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O que há conosco, judeus? Não podemos ficar quietos?
Por que temos de estar na linha de frente de tantas das batalhas morais
da história, em números desproporcionais a tantas outras
nações do mundo?
Alguns exemplos:
Morris Ostroff escreve: “Considerando que os judeus compreendem
apenas 3,1% da população branca de 0,6% da população
total, os judeus sul-africanos deveriam ter muito orgulho na mesma alta
proporção em que se opuseram ao apartheid de uma maneira
ou de outra. É duvidoso que qualquer outro grupo separado, seja
chinês, português, grego, católico ou até
mesmo a rica comunidade muçulmana da Índia, possa se gabar
de algo que se aproxime do número proporcional de judeus que
tomaram parte na luta contra o apartheid.”1
Similarmente, no que tange ao Movimento Americano de Direitos Civis,
Martin Luther King Jr. ficaria poético ao falar sobre “a
contribuição feita pelo povo judeu à luta dos negros
pela liberdade.”
A forte fibra moral do judeu também fica aparente pela maneira
que ele luta contra o terror. Segue-se um trecho de um discurso do Primeiro
Ministro Benjamin Netanyahu às Nações Unidas:
“Durante oito longos anos, o Hamas enviou de Gaza milhares de
mísseis, granadas e foguetes para as cidades israelenses próximas…
Após oito anos de ataques incessantes, Israel foi forçado
a reagir. Mas como deveríamos ter reagido?
“Bem, há somente um exemplo na história de milhares
de foguetes sendo lancados sobre a população civil de
um país. Aconteceu quando os nazistas bombardearam as cidades
inglesas durante a Segunda Guerra. Durante aquela guerra, os Aliados
arrasaram cidades alemãs, causando centenas de milhares de mortes.
“Israel preferiu reagir de maneira diferente. Face a um inimigo
cometendo o duplo crime de guerra de atirar sobre civis e se esconder
atrás de civis – Israel procurou conduzir ataques cirúrgicos
contra os lançadores de foguetes… Atiramos incontáveis
folhetos sobre suas casas, enviamos milhares de mensagens de texto e
fizemos milhares de telefonemas para celulares pedindo às pessoas
que partissem.
“Jamais um país se esforçou tanto para retirar a
população civil do inimigo do caminho do perigo.”
Os judeus até foram os primeiros a protestar na Baía de
Guantanamo:
“Os advogados judeus são considerados a espinha dorsal
da campanha para conceder direitos humanos aos detidos em Guantanamo…
Dentre os advogados envolvidos desde o início, e até mesmo
agora, há uma forte representação de judeus.”2
Talvez este não seja um comportamento surpreendente para uma
nação que no Monte Sinai foi encarregada de ser “uma
luz entre as nações”.
Podemos definitivamente discutir sobre a definição de
luz e sim, alguns têm grosseiramente confundido escuridão
com luz, porém seu engano é em percepção,
não no motivo.
O denominador comum entre todos eles – incluindo a grande proporção
de judeus envolvidos na Revolução Bolchevique –
é que eles foram impulsionados por um chamado mais alto: por
uma visão de um mundo utópico, no qual bondade, justiça
e igualdade reinam supremas.
“Não cozinharás um filhote no leite de sua mãe”3
é a solitária restrição bíblica sobre
o preparo de um item específico. Não há uma proibição
semelhante, por exemplo, para cozinhar porco; porém quando se
trata de carne e leite, não é apenas o consumo que é
proibido, mas também o ato de cozinhá-los juntos.
Qual é a essência dessa ordem: é supra-racional
ou compreensível? É prejudicial estritamente num nível
espiritual, por motivos conhecidos somente pelo nosso Criador?
Posso entender uma proibição de comer aquilo que D'us
insiste que espiritualmente não é saudável. Afinal,
o alimento é a nossa força da vida, e quem deseja ser
impulsionado por um combustível espiritualmente defeituoso? E
o que é pior, o alimento se torna parte do nosso corpo, e quem
deseja ter energia negativa pelo resto da vida?
Mas o que pode haver de errado em grelhar um cheeseburger? Nenhuma energia
passa entre você e o burger; você pode – aparentemente
– se sair bem dessa.
Sensibilidades Morais
“Não cozinharás um filhote no leite de sua mãe.”
Por que essa sensibilidaed? O versículo não poderia simplesmente
dizer: “Não cozinhe carne e leite juntos?”
Porém como sugerem as palavras dessa proibição,
essa mitsvá trata de sensibilidade moral. Ela nos desafia a elevar
nosso nível de compaixão, e a diminuir nossa tolerância
à crueldade.
É insensível cozinhar um animal no leite nutritivo que
já lhe deu vida. É grosseiro cozinhar o filhote sem vida
no símbolo da nutrição e amor de sua mãe.
É por isso que não cozinhamos, comemos nem nos beneficiamos
dessa mistura.
Aqui o cínico perguntaria: “Sensibilidade? Que sensibilidade?
O animal está morto! Acabou! Não sente nada no presente
momento, se é que jamais sentiu.
“E além disso,” acrescenta num tom erudito, “essa
proibição não inclui cozinhar um animal no leite
que não seja da sua mãe?”
Essa é uma boa pergunta, e dá a oportunidade de esclarecer.
Uma Composição Mais Elevada
Essa mitsvá é menos sobre as sensibilidades do animal
que sobre a nossa.
Há a higiene espiritual e física, e então há
a higiene moral. Muitas mitsvot visam a manter nossa alma sadia, outras
se preocupam com nosso corpo; porém esta está preocupada
com a nossa consciência – nosso compasso ético.
Há coisas que não fazemos para não magoar os outros,
e há coisas que não fazemos para não magoar a nós
mesmos.
D'us considera Seus preciosos filhos num nível alto de justiça,
moralidade e refinamento. Nesse exemplo Ele nos pede para respeitar
um instrumento da vida não o usando como um instrumento de consumo
pós-morte. Ele nos convida a mostrar sensibilidade a um conceito,
uma ideia – não sequer a um ser vivo!
Ele pede que nos sintamos incomodados, até enojados, pela noção
de um animal morto flutuando no leite de sua mãe. Embora ele
não sinta mais, somos ordenados a sentir por ele.
Ele nos ordena a proteger nosso senso ético, para que jamais
seja embotado pelo cálculo frio e racional.
Somos conclamados a sermos tão cuidadosos a esse respeito, que
somos proibidos de cozinhar um animal em leite mesmo que não
seja da sua própria mãe, apenas para garantir que não
adotemos o hábito de cozinhar carne e leite juntos, o que poderia
nos levar a um dia acidentalmente cozinhar um animal morto no leite
da própria mãe!
Fale sobre hipersensibilidade!
Isso nos leva de volta ao ponto de partida.
Em seu discurso na 42ª Conferência Bianual da Mesa Judaica de
Deputados Judeus da África do Sul em Gauteng, em outubro de 2002,
o Sr. Kgalema Motlan, secretário geral do Congresso Nacional
Africano, disse o seguinte:
“Aquelas pessoas de ascendência judaica sendo tão
proeminentes no movimento de liberação diz algo fundamental
sobre a compaixão do Judaísmo. Muitos imigrantes judeus
chegaram ao nosso país em abjeta pobreza, aspirando pouco mais
que seu rico comprometimento com ideais humanitários e igualitários.
Esses compromissos estavam enraizados no tradicional ensino judaico…
a compaixão judaica é o fruto da empatia, em vez da simpatia.”4
O que há para mim nisso tudo?
Ao nascer, cada um de nós foi dotado por D'us com sensibilidade
e o potencial para desenvolver e refinar nossa constituição
moral. Parte de nossa missão na vida é nutrir e expandir
este dom inato – e certamente não destruí-lo.
Que jamais aprendamos a tolerar a injustiça ou nos tornarmos
imunes à crueldade.
No momento em que deixarmos de ficar chocados pela imoralidade, então
é porque também nos tornamos imorais.
Neste contexto, “pele grossa” é pele grosseira.
Nessa área, também, nossa amada Torá e nossas mitsvot
devem servir como o farol do mundo. Vamos continuar a manter aceso com
orgulho este farol!
Notas:
1 – Ostroff diz ainda que dos 150 ativistas condenados no Julgamento
por Traição, 23 eram brancos. Desses 23 brancos, nada menos
de 14 eram judeus! (veja em http:/maurice-ostroff.tripod.com/id27html
2 – Uma citação de Joe Margulies, professor de Direito
na Universidade Nothwestern que lutava pelos direitos legais dos detidos
em Guantanamo. Margulies e vários outros colegas judeus foram os
primeiros a adotar a causa, e ainda estão liderando o grupo numa
representação pro bono dos presos… (de um artigo de
Nathan Guttman em The Forward).
3 – Shemot 23:19, repetindo a proibição três
vezes (ibid.; ibid., 34:26; Devarim 13:21), a Torá proíbe
não somente cozinhar leite e carne juntos, como também comer
ou obter benefícios daquela mistura (Rashi ad loc).
4 – Do artigo citado acima de Morris Ostroff.
Mendel Kalmenson
Rabino Mendel Kalmenson viajou pela Europa, Ásia e América
do Sul, fazendo contatos com judeus nas áreas mais remotas. Ele
agora reside com sua esposa Chana e sua filha Geulah no Brooklyn, em NY,
onde estuda no Kolel Chabad.
Mendel contribui regularmente com artigos para Chabad.org, a maioria deles
aparecendo em sua coluna sobre a Parashá: “O que o Rebe Me
Ensinou”.
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