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Relacionamentos
familiares para um báal teshuvá são um assunto perturbador
e por vezes doloroso.
"Que tipo de D’us não gostaria que um filho estivesse
com a mãe em Rosh Hashaná?" perguntou minha mãe
exasperada quando eu disse que não poderíamos dirigir num
feriado judaico.
"Durante trinta e seis anos você não se importou se
era ou não Rosh Hashaná. Agora você se importa, mas
não pode trazer seus filhos para ficar com a avó?"
Eu já adivinhara que teria problemas.
"Estou contente por que você finalmente decidiu ser judeu"
– continuou ela. "Mas precisa ser tão religioso que
nem pode mais comer na casa de sua mãe? É isso que D’us
deseja?"
Queixei-me a Rabi Samuels, o rabino de Milwaukee que me trouxe a essa
conjuntura dezessete anos atrás.
"A
Torá não é sentimental" – foi
sua resposta. "Ela lida com a verdade. E às vezes
a verdade não é aquilo que as pessoas querem ouvir."
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"A Torá
não é sentimental" – foi sua resposta. "Ela
lida com a verdade. E às vezes a verdade não é aquilo
que as pessoas querem ouvir. Mas se você confiar na verdade –
o que significa confiar em D’us – isso terminará por
levá-lo aonde quer ir, embora você talvez nunca saiba exatamente
como chegou lá."
Minha mãe não acreditou. Minhas irmãs também
não. Em retrospecto, também não tenho certeza se
acreditei.
Relacionamentos familiares para um báal teshuvá (alguém
que retornou ao Judaísmo) são um assunto capcioso e freqüentemente
perturbador. Sendo o único observante de Torá numa família
que não o é pode impor uma separação daqueles
que você mais ama. E esta separação muitas vezes acontece
quando você mais deseja se aproximar: casamentos, bar mitsvot, reuniões
de família, até mesmo funerais.
"Tudo bem, então a cerimônia não é casher
pelos seus padrões. Mas você não pode ao menos vir
para o casamento? É meu filho. Seu sobrinho. Seu amor por nós
não é mais importante que todas estas leis e regulamentos?"
"Vocês podem não contar mulheres em um minyan, mas nós
o fazemos. E iremos dizer o cadish."
O jantar de aniversário será no 'Pig and Whistle'. Gostaríamos
muito que você estivesse lá."
"Não somos ortodoxos. Consideramos a conversão dela
perfeitamente correta."
E assim por diante. E outra e outra vez, angustiando não somente
meu coração, mas também o deles.
O desgaste continuou por todos os últimos anos de meus pais. Havia
dolorosas divergências quanto ao tipo de cuidados médicos
a serem ministrados. Havia aqueles que advogavam solidamente por uma "morte
com dignidade" e "qualidade de vida", ao passo que os rabinos
aconselhavam que valia a pena lutar por qualquer chance de vida. Meu pai
faleceu apesar disso tudo, embora minha intervenção ajudasse
minha mãe a viver mais seis anos deliciosos. Porém, em ambos
os casos, havia milhas de diferença entre minha perspectiva e aquela
dos outros membros da família, numa hora triste que pedia por um
consenso.
Eu
preferia pisar em terreno sólido na maior parte de minhas
conversas, e manter a paz e os laços familiares a qualquer
preço.
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Há muito tempo,
exceto em algumas raras ocasiões, desisti de falar com os membros
da família a respeito dos muitos assuntos espirituais que eram
importantes para mim, ou sobre as experiências judaicas que mais
afetaram minha vida. Eu quase não falava sobre minha nova vida
em Israel – tão grandes eram nossas diferenças em
assuntos políticos e religiosos. Minhas irmãs e eu falávamos
principalmente sobre nossos filhos, trabalho ou nossos pais. Eu preferia
pisar em terreno sólido na maior parte de minhas conversas, e manter
a paz e os laços familiares a qualquer preço.
Aprendi esta lição em meus primeiros anos de observância
da Torá. Eu era desnecessariamente provocativo naquela época,
projetando uma arrogância do tipo "Eu encontrei a verdade e
você não". Iniciava agressivamente conversas polêmicas
e introduzia a perspectiva da Torá em assuntos controversos como
aborto, homossexualidade, sexo pré-conjugal, política –
tudo que se possa imaginar. Eu estava flexionando meus músculos,
experimentando novas atitudes e opiniões para ver se serviam. Eu
era detestável.
Mas isso foi quando eu ainda acreditava que meu pai e minha mãe
viveriam para sempre; quando eu ainda imaginava que minha nova comunidade
de amigos observantes de Torá e rabinos poderiam tomar o lugar
de minha família.
A verdade é que tenho somente um conjunto de pais – um pai
e uma mãe – e duas irmãs. E ninguém pode substituí-los,
assim como ninguém jamais poderá tomar o lugar de minha
mulher e meus filhos.
Minha mulher e eu investimos grande energia para criar uma família
observante de Torá. Consigo ver à minha frente uma enorme
mesa de jantar, repleta de filhos e netos. Em minha fantasia, esta mesa
estica-se interminavelmente. Há tantos parentes e seus descendentes,
que mal consigo lembrar o nome de todos. Esta mesa alonga-se não
somente no espaço, mas também no tempo. Continua a crescer
através das gerações. Rabinos e eruditos, homens
de negócio e professoras, mães e pais estão sentados
ali, todos parte de minha família, todos abraçando a Torá.
E embora a Torá que eles abraçam seja uma Torá de
verdade e não de sentimentalismo, minha visão é bastante
sentimental. As lágrimas brotam de meus olhos. E sinto-me muito
grato e orgulhoso desta nova vida que minha mulher e eu optamos juntos.
Minha
irmã comentou: "Eu disse ao rabino que nunca teremos
uma casa casher ou qualquer coisa desse tipo. Ele riu " –
continuou ela – "e disse: 'Nunca diga nunca.'"
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Mas isso não
alivia o sofrimento causado pela distância de meus parentes, assim
como o nascimento de um filho não substitui a perda de um pai.
Eles existem em esferas diferentes.
E assim, sempre que possível, minhas irmãs e eu compartilhamos
nossas vidas. E muitas vezes não o fazemos. Com muito amor, seguimos
nossos caminhos separados. Elas, também, odeiam a distância
que há entre nós, e tentamos preencher a lacuna com freqüentes
expressões de nossa afeição um pelo outro, especialmente
agora que já compartilhamos por oito anos a doença e a perda
de nossos pais. Depois que mamãe faleceu neste ano, sentimo-nos
quase que piegas um com o outro. Jamais desligamos o telefone sem antes
dizer "Eu te amo."
Em minha última visita aos Estados Unidos, minhas irmãs
e eu fomos ao cemitério visitar nossos pais. Minha irmã
levou pétalas de rosa ainda frescas do casamento de sua filha,
e as espalhou sobre a grama verde sob a qual estão nossos pais.
O perfume era agradável. Eu coloquei uma pedra que trouxera de
uma recente visita a Sefad.
Uma de minhas irmãs leu um belo texto dizendo que quando você
deixa de ver um barco porque este cruzou a linha do horizonte, o barco
ainda continua a existir. Embora não se possa mais vê-lo,
sabe-se que há outras pessoas na praia oposta esperando para recebê-lo.
Eu levei um livro de Tehilim do qual pretendia ler um ou dois capítulos.
Li em hebraico, e minhas irmãs e eu então repetimos os salmos
em inglês. Quando terminamos os dois que eu escolhera, uma delas
disse: "Vamos ler mais um." E durante a meia-hora que se seguiu
um ou outro de nós dizia: "Vamos ler mais um", até
que recitamos uma dúzia de capítulos diferentes. Alguns
nós apreciamos mais que outros; alguns eram familiares, outros
estranhos e alguns pareciam deslocados naquele momento.
Tropecei algumas vezes no hebraico e demos algumas risadas quando um de
nós lia em inglês mais rápido que os outros, e saíamos
do compasso.
Em seguida fomos almoçar num restaurante casher perto da casa de
minha irmã. Enquanto mastigávamos, minha irmã mais
velha disse-nos que tinha se juntado a uma sinagoga pela primeira vez
na vida. E agora que está a ponto de se aposentar, deseja freqüentar
aulas. "Quero aprender mais sobre o Judaísmo e estudar hebraico"
– disse ela.. "Acha que estou muito velha para começar?"
Minha outra irmã (também mais velha que eu disse que está
assistindo aulas de um rabino, e seu marido estuda com o mesmo rabino
numa sessão de "aprenda enquanto almoça" no centro
da cidade, várias vezes por semana. "Mas" – apressou-se
ela em dizer – "eu disse ao rabino que nunca teremos uma casa
casher ou qualquer coisa desse tipo. Ele riu" – continuou ela
– "e disse: 'Nunca diga nunca.'"
Durante esta conversa, falei muito pouco, exceto uma pergunta aqui e acolá.
Certamente eu estava contente com as mudanças em minhas irmãs,
mas estava mais absorvido na proximidade que tínhamos acabado de
compartilhar à beira do túmulo e o prazer e o à-vontade
que dividimos no restaurante. Eu estava me deliciando com os sentimentos
de unidade familiar e maravilhando-me pelo poder que minha mãe
e meu pai ainda tinham de manter a família unida. As mudanças
religiosas de minha irmã eram importantes, milagrosas na verdade,
mas agora – neste momento – pareciam apenas parte da união
natural que irmãos e irmãs têm uns com os outros.
Eu voltaria a Israel em algumas horas, e quando nos despedimos, dissemos
"eu te amo" um para o outro. Foi então que senti a presença
dos outros três que tinham vindo para se juntar a nós neste
momento de despedida – os três que criaram os vínculos
que tinham nos unido e ainda continuavam a unir, aproximando-nos.
Talvez eu tenha imaginado isso, mas quando demos um beijo de adeus, senti
que minha mãe e meu pai estavam lá, e estavam sorrindo;
e que todos nós estávamos cercados e envolvidos pela presença
de D’us – cujo mistério e benevolência surge
incessantemente, das maneiras mais inesperadas.
Mas se você confiar na verdade – o que significa se você
confiar em D’us – isso terminará por levá-lo
onde você deseja ir, embora você talvez nem saiba como chegou
lá. |