se apega a D'us é considerado como realmente vivo, como diz a Torá (Devarim 4:4): "Vocês que se apegaram a D'us estão todos vivos hoje." Assim, vemos (Mishlê 10:2): "A caridade salva da morte." Quando alguém doa, assemelha-se ao Criador, a fonte de toda a vida.


Este artigo foi escrito pelo Rabino Aryeh Kaplan e publicado no site: www.chabad.org

Rabi Aryeh Kaplan (1934-1983) escreveu quase 50 livros, sendo celebrado por sua erudição, integridade e clareza. É mais famoso por ser o autor de Torá Viva, uma tradução revolucionária com comentários dos Cinco Livros de Moshê.
       
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